Animais sofrem em tempo de vírus: Mais abandonos e menos doações

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“Desde o início do surto de COVID-19, já recebemos 14 cachorros e duas cadelas e tivemos de recusar alguns animais pois não temos condições para os receber”, confessou ao JA a diretora do Canil de São Francisco de Assis, em Loulé, São Silva, 46 anos. Este canil tem cerca de 360 cães, 100 gatos, quatro cavalos e um burro.

Instalações do Canil de São Francisco de Assis

No caso de recusa de animais por parte do canil, é pedido às pessoas “para falarem com familiares e amigos” para ficarem com eles e, em último caso, deslocarem-se aos veterinário municipal, uma vez que todas as associações estão lotadas”.


Segundo a diretora do canil, “os donativos reduziram bastante”, o que levou a um pedido de ração através das redes sociais. O que salva e apoia todos estes animais é “a ajuda das pessoas, sem a qual era impossível continuar”, uma vez que “só em ração para cães”, o valor ronda os 600 euros. Neste momento, uma das maiores necessidades deste canil é a ração seca para cães e gatos.

Devido à pandemia de COVID-19, as recolhas de fim-de-semana estão suspensas e o canil implementou um Plano de Contingência. De portas fechadas a visitas e adoções, no local “só circula o staff e um número reduzido de voluntários até ser levantada a quarentena”.


Se necessário, o canil está disponível para receber animais de companhia de pessoas infetadas pelo vírus, que não possam temporariamente tratar dos mesmos, “para evitar o abandono”, tal como fazem com outro tipo de pessoas com necessidades.


No entanto, a diretora considera que “estar infetado não é justificação para abandono” e que se houvesse algum pedido para abrigar temporariamente um animal de uma pessoa doente, o mesmo “teria de ser analisado”. Esse apoio pode passar por “dar alimentação para o animal”, uma vez que financeiramente “era muito difícil devido às despesas que o canil tem”.


Os animais, segundo a diretora que já divulgou um parecer de veterinários nas redes sociais, “não transmitem a doença” nem as pessoas contagiam os animais. Esta tem sido uma dúvida constante da população, que tem sido esclarecida através de várias ações de sensibilização.
Infelizmente, a diretora confessa que “o COVID-19 foi um pretexto para abandonar animais”.

Despejo em tempo de pandemia

São Silva, diretora do Canil de São Francisco de Assis, em Loulé

“Estamos a ser despejados da ruína onde criámos um Bem Estar Animal, onde estamos há cinco anos. Agora que criámos condições temos que sair”, confessou ao JA a presidente da ADOTA, associação de Animais de Santa Luzia de Tavira, Alice Gil. Esta associação cuida de 70 cães e 80 gatos.


Para tentar resolver a situação, a associação tem dado muitos animais para doção “e feito boxes em quintas de amigos” para abrigar cães e gatos.


Apesar de toda esta situação e da pandemia de COVID-19, a ADOTA continua a receber animais, uma vez que “existe muito mais abandono” nesta altura.

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Por falta de rendimentos, muitas são as pessoas que têm contactado a associação a pedir ajuda, nomeadamente em relação à alimentação dos animais, segundo a presidente da ADOTA.
Em termos de doações e donativos, a associação lamenta o facto da Câmara Municipal de Tavira não ter atendido a um pedido de ajuda, feito há mais de 10 dias, apesar do protocolo assinado em que a autarquia apoia a ADOTA com 350 euros mensais. “As Juntas de Freguesia também não nos ajudam”, lamentou Alice ao JA.

“Estamos a ser despejados da ruína onde criámos um Bem Estar Animal, onde estamos há cinco anos. Agora que criámos condições temos que sair”


Além dos voluntários que ajudam diariamente, a associação contou recentemente com o apoio do hipermercado Continente que doou muitos quilos de rações para cães. No entanto, ainda há falta de “medicamentos, alimento para gatos, produtos de higiene e dinheiro para levar os animais ao veterinário”, alertou.


