Acordo no Eurogrupo. “Há seguramente ganhos para a Grécia, mas não se pode falar numa vitória”

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Depois da tempestade vem a bonança. Foram vários os obstáculos colocados por Berlim à Grécia, mas na véspera do acordo alcançado, a 20 de fevereiro, na reunião do Eurogrupo relativamente à extensão do programa de resgate por quatro meses, a Alemanha mostrou-se mais recetiva. Tanto é que uma semana depois, dia 27, o Bundestag aprovou o prolongamento do programa de assistência financeira à Grécia. Ultrapassado o impasse após acusações de bluffs e recuos, afinal, quem saiu a ganhar?

Para Pedro Lains, professor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, “há seguramente ganhos para o lado grego, mas não se pode falar numa vitória”. Cada um dos lados vai dizer que ganhou como é óbvio, defende o economista, uma vez que “os políticos têm que ir para casa como vencedores para não desiludirem os seus eleitorados, mas nem a Grécia venceu. Teve só alguns ganhos. No fundo, o resultado das negociações é um resultado fundamentalmente político, mas também é um sinal de mudança”, diz ao Expresso Pedro Lains.

O economista e historiador defende que a mudança será contudo ténue. “As mudanças radicais na Europa não funcionam. Nem poderíamos esperar que a Grécia cumprisse com aquilo que prometeu. Não era possível, isso não é falsidade. É assim que funciona o sistema político democrático”, afirmou.

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Embora admita que os eleitores sonhem com alterações radicais, Pedro Lains explica que as mudanças têm que ser faseadas, além da sua própria negociação. E nesse sentido a Grécia conseguiu o que quis, sublinha.

Relativamente às fugas de informação neste processo, o docente do Instituto de Ciências Sociais esclareceu que constituem uma característica dos políticos gregos que querem assumir uma postura mais transparente e próxima dos cidadãos.

O presidente do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), João Duque, considera por seu turno que era quase inevitável a Grécia e os parceiros chegarem a uma plataforma de entendimento, reconhecendo também que ambas as partes estão convencidas de que ganharam. “Se fosse para romper já teria sido feita a rotura, além disso são importantes os quatro meses não só para a Grécia, mas para os países europeus arrumarem a casa, identificarem a sua exposição e preparem medidas mitigadoras”, frisou.

João Duque afirma que com isto não quer dizer que a Grécia vai sair da zona euro, mas que este período irá colocar o país numa nova fase probatória e agitada. “Não se sabe se se vai a concretizar a saída, muita água vai correr debaixo das pontes. Será uma fase que é um pau de dois bicos. Mas penso também que este prazo vai pôr o Governo verdadeiramente em stress interno, começando as verdadeiras escolhas políticas a partir de agora”, acrescentou.

Segundo Pedro Lains, Atenas conseguiu reverter o sentido das políticas para o futuro, referindo que a “cosmética é extremente importante”, uma vez que neste momento o Governo grego negoceia com ministros, instituições e não funcionários da troika. “O processo de discussão política está mais equilibrado. Todos são políticos eleitos e sabem que o ministro das Finanças tem que responder ao primeiro-ministro e o primeiro-ministro ao parlamento”

Tática de cinismo ou processo sério?

Em termos de protagonismo verifica-se uma alteração importante na estratégia de negociação. “Dá-se mais enfoque no ministro das Finanças Shäuble a mesma coisa, ele é que fez de polícia mau e recuou. Não fica mal na fotografia a chanceler alemã”, explica Pedro Lains, defendendo que Angela Merkel tem um problema com o vice-chanceler do outro partido da coligação governamental que “está sempre a tempo de acordar”, ou seja discordar.

O presidente do ISEG admite também ter ficado surpreendido com a cedência alemã, lembrando contudo que existiam timings para cumprir e uma zona da moeda única para defender. “É incrível ter-se passado de uma situação de super arrogância a passo de querer ajudar e aprovar a extensão do programa de resgate à Grécia no parlamento alemão. Ou então é o cinismo combinado a toda a prova, desempenhando agora Shäuble o papel de bom”, diz João Duque.

O docente do Instituto Superior de Economia e Gestão considera que a grande dúvida é saber se tudo não passou de uma tática ou de um processo sério, tendo recuado também o governo de Atenas que poderá ter caído em si, deixando de lado uma visão demasiado rígida e o irrealismo do programa eleitoral, rejeitando de uma vez por todas romper com o sistema. “Eles não tem um mandado para sair do euro, sabem que isso teria consequências muito difíceis”.

Hollande foi decisivo

Pedro Lains advoga que as reformas são “tudo ideologia”, realçando que o que será importante perceber é se será conseguida ou não a redução do excedente orçamental primário.

Tendo em conta o acordo alcançado na reunião do Eurogrupo, ambos defendem que para este processo contribuiu também muito a influência de Paris. “Esta mudança tem também a ver com Hollande. Todos os meses havia sinais. Neste momento já há uma viragem para o centro esquerda na Europa, é por isso que uma parte do Syriza não está contente, porque queria uma mudança radical, mas afinal será gradual”,apontou Pedro Lains.

A tese é igualmente defendida pelo presidente do ISEG que sustenta que o Presidente francês pretende proteger o seu eleitorado, até porque já sofre o desgaste de uma crise. “Os partidos socialistas sentem-se mais atacados na zona euro com os partidos de extrema esquerda pelos quais têm algum grau de intolerância. Os partidos socialistas não viam com bons olhos esta aventura romântica do Syriza, que dificilmente podia contar com o seu apoio nas trincheiras. Disso não há dúvida.”

RE

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