Esta dos aeroportos apenas dá para nos lamentarmos de que já temos aeroportos a mais. Não há miséria que não dê em fartura. E também não há loucura que não tenha a sua hora. Em matéria de aeroportos, chegou essa hora. Nem se acredita bem que tenha partido de quem partiu, mas a mais recente proposta cai das nuvens. Ora foi sugerido que o aeroporto algarvio ainda mal aquecido com o nome de Gago Coutinho, deve ser desativado e dar lugar a um sucedâneo do extinto aeródromo de Vilamoura para acolher jatos privados e pequenos aviões de rotas de curta distância, deslocando-se para Beja o tráfego nacional e internacional do Algarve a somar ao de Lisboa. Como se, para os cavalos, estivéssemos ainda no Império romano com Pax Julia equidistante de Olissipo e de Ossonoba…
Portanto, depois da fase do olival intensivo, eis a fase do aeroporto intensivo agora com comboios de alta velocidade a surgirem traçados no Alentejo como campos de girassóis regados em todas as direções por miraculosos canais do Alqueva. E com isto, apertam-se as contas conforme a conveniência – Lisboa já esteve a uma hora e 25 minutos de Beja, esse tempo já baixou artificiosamente para 75 minutos se a tal alta velocidade despontar no horizonte, e até pode ficar reduzido a 12 minutos se o comboio for hipersónico como nas bombas da guerra… E do Algarve, com Albufeira no centro (para quê Faro nisto?) as contas fazem-se em cerca de uma hora com o mesmo comboio de alta velocidade sempre a direito independentemente de montes e vales, e se não for por terra é pelos ares onde não há curvas nem viadutos…
É preciso desconhecer os anos e anos que o comboio a vapor levou até chegar ao Algarve, os anos e anos pelos solavancos do IR2, os anos e anos que tivemos de esperar pelo termo da A2, os anos e anos que não teremos que esperar pela eletrificação completa da atual linha simples do Sul, e mais a eternidade até que chegue a via dupla, os anos e anos das nossas vidas à espera da requalificação da A125, os anos e anos à espera da estação central intermodal, os anos e anos à espera de uns laivos para transportes integrados de superfície para a área metropolitana São Brás/Olhão/Faro/Montenegro/Loulé/Almancil/Quarteira, os anos e anos que não serão até que a ligação do Algarve a Sevilha não tenha que esperar por algum dote de casamento concedido por novo Afonso X…
Claro que não é motivo para grande gáudio assistir-se às trocas baldrocas dos muitos aeroportos que as sucessivas imaginações governamentais já plantaram à volta de Lisboa, cada qual sem grande ganho de causa. Têm direito a errar. Mas também não é motivo para causar tristeza, esse lóbi alentejano para salvar do mapa uma antiga base militar alemã conferindo-lhe uma utilidade longe de ter sido pensada inicialmente, bem pelo contrário. Um lóbi é livre de forçar a porta. Mas daí até propor desabridamente a desativação do Aeroporto Gago Coutinho implicando o fim das ligações aéreas internacionais de e para o Algarve, vai uma distância que é uma loucura, e uma loucura desnecessária que só descredita o lóbi. O mesmo será dizer que a conversa do aeroporto de Beja já vai longe de mais. E será muito bom que a conversa páre ou fique por aí para não se dar o caso de os anticorpos levantarem voo, o que seria também uma loucura em má hora.
Flagrante pedido aos predadores: Não nos comam as papas na cabeça. Pedido sobretudo aos predadores da nossa estimada saúde.
Carlos Albino