AVARIAS: Um festival e uma questão

Ainda bem que só ganhámos uma vez o Eurofestival. Pela amostra deste ano, já deito os bastidores por tudo quanto é sítio e no futuro só pode piorar. O Eurofestival é bem o exemplo da natureza humana adaptada ao mundo da música: os que antes o vilipendiavam e gozavam são agora os que mais o promovem. Para isso bastou que ganhássemos e que a responsável pelo evento seja a televisão do Estado, que por sua vez tem como subsidiária a Antena 3, e que os músicos convidados para escreverem temas venham em parte do mundo da chamada música portuguesa alternativa, ou música alternativa feita por portugueses. A pescada põe o rabo na boca quando os protegidos pela mesma Antena 3, são os implicados na coisa. Isto pela parte que me toca, por que os que ouvem a Antena 1 devem dizer o mesmo, e tenho dúvidas que tal fervor religioso não chegue aos da Antena 2, nos momentos em que os quartetos de câmara dão um intervalo para o lanche. Será uma questão relacionada com a eterna relação entre patrão e funcionário, o exemplo duma relação de trabalho, ligada neste caso à música. Parece-me uma ideia pop, esta de andar sobre a estreita linha que separa a boa da má música, mas de qualquer maneira, muito longe do que dizem, os da Antena 3, praticar.
Tenho, também, lido umas linhas sobre os tempos que correm, onde se pode inscrever um texto de Patrícia Reis, “A liberdade não se faz com salários de 600 euros” e que versa sobre o que anda por aí, de existirem licenciados e doutorados, com idades compreendidas entre os vinte e dois e os trinta anos, a ganhar 600 euros por mês. Finalmente alguém se lembrou de pôr em causa a estrutura dos salários em Portugal, começando pelo mais evidente: um gajo anda a queimar as pestanas a estudar ano a fio, para no fim de contas ganhar o mesmo que um que andou a queimar pestanas a ver jogos de computador, desafios de futebol na televisão e realitichous. Vem tarde, mas antes tarde que nunca. A questão é que me parece que o choradinho em prol da geração mais bem prepara de sempre, se mantém, com uma ou outra nuance. Já sabemos que os mais velhos esgotam as possibilidades dos mais novos, deixando-lhes uma dívida para pagar ao longo de toda a sua vida; mas quando essa dívida é, em parte feita para os manter os seus doutoramentos e o seu estilo de vida, que dizer? Não seria já hora de todos os que fizeram um percurso académico imaculado, deixarem, por exemplo, o feicebuque, a enviar vídeos de gatinhos e de Trump a fazer de Bruno de Carvalho e passarem a usar as redes sociais para se unirem na contestação?, planeando e fazendo acções de protesto, organizando greves, vindo para a rua protestar? Lembrei-me de tudo isto muito por causa do 25 de Abril dia que marcou a nossa vida e, a que se seguiram – é certo – erros e omissões. Os tempos eram outros, mas exigiu-se e lutou-se pela mudança. Mas tudo isso parece ter passado à história.

Fernando Proença

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