Bombeiros: Financiamento não garante “níveis mínimos” em todo país

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“Constatou-se que o financiamento dos corpos de bombeiros em Portugal não tem por base um modelo integrado e coerente capaz de garantir níveis mínimos de qualidade e prontidão”, lê-se na “Auditoria ao financiamento pelos municípios de corpos e associações de bombeiros”.

O Tribunal de Contas (TdC) fundamenta esta conclusão, entre outros argumentos, com uma distribuição dos corpos de bombeiros pelo continente que “não atende a critérios de economia, eficiência e eficácia”, por não estar definido um “desempenho padrão em função do risco e das características do território” ou por os corpos de bombeiros apresentarem “diferenças substanciais de meios e de níveis de serviço” que dependem da sua tipologia (sapadores, municipais, voluntários com ou sem equipas de intervenção permanente), mas também, e em grande medida, “da capacidade e disponibilidade” de cada município para suportar o financiamento, mesmo que seja apenas parcial, como acontece com os corpos que são Associação Humanitária de Bombeiros (AHB), a grande maioria em Portugal.

Segundo o relatório da auditoria, que se baseia, fundamentalmente, em dados relativos a 2019, havia no final desse ano 434 corpos de bombeiros em Portugal Continental, sendo 412 AHB e 22 corpos municipais (profissionais).

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Só um dos 278 concelhos não tem corpo de bombeiros (Castro Marim), havendo dez municípios no polo oposto, com mais de cinco: Alijó, Cascais, Gondomar, Lisboa, Loures, Oeiras, Paredes, Sintra, Vila Franca de Xira e Vila Nova de Gaia. O recordista é Sintra, com nove, no entanto, 192 concelhos têm apenas um corpo de bombeiros e 52 têm dois.

O TdC não encontrou critérios relacionados com a área de intervenção, localização ou população que expliquem a distribuição dos corpos de bombeiros pelo território, apontando para a origem local e histórica dos grupos de bombeiros em Portugal, alguns deles com mais de 150 anos.

O financiamento das 412 AHB é um misto de verbas oriundas da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (previstas no Orçamento do Estado e que obedecem a uma fórmula de cálculo), das autarquias e de outras entidades públicas (como fundos comunitários, financiamento de programas e ações concretas). Há ainda algumas receitas próprias, de origem privada.

“Não estando definidas regras objetivas de financiamento dos municípios às AHB”, as autarquias “socorrem-se do RJALEI [Regime Jurídico das Autarquias Locais], cabendo-lhes definir as formas de apoio e, consequentemente, os critérios, montantes e pressupostos”, lê-se no relatório do TdC.

O financiamento dos corpos de bombeiros não obedece, assim, a um modelo, com o peso e o papel das autarquias a ser determinante e a originar um universo muito heterogéneo e não integrado de situações, incluindo ao nível da “abrangência de serviços” prestados pelos bombeiros. Ao mesmo tempo, não havendo um enquadramento legal ou modelo, não há também mecanismos de controlo de financiamento que evitem, por exemplo, duplicação de verbas para os mesmos fins.

“A concessão de apoios às AHB não tem por base uma análise integrada do conjunto de apoios públicos e não se encontram adotados mecanismos de acompanhamento e controlo da sua boa aplicação”, escreve o Tribunal de Contas.

Segundo o documento, em 2019, a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) financiou com 74,5 milhões euros os corpos de bombeiros que são associações, enquanto a parcela dos municípios foi 63,6 milhões, “o que significa que a despesa municipal com os corpos de bombeiros pode ter superado a despesa suportada pela ANEPC”, se forem considerados também “os custos incorridos com os corpos de bombeiros profissionais [sapadores e municipais]”, essencialmente suportados pelas respetivas autarquias.

“Neste cenário, a eficácia dos corpos de bombeiros fica dependente das características das lideranças, do empenho dos operacionais, das estratégias adotadas pelos municípios e da dinâmica socioeconómica local, refletindo, em grande medida, as disparidades existentes na capacidade financeira dos municípios e acentuando a divergência entre os territórios”, alerta o Tribunal de Contas, que recomenda ao Governo a criação de um “quadro legal adequado a uma reestruturação do modelo organizativo dos corpos de bombeiros que permita maior coesão territorial”.

“É evidente o grau de discricionariedade dos municípios na concessão de apoios às AHB, sendo que, em 2019, oscilaram entre o equivalente a 4,64 vezes os subsídios concedidos pela ANEPC às AHB a apenas cerca de 10% desses subsídios. Entre os municípios que dispõem de corpos municipais, alguns apoiaram as AHB de forma quase simbólica e outros contribuíram mais do que a própria ANEPC”, ilustra o TdC.

No total, 59 municípios (21,3%) concederam subvenções às AHB em montante superior ao dos apoios da ANEPC.

“Entre os municípios que mais financiam as AHB, predominam os da Área Metropolitana de Lisboa e os do Algarve.

A auditoria foi elaborada com dados nacionais da ANEPC e da Inspeção Geral das Finanças, de duas auditorias autónomas em Bragança e Odemira (cujos relatórios já haviam sido publicados), de “trabalho de campo” em mais seis municípios (Amadora, Matosinhos, Tomar, Sabugal, Setúbal e Portimão) e questionários a 28 concelhos.

“Apesar de a generalidade dos municípios analisados não explicitar os critérios de financiamento das AHB, não se detetaram situações de incumprimento dos requisitos de legalidade e regularidade”, segundo o TdC.

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