Conceição Cabrita: “Estamos a arrumar a casa para preparar o futuro”

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Em entrevista ao Jornal do Algarve, por ocasião do Dia da Fundação da Cidade, que se celebra este domingo (13 de maio), a presidente da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António falou, entre outros temas, sobre a situação financeira da autarquia, sobre a estratégia do executivo para o futuro e fez o ponto da situação de alguns dos projetos que estão a ser desenvolvidos

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DOMINGOS VIEGAS

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A Câmara continua a ser gerida pelo mesmo partido, após as últimas eleições, mas com uma equipa diferente. Qual é a diferença na forma de gerir a autarquia? O que é que mudou nestes seis meses?

Decidi avançar com uma equipa totalmente renovada, constituída por pessoas que nunca tinham estado aqui como vereadores. Eu sou a única exceção, porque fiz parte dos anteriores executivos, oito anos como vereadora e quatro anos como vice-presidente. Cheguei aqui sem qualquer passado na política, era professora e fazia voluntariado na Cruz Vermelha, mas sinto-me muito honrada de ter feito parte dos executivos liderados por Luís Gomes. Aprendi muito nestes últimos anos, mas temos formas diferentes de ver as coisas. Os restantes membros do executivo são pessoas que não integraram nenhum dos executivos nestes últimos doze anos e que têm uma perspetiva diferente. Por isso, estamos a arrumar a casa para preparar o futuro.

O que é que quer dizer com “arrumar a casa”?

É rever o que está bem e o que está mal, em todas as áreas. Não pretendo esquecer todo o passado, porque, e já afirmei isso, tive muito gosto em ter integrado os anteriores executivos, mas temos que ter uma visão diferente. É preciso reconhecer o que foi importante nestes doze anos e é preciso ter outra visão da gestão do município. Existe um passado, mas também temos um presente e um futuro pela frente. Temos estado a rever os regulamentos em todas as áreas. Face ao investimento que fizemos e face a todos os financiamento que têm de ser pagos, há três coisas que são fundamentais: tentar continuar a limpar algumas “gorduras”, rever os regulamentos, entre os quais o dos apoios da ação social, e tentar fazer com que a população fique cada vez menos dependente da Câmara. Não queremos que a Câmara seja o maior empregador do concelho, mas sim um mediador para os investimentos e, consequentemente, para a criação de emprego. E queremos desenvolver as três freguesias, sem mudar as características de cada uma.

Rever os apoios sociais significa que haverá cortes?

Significa que os critérios têm que ser alterados, mas sem deixar de ajudar quem mais precisa. Queremos, por exemplo, um apoio concertado, não por pessoa mas sim por família. Não vamos deixar de ajudar quem, realmente, precisa. Paralelamente, queremos também ajudar as pessoas a encontrar emprego. É uma visão diferente daquela que eu tinha quando fui vereadora, mas a realidade lá fora mudou, já começa a haver mais trabalho e é importante começar a ajudar as pessoas a encontrar esses postos de trabalho.

O último relatório do Conselho de Finanças Públicas (CFP) colocou a Câmara de VRSA em rotura financeira. Isto significa que a situação financeira da autarquia não melhorou…

O relatório colocou esta Câmara entre as cinco mais endividadas do país. Sei perfeitamente que não me posso desvincular do passado, mas, como estive cá, também sei perfeitamente porque é que chegámos a essa situação. Houve necessidade de fazer grandes investimentos. As pessoas estão cansadas de ouvir isto, mas é a verdade. Investimos 65 milhões de euros em saneamento básico, para reestruturar as redes em todo o concelho. Tivemos apoios comunitários, é verdade, mas, mesmo assim, é um grande valor. A Câmara já tinha dívidas quando cá chegámos, depois, nestes doze anos, e além do saneamento básico, tivemos que concluir a biblioteca municipal e as piscinas, construímos a escola de Santo António e renovámos todo o parque escolar, requalificámos toda a estrada entre a Aldeia Nova e Vila Real de Santo António, entre muitas outras obras. Agora, há quem lhe chame dívida. Eu continuo a defender que é investimento. Tivemos que pedir dinheiro à banca para fazer estes investimentos. Neste momento estamos a tentar renegociar esta dívida, que foi contraída para investir. Também é preciso relembrar que aumentámos o património da Câmara. Parte do património não estava inventariado e também adquirimos património. Passámos de um património de 15 milhões para 200 milhões de euros.

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Chegou a dizer que o relatório do CFP estava desatualizado e que os dados eram dos anos entre 2014 e 2016. Mas o que é que mudou de 2016 para cá? A dívida foi reduzida?

Desde 2016 para cá, a Câmara tentou diminuir a dívida. O grande problema é a receita. A quebra na receita foi muito acentuada há alguns anos atrás e não está a aumentar como nós gostaríamos. Agora, o que temos que fazer é diminuir a dívida, e é nisto que estamos, mas também tentar aumentar a receita. Não podemos esquecer que, ao contrário do que sucede com outros municípios, a Câmara de Vila Real de Santo António vive, exclusivamente, de receitas próprias. Temos que aumentar a receita, por exemplo, com a rentabilização do património.

