Avarias: Inquietações

Andei na internet (a respeito de umas músicas e espectáculos, que não vêm ao caso) a cuscar sobre uns músicos /intérpretes/ bandas que me interessavam e assim, muito de repente, espantei-me com o que se sabe sobre as pessoas graças ao invento de que lhes falei atrás. Lembro-me que este (o segredo) seria uma das regras de ouro da pop; não fales demasiado sobre ti.

Isso era bom e verdade, talvez quando as galinhas tinham dentes e as vacas faziam ninhos nos beirais das casas. Hoje, parece que interessa que toda a gente saiba, exactamente, todos os passos que se deram, mesmo que tenham sido trôpegos e incertos.

Dirão que nada vence a honestidade, embora me pareça que não andamos aqui a fazer exercícios acelerados de ética e que, demasiada honestidade faz mal ao colesterol.

Então entremos nas pequenas viquipédias de cada um: o que fica de se andar a bisbilhotar a vida de um músico, é a noção de um certo deslaçamento e aparente contradição nas escolhas dos caminhos que seguiu, por via dos sucessivos projectos (como se diz agora e sem o jota antes do tê), com que os músicos se abalançam. O mais normal é que alguém, com cinco ou seis anos de carreira (atenção, porque na maioria dos casos nem de carreira se pode falar.

Os músicos tocam à sexta e ao sábado, ensaiam nos restantes dias à noite, mas continuam a tirar cafés ou a ensinar Filosofia na escola secundária durante o dia), tenha saído e entrado em, pelo menos, três ou quatro vezes de variadas bandas, ao mesmo tempo que manteve seis ou sete ditos projectos, que por um galo do caraças praticamente ninguém ouviu falar. E era exactamente isto que ninguém precisava de saber, porque não ganha nada com isso.

Esta é uma realidade que me parece sempre próxima da dos jogadores de futebol, ou pelo menos de alguns jogadores de futebol. Experimente o leitor dar uma olhada a um dos jogos transmitidos pelo canal 11, para ficar com uma ideia. Um jogador de vinte e um anos parece já um veterano: início da formação no Braga (e isto tudo a título de exemplo. A realidade ultrapassa, mais vezes do que eu pensaria ser normal, a ficção do meu texto), depois um ano em Itália, dois em Inglaterra, um ano de seniores em Chipre, volta à Itália (não em bicicleta) e por fim um exílio de ouro em Lourosa.

Eu sei que isto é consequência dos tempos: começa-se a andar pelo estrangeiro muito cedo, que em teoria é muito bom e muito moderno. Trata-se de alguém que não ficou por cá a chorar, porque não lhe davam oportunidades. Mas, a mim fica-me um amargo de boca: que raio de vida é esta, de alguém com dezasseis anos que ruma a Itália à procura de emprego, só porque andou nas escolas de um grande (ou mais ou menos grande) de Portugal e a partir daí – muitas vezes manipulado por pais e pequenos e médios empresários – não mais encontrará parança? Provavelmente será uma vida muito melhor que a minha, mas mesmo assim permito-me a dúvida.

Fernando Proença

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