Três pontos
As tardes de Sábado na RTP1, são passadas em Celorico da Beira, Fornos de Algodres, Miranda do Douro; Miranda do Corvo, Carrazeda de Ansiães, Freixo de Espada à Cinta; Unhais da Serra, Pampilhosa da Serra. Dir-me-ão que se trata uma forma de levar os nossos telespectadores a antever as delícias da interioridade sob a forma de uma visita virtual às várias capitais desde o porco alentejano à da urze da montanha. Esse é – parece-me – realmente o engodo para o nosso bom povo e imortal se desunhar a marcar um certo número de telefone de valor acrescentado, que ao fim de um dia a encher os cofres da RTP, dá quarenta mil euros de prémio a uma telespectadora que via televisão enquanto faz uma máquina de roupa. A TVI faz exactamente a mesma coisa, mas que raio, trata-se de um canal privado e não o de serviço público que a RTP diz que é. Os portugueses são livres de marcar ou não o tal número, mas que não me parece bem, não me parece. E o que é mais triste: todas as piruetas que as autarquias do interior fazem para que não se esqueçam completamente que existem, aqui apoiadas nas tretas dos telefonemas e na má música portuguesa.
Por falar em parecer; parece que o festival doméstico da canção foi ganho por uma música totalmente pimba. Segundo consta o original era de Emanuel. Se quiserem fazer piada sobre o caso, poderão dizer que apesar de tudo, sendo a música muito má (que eu não ouvi ainda. Apenas tenho um bom serviço de informações), ao menos não devemos correr o perigo de, ainda por cima ser um plágio: isto se se desse o caso do autor ter sido outro português de coração e raça que também navega nas águas do pimba, agora rebaptizado como música ligeira portuguesa.
A SIC tem um apontamento que aparece uma vez por semana, segundo creio depois do noticiário do Domingo à noite. Chama-se, se a memória não me falha, Abandonados. Trata-se de um documentário sobre edifícios de traça nobre, quer pela utilização (fruição, em linguagem da RTP2), quer pela arquitectura (ou as duas juntas) que estão, como o nome indica, abandonados. Os portugueses fazem bons documentários. Ligam bem com a realidade e podem torná-la, como no caso vertente, bastante poética, se é que aqui o adjectivo bastante, tem qualquer cabimento. Existe uma parte do trabalho que podemos entender como uma crítica ao Deus dará a que é entregue o nosso património em geral. Mas o documentário vai mais além, chama-nos de uma forma emotiva a contrariar o esquecimento a que tudo é votado, se deixa de ter utilidade visível a muito curto prazo. Agora não há dinheiro mas era rigorosamente igual quando havia. Não cuidarmos dos nossos edifícios é também uma forma de dizer que nos estamos a marimbar para a história. A que nos correu e a que não nos correu bem. E isso é sempre muito mau.
Fernando Proença