Quer dizer vender património?

Quando falo no património não é alienar só por alienar, é fazer a rentabilização dos ativos, sem que a Câmara perca a posse dos imóveis, como vai acontecer com o Hotel Guadiana, que deverá abrir em meados de junho, com o supermercado que está praticamente concluído junto ao complexo desportivo, com a Pousada de Portugal, do Grupo Pestana, que vai nascer no centro da cidade e cuja escritura foi assinada esta semana…. Salvo alguma exceção, como é o caso do terreno em frente ao Hotel Vasco da Gama, em Monte Gordo, é esse o caminho que pretendemos seguir, ou seja, rentabilizar, por exemplo, através de rendas. E estas situações também têm que ter sempre o objetivo de alavancar a economia, em termos de comercio, de turismo e, principalmente, da criação de emprego. Estas medidas têm que significar mais entrada de licenças na Câmara, mais investimento no concelho, têm que significar que esse património vai fomentar a criação de postos de trabalho.

Houve municípios que também recorreram ao Fundo de Apoio Municipal (FAM) e ao Programa de Apoio à Economia Local (PAEL), tal como VRSA, mas atualmente já estão praticamente libertos desses créditos e melhoraram a sua situação económica. Porque é que isso ainda não aconteceu em Vila Real de Santo António?

Quero recordar que nós ainda não recebemos a terceira tranche do FAM. Neste momento estamos a reestruturar toda a dívida para renegociar novamente. Estamos a tentar renegociar os juros, porque são altíssimos. É preciso perceber que a dívida também vem daí, vem dos empréstimos que fizemos e dos juros enormes que nos estão a cobrar. Não é fácil. Mas, quando me candidatei, já sabia qual era o “estado da nação”.

Na sua perspetiva, quando é que Vila Real de Santo António estará livre destas dívidas e quando é que grande parte da receita passará a servir para fazer obra?

Infelizmente, não posso garantir datas. O que posso é dizer que o desafogo avançará mais depressa se surgirem mais investidores no concelho, ou seja, se começarem a entrar mais pedidos de licenças na Câmara. Se conseguirmos rentabilizar o terreno localizado em frente ao Hotel Vasco da Gama, se conseguirmos relocalizar o parque de campismo e rentabilizar o espaço onde se encontra atualmente… Se conseguirmos rentabilizar estas e outras zonas, a dívida vai reduzir substancialmente. Porém, é preciso frisar que, apesar das dificuldades e da contenção de despesas, o investimento não estagnou. Por exemplo, não podemos construir um mercado municipal novo mas, este ano, avançámos com obras de remodelação. Avançámos com a obra de requalificação da frente de mar de Monte Gordo. Requalificámos os parques infantis e vamos continuar. Antes, já tinha havido grandes obras de saneamento básico e todas as outras que já enumerei.

O que é que se passa com a dívida à empresa Águas do Algarve, que a Câmara se recusa a pagar?

É uma situação que já se arrasta há muitos anos. Nós não reconhecemos cerca de metade do valor que a Águas do Algarve diz que está em dívida. Há uma parte que diz respeito a investimentos em infraestruturas, que nós achamos que devem ser suportados pela Águas do Algarve. Depois, há outra parte que tem a ver com os valores mínimos, ou seja, temos que pagar mensalmente um valor mínimo mesmo que o consumo no concelho não atinja esse valor. Isto não faz qualquer sentido e vamos acumulando essa dívida porque nos recusamos, tal como estão a fazer outros municípios, a pagar água que não foi consumida. Provavelmente terão que ser os tribunais a resolver essa situação. Quanto ao restante, já acertámos um plano de pagamento e estamos a cumpri-lo.

A Doca pesca colocou em concurso público a zona ribeirinha, entre a Alfândega e a lota, o qual foi ganho por investidores ingleses. Tem indicação do ponto em que está esse processo?

Não parámos com esse processo, mas somos apenas intermediários. Neste momento, a Docapesca está à espera de uma resposta dos investidores. O concurso público já foi realizado e os investidores que ganharam têm agora um prazo, até ao final de junho, para informarem a Docapesca se pretendem realmente avançar, ou não. Tenho esperança que estes investidores ingleses vão responder positivamente. Caso contrário, temos outras hipóteses com a Docapesca e, se for caso disso, anunciaremos posteriormente.

Como é que está a prometida renegociação do estacionamento tarifado com a empresa concessionária?

Foi criada uma comissão, que reúne autarcas e comerciantes. Já tivemos a reunião com a ESSE e colocámos tudo em cima da mesa. Agora, a empresa está a pensar na melhor forma de chegarmos a um entendimento. A comissão também já voltou a reunir e agora estamos a aguardar nova reunião com a ESSE.

Depois da redução de um terço da zona tarifada, acredita realmente que ainda há margem para negociar?

