Caso da falsa ruína na REN vai ser entregue ao Ministério Público

ouvir notícia

Tribunal de Faro

.

O processo só agora seguiu para as instâncias judicias, quase quatro anos depois da queixa, mas apenas pouco mais de um mês depois do Jornal do Algarve ter feito eco da denúncia de Carlos Gonçalves

DOMINGOS VIEGAS

- Publicidade -

A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve decidiu enviar para o Ministério Público, através do Tribunal Judicial de Faro, a queixa sobre a criação de uma falsa ruína num terreno de Reserva Ecológica Nacional (REN). O terreno localiza-se na freguesia de Estoi, concelho de Faro, e a ruína terá sido criada com o objetivo de o valorizar e poder construir.

“Após várias diligências efetuadas por estes serviços, concluímos que, a matéria nela contida, consubstancia um concurso de infrações, nos termos do disposto, designadamente, no artigo 28.º da Lei 50/2006, de 29 de agosto (LQCOA), pelo que, decidimos, enviar o processo para o Ministério Público junto do Tribunal Judicial de Faro”, explicou aquela entidade, na última semana, em resposta à reclamação que tinha sido apresentada pelo queixoso, Carlos Gonçalves, devido à morosidade do processo.

Tal como o Jornal do Algarve noticiou nos passados meses de junho e julho, Carlos Gonçalves, proprietário de um terreno contíguo, apresentou a referida queixa em 2012, quando se apercebeu que a ruína tinha sido construída com pedras de um muro da sua propriedade. A proprietária do referido terreno construiu ainda um caminho e terá desviado os marcos e retirado um troço de terreno à propriedade de Carlos Gonçalves.

Apesar do processo ter seguido para o Ministério Público, Carlos Gonçalves diz estranhar porque é que este passo só foi dado agora pela CCDR, depois do caso ter sido noticiado pelo Jornal do Algarve e, depois, levado ao Parlamento pelo deputado bloquista João Vasconcelos, uma vez que a queixa foi apresentada há quase quatro anos.

“Ignoraram a minha queixa de 2012, ignoraram o parecer técnico do SEPNA da GNR, ignoraram o parecer do engenheiro José Dantas, ignoraram as fotos do Google Earth que provam que a ruína é falsa e andaram ocupados a estudar projetos de turismo rural para aquele terreno, na expetativa que eu não reagisse”, lamenta Carlos Gonçalves.

Aquele proprietário considera ainda que a forma de atuar da CCDR, ao longo destes quase quatro anos e em relação a um caso “de tão óbvia resolução”, tem “sérios sintomas de negligência e de incompetência profissional”.

“Pensei que este caso seria de fácil resolução, dada a facilidade em demonstrar as fraudes cometidas. No entanto, alguém quis que assim não acontecesse”, assegura Carlos Gonçalves, garantindo ainda que, para ele, o caso está longe de estar encerrado. E garante que continuam a existir, na região, mais casos idênticos de falsas ruínas, criadas para valorizar terrenos e para construir onde a lei não permite.

Falsa ruína legalizada em apenas um mês

A Câmara Municipal de Faro tinha explicado ao Jornal do Algarve que indeferiu, em 2014, um pedido de certidão de antiguidade do prédio. Por seu turno, a CCDR Algarve assegurou que rejeitou, em 2015, no âmbito da REN, um pedido para “alteração e ampliação de moradia para casa de campo e construção de piscina (empreendimento de turismo rural)” no referido terreno.

Porém, o diretor do Departamento de Infraestruturas e Urbanismo do Município de Faro assinou, a 03 de dezembro de 2013, antes de ter sido feita qualquer alteração na Conservatória, uma certidão em que certifica que “existem ruínas no terreno”. Nove dias depois, e ainda antes da ruína estar legalizada na Conservatória, a proprietária do terreno entregou nas Finanças um pedido para alteração à matriz original, para poder legalizar a ruína junto desta última entidade.

No mês seguinte, a 22 de janeiro de 2014, deu entrada na Conservatória de Olhão um registo de averbamento de alteração ao prédio (terreno) em causa: onde antes constava “terra de mato com árvores”, passou a constar “terra de mato com árvores e ruína”. Ou seja, depois de legalizar a falsa ruína nas Finanças, a proprietária passou a ter, a partir de janeiro de 2014, uma ruína em área de Reserva Ecológica Nacional também devidamente legalizada na Conservatória. E um terreno cujo valor aumentou de tal forma que chegou a estar à venda, recentemente, através de uma imobiliária, por 200 mil euros.

A 13 de agosto de 2014, depois da falsa ruína estar legalizada há mais de seis meses, o secretário da União de Freguesias de Conceição e Estoi assinou um atestado em que confirma que o referido terreno “tem uma ruína construída em data anterior à publicação do Regime Geral da Edificação e Urbanização de 7 de Agosto de 1951”.

Mas não há nenhum documento anterior a 2013 que indique a existência de uma ruína no local, as imagens de satélite do Google Earth confirmam que a ruína só surgiu nesse ano e um relatório do Serviço de Proteção da Natureza (SEPNA) da GNR também considera como plausível que a situação configure uma “ruína” construída recentemente.

Entretanto, e depois do Jornal do Algarve ter tornado o caso público, o deputado João Vasconcelos, do Bloco de Esquerda e eleito pelo Algarve, questionou o ministro do Ambiente sobre o processo. “Esta situação, a ser verdade, reveste-se de particular gravidade, motivo pela qual deve ser investigada com a maior urgência, custe o que custar e doa a quem doer”, considerou aquele parlamentar.

(Notícia publicada na edição impressa do Jornal do Algarve de 04/julho/2016)

.

.

.

.

.

- Publicidade -
spot_imgspot_img

Deixe um comentário

+Notícias

Exclusivos

Deixe um comentário

Por favor digite o seu comentário!
Por favor, digite o seu nome

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.