Bactérias ameaçam portugueses

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Episódios de infeção em hospitais, colocando em risco a vida de quem está internado, vão continuar a acontecer. Os peritos da Direção-Geral da Saúde (DGS) reconhecem que estão a aumentar algumas bactérias capazes de resistirem às primeiras linhas de antibióticos. O dado alarmante consta de um relatório divulgado esta terça-feira pela DGS sobre a “Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistências aos Antimicrobianos 2015”.

As campainhas de alarme soaram com o aumento de algumas estirpes, em especial da Klebsiella pneumoniae, que amiúde tem provocado surtos entre doentes internados em vários hospitais do país. Escrevem os peritos que “mais preocupante” são os casos de “resistência às quinolonas (antibióticos de aplicação alargada, que devem ser reservado para casos em que as opções mais comuns não resultam) em Escherichia coli” – responsável pela maioria das infeções urinárias comuns – , mais ainda do aumento das estirpes produtoras de B-lactamases (enzima produzida por bactérias para resistirem aos antibióticos) de espetro alargado, mas principalmente da ameaça que constitui a Klebsiella pneumoniae resistente aos carbapenemos (antibióticos de largo espectro)”.

Medicina atual “posta em causa”

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A afirmação técnica traduz-se, na prática, no aumento dos microrganismos capazes de sobreviverem ao tratamento administrado ao doente, que, assim, continua a definhar, em alguns casos até à morte. Os autores do relatório são claros: “Em última análise, se a resolução dos problemas interligados das resistências aos anti-microbianos e das infeções associadas aos cuidados de saúde não for encarada de frente, serão a medicina que hoje se pratica e a esperança de vida como hoje a encaramos que serão postas em causa.”

Portugal tem um programa de combate no terreno, com carácter prioritário, mas os especialistas defendem ser necessário reforçar algumas intervenções. “Reduzir a pressão antibiótica, prevenindo todas as infeções evitáveis, não usando antibióticos quando não existe infeção bacteriana e reduzindo a duração da terapêutica ao mínimo indispensável para curar a infeção e evitar a recidiva” é prioritário.

Seguem-se a otimização das “boas práticas de prevenção e controlo da transmissão da infeção nos serviços de saúde, adequando os processos e encontrando novas formas, mais eficientes, de os implementar” e “corrigir problemas estruturais e de funcionamento dos serviços, os quais em muitos casos tendem a dificultar ou, na prática, inviabilizar a implementação de boas práticas”.

Os casos de Klebsiella resistente já verificados em Portugal, o mais recente no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, colocam o país no “estádio epidemiológico 2b”, isto é, no terceiro lugar de uma escala com sete patamares. A saber: “Nenhum caso reportado (estádio 0); ocorrência esporádica (1) surto hospitalar único (2a); surtos hospitalares esporádicos (2b); propagação regional (3); propagação inter-regional (4), e situação endémica (5).”

Na nota enviada às redações, a DGS adianta que “está em progresso uma campanha nacional que incide sobre as Precauções Básicas do Controlo de Infeção, como instrumento basilar de boas práticas na prevenção da transmissão destas infeções”. E “foram também publicadas normas orientadoras de boas práticas, estando outras em fase de elaboração ou revisão”. Além disso, acrescentam que é necessária “a focalização da atenção no setor dos cuidados continuados e na definição de novos incentivos às unidades de saúde para o cumprimento de boas práticas de prevenção e controlo de infeção e de resistências aos antibióticos”.

Menos grave é a situação detetada com outros agentes, com “taxas que ainda assim se mantém elevadas”. Por exemplo, “verificou-se uma redução das taxas de resistência em alguns microrganismos multirresistentes, como Staphylococcus aureus resistente à meticilina, Enterococcus ou Acinetobacter”.

Também no consumo de antibióticos há progressos a assinalar. “Registaram-se evoluções positivas, principalmente na classe das quinolonas, cujo consumo desceu, entre 2011 e 2014, 27% no ambulatório e mais de 8% a nível hospitalar.” A mesma tendência “da inversão crescente” foi verificada “no consumo de carbapenemos, antibióticos associados à seleção de bactérias multirresistentes, o qual diminuiu 5% entre 2013 e 2014”.

No relatório, a DGS dá ainda nota de “uma redução da incidência de algumas infeções, como é o caso da pneumonia associada à intubação traqueal, nas unidades de cuidados intensivos, que apresenta taxas comparáveis à média europeia”. O mesmo aconteceu com a infeção “bacteriana associada a cateter venoso central associada a cirurgia do cólon e reto”. O inverso, com “um ligeiro agravamento”, registou-se na infeção associada a cirurgia das vias biliares.

Estimados dez milhões de mortos

Os peritos salientam que “projeções internacionais estimam que se nada for feito, mais efetivo do que até agora, morrerão anualmente cerca de 390 mil pessoas na Europa e dez milhões em todo o mundo em consequência direta das resistências aos antimicrobianos”. A própria Organização Mundial da Saúde já avisou que a resistência aos antibióticos constitui um “perigo para a saúde mundial”.

Vera Lúcia Arreigoso (Rede Expresso)

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