Sim, acredito. A ESSE já mostrou que está disponível para conversar. Mas nós também temos que estar disponíveis para ver de que forma é que podemos compensar as alterações que forem feitas, sem prejudicar os munícipes.

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A obra do Pavilhão Multiusos continua parada, há anos. Como é que pensa resolver aquela situação?

Muitas vezes, a oposição critica e essa tem sido uma das situações. Mas esse é o seu papel. E também concordo que sejamos questionados, porque esse também é o seu papel. É preciso saber que, atualmente, aquela obra já está inscrita como sendo uma dívida nossa. E não era.

Como assim?

Aquela obra foi uma contrapartida da Unifaro para realizar habitação a custos controlados no concelho. Mas a Unifaro entrou em insolvência, não concluiu a obra e, posteriormente, o pavilhão foi incluído no processo de insolvência. Atualmente, o pavilhão também já foi incluído como previsão de dívida nas contas de 2017 da Câmara, ou seja, também veio ampliar a dívida da Câmara. Agora, ou reavemos o dinheiro ou reavemos o imóvel. Só assim é que poderemos avançar com a conclusão da obra. Está tudo nas mãos dos gestores da insolvência e não podemos mexer em nada até o Tribunal resolver.

A obra do hotel previsto para o complexo desportivo sempre avança este ano, como chegou a ser anunciado?

Só pode avançar quando o promotor construir os novos campos de ténis e de padel. Neste momento, ele está a procurar uma forma de financiar a obra daqueles equipamentos. Não pretendo que os campos atuais fiquem destruídos e depois possa haver alguma possibilidade de não se avançar com os campos nem com o hotel. Antes de mais, os campos têm que ser reconstruídos. O promotor tem que encontrar a solução, antes da construção do hotel. Foi isso que ficou definido. A Câmara cede os terrenos, mas nunca perde a sua posse, e o promotor suporta a construção do hotel, paga uma renda mensal e tem, ainda, que construir os novos campos. Por exemplo, o supermercado, que está quase concluído, também só abre quando os polidesportivos que foram demolidos estiverem, pelo menos, praticamente prontos.

E como é que pretende resolver a situação do hotel que estava previsto para a zona poente de Monte Gordo? O promotor já pagou à Câmara, mas não pode avançar com a obra…

Estamos à espera de uma resposta do ministro do Ambiente. Estivemos reunidos em abril e ele pediu-nos para esperar um mês. O problema é que há dois pareceres diferentes da mesma entidade. Um deles foi favorável e levou a que a Câmara avançasse com o concurso público, que está visado pelo Tribunal de Contas. Inclusivamente, foram tidas em conta todas as indicações que a Agência Portuguesa do Ambiente nos deu, inclusivamente para que o projeto fosse retirado da zona onde estava previsto e implementado na denominada zona urbana consolidada. Depois de tudo adjudicado e da escritura ter sido feita, veio um parecer negativo da mesma entidade.

Mas a questão também tem a ver com a posse do terreno. A Câmara negociou com um terreno que, alegadamente, não deveria ter passado para a posse da autarquia…

Como acabei de dizer, tivemos a referida reunião com o ministro e não percebo porque é que alguns órgãos de comunicação já começaram a falar em intenção de indeferimento. O segundo parecer fala na questão de o terreno não poder ser da câmara municipal, mas o ministro explicou-nos que o que está em causa não é a titularidade do terreno. O que está em causa é se naquela zona estava prevista a construção de um hotel. E estamos nesta situação. Se o parecer negativo se mantiver, o Estado terá que indemnizar a Câmara por informações contrárias dadas pela mesma entidade.

Este executivo também pretende avançar com a relocalização do parque de campismo de Monte Gordo?

Esse foi outro dos assuntos que levámos ao ministro do Ambiente. Apresentámos um estudo e ele ficou de nos responder se poderemos fazer uma concessão na zona poente de Monte Gordo, porque há uma parte que é da Câmara e outra que pertence ao Ministério Ambiente. Só depois é que poderemos pensar em avançar com a relocalização. Já disseram que queríamos acabar com o parque de campismo, mas não é isso. Queremos acabar com o parque de campismo naquela zona e queremos fazer um novo, a poente de Monte Gordo, desde que o ministro do Ambiente permita. Enquanto isso não acontecer, também não se pode fazer nada na zona onde se encontra atualmente o parque.

A população estranhou que o cortejo histórico não estivesse no programa do Dia da Cidade deste ano. Porque é que não haverá cortejo?

Vamos parar este ano para renovar. Não queremos ter mais do mesmo. No final de cada desfile fico sempre com a sensação de que é mais do mesmo. E também ouço sempre as pessoas dizer que, mais uma vez, foi mais do mesmo. Cada quadro tem que se adaptar ainda mais à realidade de cada século e vamos ter historiadores a preparar melhor o desfile. Também queremos renovar os trajes. Decidimos que esta é a altura para parar, para voltar, depois, ainda melhor.

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