Arqueólogos entusiasmados com as primeiras escavações na “Balsa” em Tavira

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A cidade romana da Balsa, localiza-se na freguesia da Luz de Tavira e o projeto que durará 3 anos tem como intuito recuperara e divulgar a cidade romana através da realização de prospeções geofísicas, trabalhos arqueológicos, estudos científicos, musealização e divulgação. O projeto “Balsa – em busca das origens do Algarve” é promovido pela Universidade do Algarve, pela Câmara Municipal de Tavira, Direção Regional de Cultura do Algarve e pelo Centro de Ciência Viva de Tavira.

Este estudo visa em primeiro lugar determinar os reais limites desta cidade romana e criar uma área de proteção para preservar a urbe; em segundo lugar o objetivo é saber o que é que ainda se preserva e quais os níveis de destruição. Vão realizar-se prospeções geofísicas, para radiografar o subsolo e negociar com os proprietários de outros terrenos para ter a possibilidade de estudar os solos. Sendo que posteriormente, pretende-se terminar o projeto com uma exposição no Museu de Tavira para apresentar todo o trabalho decorrido na “Balsa”, de modo a mostrar o que era esta cidade romana. O estudo é realizado por uma equipa composta por 10 elementos: João Bernardes, arqueólogo e professor da Universidade do Algarve; Celso Candeias, arqueólogo da Câmara de Tavira; o arqueólogo Vitor Dias e estudantes voluntários.

O professor João Pedro Bernardes, do departamento de Artes e Humanidades da Universidade do Algarve (Gambelas), coordena a equipa de arqueólogos da “Balsa” e acredita que na colina do terreno da Quinta da Torre D’ aires seria o fórum, o centro da cidade, pois há grandes estruturas de betão romano na encosta que são visíveis, e posteriormente, mais a baixo há outra grande estrutura em conexão com a ria, por isso, pensa-se que nesta zona deveria existir um ancoradouro. Realizaram variados testes e por fim, com uma retroescavadora efetuaram sondagens, verificando que os lodos fossilizados, os quais estavam antigamente no limite da ria, enganaram o teste geofísico fazendo com que este assinalasse a existência de uma estrutura ovalada, algo que não se verificou após o teste efetuado com a retroescavadora.

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Bernardes explica que o início da cidade preservada será a partir do caminho onde se encontra a estrutura danificada pelas máquinas agrícolas, e possivelmente estende-se até à ribeira das antas que fica a uma distância de 150 metros daquele local (já noutra propriedade), onde foi identificada outra necrópole. Na propriedade atual, a quantidade de terra desde a colina até à primeira escavação é diminuta e considera-se que as estruturas devem estar destruídas devido às máquinas e trabalhos agrícolas.

Do outro lado da colina surgiram estruturas que os arqueólogos ainda não sabem o que são exatamente, mas João adianta que se forem estruturas funerárias isso significa que aquele local é o limite da cidade. Esta afirmação surge porque em 2017 foram encontradas naquele sítio 3 sepulturas do século IV e V, o que leva a acreditar que as restantes sejam estruturas funerárias. Contudo, só no próximo ano é que poderão verificar. O professor recorda que no período correspondente ao século V e VI, as necrópoles avançaram sobre a cidade, ocupando o espaço dos vivos, numa época onde a cidade já estava a regredir. Relativamente a este local, o arqueólogo do século XIX, Estácio da Veiga escavou a 300 metros das casas que se situam na colina e encontrou uma sepultura. Atualmente, foram feitos estudos onde se verificou que a necrópole que existia na parte norte foi arrasada e existem fotografias (duas foram publicadas por Luís Fraga da Silva), que demonstram a destruição, logo, o terreno não tem interesse arqueológico, porque não há registos de estruturas intactas.

Relativamente há construção de porto, os romanos não estavam muito familiarizados em lidar com a amplitude das marés, construíram grandes estruturas portuárias no mediterrâneo, onde a subida das marés era de 1 a 1,5 metros, mas nesta zona não existem grandes estruturas devido há grande amplitude das marés que tinham entre 3 a 4 metros, para além de uma ondulação muito forte, uma das exceções em Portugal é a “boca do rio”, onde se realizam escavações. “Nesta zona espera-se encontrar um ancoradouro mais modesto, do que aquela estrutura portuária que se tem vindo a defender” refere o investigador.

O arqueólogo de campo, Vitor Dias, explicou que segundo os resultados geofísicos foram identificadas várias estruturas, por isso, iniciaram a escavação num segundo local e encontraram muros, aparentando ser uma via com uma calçada (com orientação este-oeste), nesta escavação pretende-se saber qual a dimensão da via. Descobriram também canalizações correspondentes a um período posterior (tardo-romano), quando a via deixou de ser utilizada como tal.  Enquanto vão escavando encontram pedaços de cerâmica oriunda de diferentes locais, várias moedas, metais, conchas fossilizadas de tamanho muito superior às atuais, como é o caso da concha de uma ostra.

De acordo com o investigador Bernardes, há duas fases de construção da cidade romana, a primeira que corresponde ao momento áureo da cidade que começou no século I a.C.  e V, que está patente nas pedras grandes mais trabalhadas, com edifícios muito relevantes. No entanto, verifica-se que houve uma catástrofe em toda a costa Algarvia e na Andaluzia que arrasou com todas as cidades, no final do século II, início do século III, que terá sido provavelmente um tsunami. Foi bem identificado numa cidade da Andaluzia, onde os geólogos dessa cidade irão tentar identificar esse fenómeno na balsa. Este cataclismo marcou o final da fase áurea da cidade, embora se verificasse que continuou a ser habitada até ao século VII, mas viviam sobre ruínas, as suas construções passaram a ser mais pobres, sem grandes recursos e parece ter havido uma reutilização de materiais.  O investigador João Bernardes defende que a cidade é mais pequena do que se afirma, na medida em que têm incluído outras áreas que correspondem aos arredores das cidades, como pequenas vilas que não faziam parte da urbe.

O arqueólogo João Bernardes, explicou que os investigadores obtêm informação sobre o solo e estruturas arqueológicas através do geomagnetismo, recorrendo a um aparelho que mede o magnetismo do solo através de uma pequena corrente elétrica, que permite detetar as estruturas que subsistem no solo. Existe também o Georadar ou GPR, mais minucioso, é uma espécie de radar de penetração no terreno, o aparelho envia ondas rádio para o solo, é medida a retração como o “radar” dos morcegos, este permite obter também a profundidade. Existe ainda o resistivímetro que envia uma corrente elétrica pelo subsolo, permitindo detetar estruturas (foi usado perto do rio). Este estudo dará a possibilidade de reconstruir a malha urbana, a orientação das ruas e sua largura.

No futuro os arqueólogos pretendem contatar com os proprietários de outros terrenos e efetuar uma prospeção geofísica desde o local escavado atualmente, até à zona da ribeira das antas. Nos próximos dois anos têm como intuito realizar sondagens na colina para confirmar se aquele era realmente o local do fórum e da praça pública. De igual modo, pretendem criar uma estratigrafia, para “ler” a colina em termos temporais desde a atualidade até às origens da sua ocupação, que podem ser anteriores à data que se considera ser a origem desta cidade.

A “balsa” esconde um mundo misterioso que poderá responder a várias questões.

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