Ana Paula Martins quer requalificar zona ribeirinha, construir habitação e continuar o apoio social

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Em entrevista ao JA, a presidente da Câmara Municipal de Tavira, Ana Paula Martins, discorreu sobre as últimas eleições autárquicas, que venceu por escassos 123 votos, e falou dos projetos para os próximos quatro anos. A habitação, os projetos para a Ilha de Tavira, as igrejas de porta fechada e os assuntos polémicos do CEAT e dos painéis fotovoltaicos no Cerro do Leiria foram alguns dos temas abordados

JORNAL do ALGARVE (JA) – Ganhou por apenas 123 votos nas eleições de setembro passado, mas isso valeu-lhe a maioria na Câmara e nas Juntas de Freguesia. No entanto, na Assembleia Municipal, o Partido Socialista (PS) está em minoria. Já se faz notar uma aliança entre os 10 deputados do PSD e o deputado único do Chega, contra os outros 10 do PS?
Ana Paula Martins (APM) – Sinto-me confortável na Assembleia Municipal. Não tenho ideia que haja essa união ou coligação entre o PSD e o Chega. Julgo que há assuntos em que houve alguns acordos entre eles, nomeadamente no início, quando estivemos a tentar votar as representações. Têm acontecido situações, por exemplo com o orçamento, em que votaram de forma diferente.


JA – Como interpretou a decisão de Macário Correia de não tomar posse, por não poder ser eleito presidente da Assembleia Municipal?
APM
– O engenheiro Macário Correia fez uma nota pública sobre isso e acho que, percebendo que muito dificilmente iria ser eleito presidente da Assembleia Municipal, acabou por renunciar ao mandato. Quer dizer, ele não renunciou, porque nem sequer tomou posse para o cargo para que estava eleito. Eu penso que o engenheiro entrou na campanha para alavancar o PSD. Obviamente quando nós nos candidatamos, temos a possibilidade de ganhar ou de perder e, portanto, deveremos assumir as funções para as quais nos candidatamos, quer seja a ganhar quer seja a perder. Mas depois isso também cabe na decisão e consciência de cada um.


JA – O que ditaria a sua consciência se estivesse nas mesmas circunstâncias? Concluiria o mandato?
APM
– Tentaria novamente e isso poderia ter acontecido na Câmara. Eu tinha assumido as minhas funções, mas não para as quais me tinha proposto. Nesse caso não era presidente da Câmara e obviamente seria vereadora na oposição.


JA – Tem havido em Tavira um certo afunilamento, no sentido de alguma bipolarização política. Nas eleições de 2017 houve uma maior distribuição de votos na Assembleia Municipal e mesmo na Câmara. Acha que Tavira está condenada a esta bipolarização e que é saudável, ou preferia uma maior pulverização dos votos nas várias forças políticas?
APM –
Eu acho que estas eleições foram um bocadinho bipolarizadas entre os dois partidos precisamente porque as pessoas sabiam que iam ser discutidas. Como estávamos numa mudança de ciclo autárquico e terminavam os 12 anos do anterior presidente, as pessoas foram votar, umas pela manutenção e outras pela mudança. Eu acho que teve essa particularidade e por isso é que foi uma eleição tão bem repartida. Eu penso que a pluralidade de partidos faz falta na Assembleia Municipal e considero que, quanto mais representação houver, mais discussão acontece e isso é importante. A representatividade partidária implica sempre que possa haver mais troca de ideias e o aprofundamento de outras, mas eu penso que isso também pode ser colmatado com uma boa participação da comunidade, como aquilo que é prática de uma cidadania mais ativa e participativa.


JA – E este crescimento do PSD de 2017 para cá, em sua opinião deve-se a quê?
APM –
Eu penso que o PSD vê uma hipótese de assumir novamente a Câmara de Tavira e, como tal, trouxe Macário Correia, que é um ex-autarca da cidade com papel e com trabalho demonstrado. E portanto traz o engenheiro para a eleição como candidato à Assembleia Municipal. É certo que foi uma forma de dar confiança ao candidato do PSD. Eu penso que as pessoas também acabaram por perceber isso. O PSD pôs a carne toda no assador para tentar ganhar a Câmara de Tavira.


