Opinião de Fernando Proença
Há muito tempo que não olhava para uma telenovela portuguesa. Como não tenho visto as brasileiras não sei em que pé esta está e não consigo fazer comparações, mas não é para isso que eu pego na pluma. A minha missão secreta é devolver a benfeitoria ao mundo e contribuir para a criação do Homem Novo, mas só se me pagarem. No entanto pelos pequenos momentos que vou espreitando aqui e ali, penso existirem nas duas (portuguesas e brasileiras) um ponto em comum: transformaram-se num veículo proselitista da boa moral. Os brasileiros é que são os culpados disso; porque as fazem há mais tempo e talvez pelo facto de serem brasileiros, embora eu não tenha a certeza absoluta. Como existem povos mais adiantados que os brasucas, então os argumentistas das novelas começaram a fazer o que os ideólogos do audiovisual dizem ser serviço público. Viu cara? No Nordeste não lavam as mãos antes do almoço? Então na novela (da hora do almoço), aparecem multidões de actores a lavar mãos a dizer que é importante lavá-las, e até alguém que por não ter passado as unhas por água, vai estar às portas da morte, com uma infecção derivada de um vírus transmitido pelo incorrecto manuseamento de um macaco do nariz. É preciso dizer que eu não estou liminarmente em discordância contra estas boas mensagens: sou contra Passos Coelho e também não me agrada especialmente o FêCêPê, mas para ódios de estimação já chegam. Mas chega a ser um pouco para o demasiado, tanto “faça assim ou pense assado, vai ver que não custa nada”, escarrapachado no que respeita a pessoas com cancro, questões de homofobia, violência doméstica e racismo. Num futuro mundo horrível e jovem (de cabeça), as novelas substituirão a escolaridade obrigatória e darão um empurrão para resolver os problemas da – como agora se diz – iliteracia. E com um bocado de sorte premiarão a protecção civil e os bombeiros com a sua sabedoria, principalmente nas evacuações de edifícios públicos. Já para daqui a meses espera-se uma telenovela com imagens de eutanásia e da adopção por casais do mesmo sexo. Sobre esta última se calhar já foi feita qualquer coisinha, mas da qual eu não tenho notícias. Viram o cartaz do BE sobre Jesus ter dois pais? E já assinaram a petição contra? Se não o fizeram do que é que estão à espera? Não defendo a ideia, mas a oportunidade lembrou-me que os portugueses do jesuicharli, são menos do que parecem. Vá lá que os tugas são mais para a mesa e futebol, porque se fossem para as causas (quaisquer que elas fossem), já andavam a arrancar cartazes, atirar bombas para a sede do BE e achincalhar as jeitosas do Bloco. É que nas redes sociais e internet em geral tem sido um derriço: toda a gente acha do pior, a igreja então está que não se pode. Cá para mim dei a pensar que metade do pessoal em Fátima, estaria catatónico e ligado à máquina, de tanto esbracejar contra aquela obra do Diabo. Aliás seria a própria Besta Negra a fazer o boneco, transfigurada de activista política. Não discuto o gosto da obra, mas tem sido uma reacção um bocado despropositada, não acham? Ainda existem certas coisas que não podem ser tocadas.
Fernando Proença