Exposição “Algarve do Reino à Região”: Um ímpar projeto algarvio
Encetamos aqui uma sequência de apontamentos alusivos a um conjunto unitário e diversificado de exposições cujo título englobante elucida o ambicioso do projecto: “Algarve – do Reino à Região”.
Projecto que visa, precisamente, ilustrar a história do Algarve no último milénio, desde o “al-Gharb” islâmico à actualidade, passando pelo longo período, entre 1267 e 1910, em que existiu o chamado “Reino do Algarve”. E projecto ambicioso não só por essa dimensão temporal alargada mas também por abarcar toda a geografia algarvia, barlavento e sotavento, litoral e interior. Para o efeito, uma dúzia de municípios algarvios conjugaram esforços e conceberam e realizaram algo ímpar na região.
Essa a primeira nota de relevo: superaram-se os particularismos concelhios e levou-se a cabo um magno empreendimento à escala regional. A iniciativa pertenceu à Rede de Museus do Algarve, uma estrutura informal mas nem por isso menos eficaz, que congrega os museus municipais de Tavira, Loulé, Faro, Albufeira, Portimão e Olhão, acrescidos do Museu do Trajo de São Brás de Alportel e do Museu Marítimo Almirante Ramalho Ortigão (sito em Faro), e ainda das Câmaras Municipais de Alcoutim, Castro Marim, Lagos, Silves e Vila Real de Santo António. No total, são treze exposições que articuladamente proporcionam uma perspectiva integrada da evolução histórica algarvia e do seu rico – e tantas vezes depreciado – património cultural.
É este património cultural, tanto material como espiritual, que ao Algarve confere uma identidade própria e inconfundível e o faz ser, não um qualquer “Allgarve” de pacotilha para o “glamour” do novo-riquismo imbecil e ostentatório, mas uma região vincadamente personalizada e ancorada num passado comum – cujo conhecimento e cuja preservação constituem, por seu turno, a única garantia de um futuro melhor e em que o Algarve não deixará de ser Algarve.
Temos assim, pois, treze exposições que sob a designação genérica “Do Reino à Região” nos apresentam a vocação turística do Algarve (em Albufeira), as vivências oitocentistas (em São Brás de Alportel) e as experiências novecentistas (em Faro), a I República (em Loulé), a cidade e os campos (em Tavira), o espaço fronteiriço (em Alcoutim) e a defesa do território (em Castro Marim), a cartografia das viagens de navegação (em Lagos) e os descobrimentos marítimos (no Museu Ramalho Ortigão), os compromissos marítimos dos pescadores (em Olhão), a época islâmica (em Silves), o urbanismo iluminista (em Vila Real de Santo António), enfim, e no seu contexto local, o grande artista, diplomata e político algarvio Manuel Teixeira-Gomes (em Porti-mão).
Os breves apontamentos que ora se iniciam pretendem chamar a atenção dos leitores do “Jornal do Algarve” para esse acervo expositivo que sobremaneira nos honra – e nos honra tanto por evidenciar a riqueza da nossa cultura autóctone como a nossa capacidade de algarvios para, aqui e agora, produzirmos genuína cultura. Com uma advertência: o projecto carece de “glamour”, não é uma feira de vaidades, dirige-se quer a naturais quer a forasteiros, alia tradição e inovação, combina estudo aturado e criatividade ousada – e, sobretudo, não ofende (antes pelo contrário, dignifica) um Algarve com todas as letras e sem mais nenhuma, um Algarve que tem sido acintemente vilipendiado por “allgarvios” de má-morte.
Resta acrescentar que estes apontamentos divulgativos (não é outra a sua intenção) foram elaborados pelo Centro de Estudos de Património e História do Algarve (CEPHA), de que o autor deste introdutório é coordenador. O CEPHA funciona na Universidade do Algarve, congrega especialistas nas diversas disciplinas do património cultural e tem por objectivos a investigação e a prestação de serviços à comunidade. Nesse âmbito assumiu a responsabilidade, aliás, dos conteúdos científicos das exposições de Alcoutim, Castro Marim e Vila Real de Santo António. Pelo que estes apontamentos serão mais um desses serviços, modesto embora.
*CEPHA/UAlg
Para além dos vários pontos de vista pelos quais possa ser observado, pensamos ser este o momento para desenterrar a figura do Remexido. Nesta iniciativa caberia a figura idiossincrática tão postergada que “remexeu” na história do Algarve durante as lutas liberais, entre D.Pedro e D.Miguel. José Joaquim de Souza Reis de seu nome, esteve no lado errado da história e pagou (talvez injustamente, mas com nobreza) com a vida o arroubo da sua coragem de defender o seu ponto de vista. A quem não convirá ainda hoje, que se mexa demasiado nesta personagem, não nos interessa, mas sim a verdadeira figura histórica que nos pertence. Porque se o rumo da história fosse outro, não faltaria homengens, ruas e travessas laudatórias ao nosso herói algarvio “Remechido”. Pensamos que caberia perfeitamente na matriz fundadora deste projecto histórico-cultural – CEPHA -, o “Remechido” ou “Remexido”, alcunha posta pela sua mulher a José Joaquim de Souza Reis, após um julgamento sumário onde foi executado por fuzilamento por um pelotão militar no Campo da Trindade em Faro, pelas seis horas da tarde no dia 2 de Agosto de 1838. (Um povo de brandos costumes?) Acresce dizer que não somos monárquico nem republicano, mas apenas um algarvio mais, que defende as suas origens.
então mas o algarve ainda é um reino, se repararem quando a republica foi implantada foi apenas implantada em Portugal e não no Algarve.