JA – O que é que gostaria de ter feito no seu mandato anterior e não fez, planeando fazê-lo agora nos quatro anos que se seguem?
APM –
Construir habitação com a Estratégia Local de Habitação. Poderíamos ter começado a fazer mais cedo e neste momento ter já a obra no terreno. Ainda estamos na fase de projetos e era talvez aquilo que eu gostaria mais porque é o grande problema com que neste momento nos deparamos em Tavira. Há também uma linha de continuidade com todo o trabalho social que fizemos. Mas também é importante a construção, a requalificação das frentes ribeirinhas e que possamos criar condições para a construção de uma infraestrutura náutica, que era importante para a cidade, e a criação de um parque verde. Também estamos a trabalhar nisso e espero que seja uma realidade neste mandato.


JA – E na saúde?
APM –
A ampliação do Centro de Saúde que resultará na prestação de mais e melhores cuidados de saúde primários à população também é muito importante. Continuamos a trabalhar e conseguimos que fosse incluído no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) com um investimento de quase cinco milhões para ampliação e apetrechamento do nosso centro de saúde. Estamos a trabalhar com a Administração Regional de Saúde (ARS) nesse sentido, para concretizar esse projeto. Depois temos a requalificação urbana e a necessidade de criarmos mais infraestruturas desportivas, porque felizmente cada vez temos mais pessoas a praticar desporto e isso também é importante para a saúde.


JA – No que diz respeito à cultura, Tavira é um caso invejável, com um espólio patrimonial e arquitetónico riquíssimo. Mas a sensação que transparece é que está um pouco mal explorado. Por exemplo, tem um dos maiores números de igrejas por cidade no Algarve mas muitas estão fechadas.
APM –
Eu concordo plenamente. Nós já trabalhámos bastante para abrir as igrejas. Tivemos vários programas e pensamos vir a ter novamente, com o apoio de fundos comunitários numa parceria entre a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve (CCDR), o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) e as Câmaras. Deveremos voltar a ter programas ocupacionais para abertura das igrejas como já tivemos no passado. Neste momento, as três igrejas que estão sobre a posse da Câmara são abertas diariamente com funcionários nossos. Das outras 18, a paróquia e São Paulo também têm aberto. A igreja de Santa Maria criou um museu de arte sacra e nos últimos anos criámos folhetos com a história das igrejas e que permitem visitas guiadas. Trabalhámos muito para a divulgação desse património histórico e religioso, mas depois é importante trabalharmos na questão da recuperação. Mas temos algumas igrejas que não são propriedade do município e isso cria um problema, nomeadamente com a igreja de São Francisco, a quem apoiamos os projetos para a consolidação estrutural e para a sua reabilitação e neste momento estamos a ver se encontramos alguns fundos para poder reabilitar. Para a igreja do Carmo também estamos a finalizar e espero que este ano ainda consigamos inaugurar o restauro do órgão. Neste momento a Câmara assumiu, através de um protocolo de gestão com a paróquia, a recuperação dos altares. Eu penso que vamos mudar, porque estamos preocupados e temos plena consciência de que esse património é nosso e é importante para nós e também é ele que nos diferencia e que podemos rentabilizar e também distinguir-nos como destino turístico nessa área. Portanto temos em mente criar um plano, porque a reabilitação de edifícios históricos são processos muito complicados até do ponto de vista do diagnóstico que tem que ser feito, em termos dos projetos de reabilitação que têm que ser aprovadas pela Direção Regional de Cultura. Para além de também ser caro.


JA – No que diz respeito ao Centro de Experimentação Agrário de Tavira (CEAT), a Câmara foi acusada de ter uma opinião dúbia ou não muito clara sobre a matéria e a construção de uma estrada que iria atravessar um terreno onde existem várias espécies de árvores. Acha que este recente bloqueio das intenções da administração acaba por ser positivo para todo o património agrícola e biológico que ali se encontra?
APM
– O projeto era da Infraestruturas de Portugal, que tinha a eletrificação da linha, mas a Câmara tinha emitido o seu parecer positivo relativamente à criação da estrada. Efetivamente, se calhar, aquela não seria a melhor localização e acabou por ser inviabilizada na sequência do Estudo de Impacto Ambiental realizado. Mas o que eu penso que é importante é que haja dinheiro para reabilitar o património que existe no CEAT e poder também não só reabilitar o património físico, mas também o património natural, que possa ser importante o investimento em preservar aquelas espécies em prol da agricultura e dos agricultores. Eu penso que é importante que possamos criar um plano para que o CEAT ganhe novamente a importância que sempre teve em termos da agricultura em Tavira. Nem que para isso possamos vir a conseguir alguns fundos comunitários ou do PRR.

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JA – Acha positiva a existência de planos a muito curto prazo para a instalação de hortas comunitárias, uma delas precisamente em terrenos do CEAT?
APM –
Sim, foi a Câmara que fez o protocolo com a Direção-Geral de Agricultura e que agora entregue ao projeto Semente, um projeto dos Bairros Saudáveis, para que se criem lá as hortas urbanas. Obviamente consideramos que são projetos importantes.