“Temos dívidas nos veterinários e não podemos levar animais sem pagar. Ainda na semana passada chegaram à associação cinco gatos bebés, deixados num contentor do lixo num estado miserável e a precisaram de apoio veterinário”, contou Alice Gil.

Todos os dias, a ADOTA conta com a ajuda de dois voluntários, que tomam “todos os cuidados de higiene” e proporcionam “largos passeios com os cães pela quinta”. Todas estas atividades fazem parte da rotina da associação, que luta pelo bem estar animal no Algarve.


Através das redes sociais, a associação alerta para os cuidados a ter com os animais em relação ao COVID-10, além de alertar com a divulgação de casos de abandono e maus tratos aos animais: “Recebemos muitas queixas de maus tratos em apartamentos”, confessou.

Cães de sem-abrigo infetado recolhidos pela autarquia de Albufeira


A Câmara Municipal de Albufeira assegurou o abrigo de dois cães de um sem-abrigo infetado por COVID-19, depois da Pata Ativa ter sido contactada para acolhê-los.


Os animais ficaram abrigados noutra associação que tem espaço físico, ao contrário do que acontece com a Pata Ativa que apenas trata de animais de rua, como é o caso de 12 colónias de gatos, revelou ao JA a presidente da associação de Albufeira, Ana Castro, de 40 anos.


“A Pata Ativa não possui um espaço físico onde possa acolher animais de rua. Trabalhamos com famílias de acolhimento temporário e a nosso cargo temos apenas dois cães adultos e algumas ninhadas de gatos que foram encontrados no lixo”, afirmou a presidente da associação. Esta associação trata de 12 colónias de gatos, que são ao todo cerca de 120 felinos, e mais dois cães.

“Temos recebido mensagens diariamente acerca das dúvidas de como interagir com os animais nesta fase de pandemia, aconselhando a fazer uma boa higiene ao mesmo e sempre que venham da rua, após o passeio com o seu animal, desinfetar as patas”

Ana Castro, presidente da Associação Pata Ativa

Segundo Ana Castro, “o número de animais abandonados aumentou bastante desde o início da pandemia” e todos os dias tem recebido pedidos de ajuda para recolher animais, além de que os espaços com quem têm colaboração “estão completamente lotados”.

Devido à pandemia de COVID-19, a Pata Ativa alterou a sua rotina de trabalho, “começando por evitar idas desnecessárias às clínicas veterinárias, distribuindo de uma forma mais organizada o encaminhamento dos animais às mesmas”, além de ter apenas uma voluntária a “dar assistência às colónias de rua, que neste momento se encontram desprotegidas devido ao encerramento de hotéis, escolas e restaurantes”.


“Temos recebido mensagens diariamente acerca das dúvidas de como interagir com os animais nesta fase de pandemia, aconselhando a fazer uma boa higiene ao mesmo e sempre que venham da rua, após o passeio com o seu animal, desinfetar as patas”, referiu Ana Castro ao JA.


Todos os dias, nas redes sociais, a associação divulga artigos e notícias para sensibilizar a população acerca do COVID-19 nos animais, “afim de combater todas as dúvidas”.


Felizmente, no caso desta associação, “os donativos e oferta de produtos para os animais não diminuiu”, em tempo de pandemia.
No entanto, a “maior necessidade é a ração” para continuarem a “garantir a alimentação das inúmeras colónias distribuídas pelo concelho” de Albufeira, cuja autarquia aprovou um protocolo que prevê a disponibilização de 10 mil euros anuais a três associações de animais do município.


Apesar da assinatura desse protocolo, o valor ainda não foi entregue à associação, “devido a todas as burocracias inerentes a estes processos”.

“Boom atípico” de adoções


O número de pedidos de ajuda para recolher animais, por parte do núcleo do Projeto de Apoio a Vítimas Indefesas de Faro (PRAVI), “tem aumentado consideravelmente”, segundo disse ao JA a presidente Maria da Conceição Valdágua. A PRAVI tem atualmente 14 gatos e 11 cães.


No entanto, decorre um “boom atípico de procura de animais para adoção”, um facto que “pode dever-se ao isolamento de muitas famílias que, por consequência, as famílias acharem ser o melhor momento para introduzir no seio familiar um novo membro”.

A responsável alerta que “o que as pessoas não estão a pensar, talvez, é no futuro: Com a crise esperada, com o abrandamento das medidas de confinamento em tempo de verão, como será com os animais? Devolvem-nos após já ter sido cumprida a sua missão de ‘entretenimento’? Deixam-nos numa varanda ou soltam os animais por aí?”.

Gato em acolhimento temporário na PRAVI de Faro

Os desaparecimentos de animais também têm aumentado, e Maria Valdágua considera que isso deve-se “talvez porque as pessoas estão em casa e os animais”, a quem chama por vezes de vítimas silenciosas, “vão dar as ‘voltinhas’, não sabendo depois voltar para casa”.


Apesar de, até ao momento, não terem acolhido animais de pessoas infetadas por COVID-19, o núcleo da PRAVI de Faro já fez essa oferta à Câmara Municipal da capital algarvia.


Esta associação não tem abrigo mas funciona com famílias de acolhimento temporário e Maria, também deputada municipal de Faro, já solicitou um reforço às organizações zoófilas, devido às necessidades do dia-a-dia, uma vez que as doações e os donativos têm diminuído.


“As organizações subsistem por donativos pontuais de particulares, que neste momento não só estão a ser encaminhados para outras organizações humanitárias, como também os próprios particulares começam a sentir dificuldades e a retraírem-se. Também a maior parte da comida e material angariado era feito em campanhas nos supermercados ou na rua, ação que agora não podemos fazer”, confessou a responsável ao JA.


Enquanto durar a pandemia, os gatos presentes no gatil vão ser alimentados por duas pessoas, deixando de haver trabalho de voluntariado.

Mais animais na rua

João Gameiro Alves, presidente do Movimento Pró Animal de Faro

Segundo o presidente do Movimento Pró Animal de Faro (MAP), João Gameiro Alves de 71 anos, neste momento “há realmente mais animais na rua, principalmente adultos e muitas pessoas reportam animais encontrados”, referiu ao JA.

Muitos destes animais estão a passar fome, “poia os seus cuidadores são normalmente pessoas de risco” e estão agora em isolamento nas suas casas. Para combater essa situação, o movimento, através do voluntariado, está a “assegurar a alimentação destes animais”.


Esta associação tem cerca de 40 animais, “sendo que 12 são cães recém-nascidos e 23 são gatos, 6 jovens e 22 recém-nascidos”.
Com a pandemia, diminuíram os donativos, as ofertas, mas “principalmente o número de voluntários”. Além disso, foram suspensas todas as campanhas de adoção e a associação apenas recolhe e trata animais “que necessitam de ajuda urgente”.

As clínicas veterinárias “reduziram bastante o atendimento”, o que fez com que as esterilizações, uma das ações deste movimento, estejam suspensas atualmente.

Dois projetos aprovados com a Câmara Municipal de Faro foram também interrompidos: a implementação de pombais contraceptivos nos arredores do concelho e os refúgios para animais silvestres.
Neste momento, o MAP está com uma grande necessidade de “material para os bebés recém-nascidos”, principalmente de leite da Royal Canin ou Mixol, uma vez que estão a gastar “um balde de dois quilos em dois dias e esta necessidade vai aumentar à medida que os bebés vão crescendo”. A ração é outra das faltas notadas, “para encaminhas para cerca de 200 animais errantes e famílias carenciadas dos quais cuidados diariamente”, referiu o presidente.

Gonçalo Dourado

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