JA – Quais são os planos que existem para a ilha de Tavira? Vamos caminhar no sentido da naturalização ou no sentido de um plano mais urbanístico e artificial?
APM –
A ilha de Tavira precisa de um plano de intervenção e de reabilitação. Um plano que obviamente não deve ter nada de urbanístico, mais virado para o natural, mas que terá de contemplar obviamente a reabilitação do parque de campismo. Neste momento está a ser gerido pelo município, mas o executivo quer concessioná-lo. Temos que perceber bem aquilo que é possível em termos de instrumentos de ordenamento do território que se possam fazer no espaço e obviamente também toda aquela requalificação da zona das casas de banho e da restauração. Neste momento também estamos a lançar as concessões para os novos apoios de praia, que já se pretendem com mais condições e com casas de banho.


JA – E em relação ao futuro do parque de campismo? Será pacífico?
APM –
Nós queremos avançar com a construção do parque campismo no futuro e estamos a avançar para tentar perceber qual é a evolução que ele pode vir a ter neste contexto. Se poderíamos eventualmente ter pequenos bungalows e se poderemos aumentar e requalificar as casas de banho. Neste momento estamos com um projeto para aumentar as casas de banho e tem sido realmente um desafio enorme com os parceiros e os condicionalismos das entidades, para tentarmos levar o projeto por diante.


JA – A abertura de um grande centro comercial em Tavira, em sua opinião, foi um erro que arrasou com uma parte considerável do comércio da cidade e do centro ou acha que hoje há duas realidades que são perfeitamente complementares?
APM –
Eu acho que no início teve e tem tido algum impacto naquilo que é o comércio tradicional que se situava na baixa da cidade. Penso que ainda tem algum impacto, mas neste momento o centro comercial existe já há 12 anos. Assistimos ao fecho de algumas lojas mas, entretanto, também houve outras que foram reabrindo. Quando se pensa num centro comercial para dinamizar a parte comercial da cidade, ele tem que ter lojas âncora fortes. Não havendo as lojas âncora fortes é um risco. Há algumas mas se calhar faz falta haver outras. Eu penso que isso também deve pesar na decisão de autorizar um centro comercial que são edifícios que têm sempre um impacto urbanístico grande. E portanto se é para o criar, ele tem que ser dinamizado economicamente. A pandemia afastou um bocadinho as pessoas do shopping e por força disso as rendas poderão não ter sido devidamente ajustadas, o que fez com que também algumas acabem por fechar e depois não se tem a dinamização que se quer. Acaba-se por, com estas decisões, por não ter nem o shopping com muita gente nem um comércio tradicional forte. Às vezes tem que se fazer opções.


JA – Em relação à futura central solar do Cerro do Leiria, qual é a posição da Câmara? A situação tem sido contestada pela população.
APM –
Em bom rigor, a Câmara não tem nada concreto sobre esse assunto. Nós apenas sabemos que a Iberdrola ganhou uma concessão para instalar painéis fotovoltaicos para produzir energia para injetar na rede. Eles tiveram uma primeira reunião com a Câmara, que manifestou que veria com muito melhores olhos se aquilo ficasse na zona mais serrana do que exatamente ali naquela área. De qualquer maneira, neste momento não tenho localização concreta nem a forma como é que se vai desenvolver. Não existe nada. Penso que neste momento a Iberdrola terá que fazer contactos para arrendar terrenos e tem que ser alvo de um estudo geotécnico e também um estudo de impacto ambiental. Na câmara não entrou nada formalmente. É uma pena destruir aquilo, foi a primeira coisa que eu disse. Eu expliquei-lhes logo que era uma área muito sensível e que a Câmara preferiria que a instalação se fizesse noutro sítio, mais para o interior, não tão próximo do barrocal. Entretanto nunca mais falei com a Iberdrola. Disse também que existe uma série de comunidades estrangeiras que têm ali residências e que tinham eles próprios insurgido contra a exploração de uma pedreira a determinada altura e que, portanto, tinha a certeza que tal como eu, eles prefeririam que houvesse uma deslocalização para outro espaço. A Iberdrola ficou de estudar esse assunto e até hoje nunca soube de nada. Quando a Câmara for chamada a pronunciar oficialmente, dirá o que tiver a dizer, com um estudo de impacto ambiental, pois há quem diga que põe em risco o aquífero.

Gonçalo Dourado/João Prudêncio

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