CRÓNICA DE FARO: CONSIL – Uma história por escrever

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Foi uma das grandes referências, não só a nível de Faro como regional e, inclusive, nacional, com antecipados amanheceres do binómio, hoje tão amplamente apontado, “inovação e empreendedorismo, a existência da ‘CONSIL’ (Centro Consultivo de Química Industrial).


Desde os meados da década de 50 do século transato até à primeira metade dos anos 60 da mesma centúria, esta indústria tornou-se um verdadeiro expoente, alcançando um prestígio e uma presença não só na área da eletricidade como noutras atividades, onde a qualidade era fator de excelência.


Surgiu por iniciativa desse cérebro iluminado, com uma visão e um espírito criados “antes do tempo naquele tempo”, que foi o excelso algarvio, natural de Loulé, o engenheiro José Maria Farrajota Alves. Membro de uma conhecida família com investimentos e criatividade em várias áreas (camionagem, indústria automóvel e outras), foi um dos melhores alunos de sempre do Liceu João de Deus, na capital algarvia e da faculdade de engenharia e com os olhos sempre apontados para o futuro. A CONSIL representou uma época e um tempo, quando a superintendência oficial do sector estava subordinada à V Circunscrição Industrial, da chefia do engenheiro Graça Martins e a funcionar no edifício da Mutualidade Popular, no Largo do Terreiro do Bispo.


Esta unidade criativa e criadora, geradora de mais de uma centena de qualificados postos de trabalho, iniciou a sua vida no lado nascente do Largo Dr. Francisco Sá Carneiro (Largo do Mercado) e transitou, por via do seu crescente, para a então Rua do Matadouro, hoje Rua Carlos Porfírio, onde posteriormente funcionou uma indústria de mármores e pedras e hoje se encontra desocupada, aguardando por certo a edificação de algum projeto imobiliário.

Ali se fabricavam ou se elaboravam os quadros, materiais utilizáveis e outras estruturas de eletricidade (redes), bem como caldeiras, serralharia mecânica, sistemas de instalação de bombagem e muitos outros, inclusive a construção naval, com a construção do célebre e histórico iate “Viking”. A par da laboração a CONSIL foi pioneira na formação do pessoal (cursos de inglês, de higiene no trabalho, de legislação laboral e outros), qualificação, regalias sociais, refeitório, incentivos aos trabalhadores, vestuário, etc. A sua ação, pela excelência de que se revestiu o espírito interventivo dos seus responsáveis, estendeu-se para além de toda a região algarvia, para o País em fora, Açores, Cabo Verde, Angola, etc.


Como sempre lembrado eng. José Maria Farrajota Alves, que décadas mais tarde haveria de se dedicar ao jornalismo, trabalhava uma equipa de qualificados técnicos, de entre os quais referimos os conhecidos nomes dos engenheiros Batalha de Almeida, Costa, Rosa Mendes e outros.


Da história e das muitas histórias geradas pela CONSIL sobressai a do já referido iate, que nos faz uma vez mais e sempre, recordo o romance do conhecido escritor grego Mikos Kazantzakis, “Um navio dentro da cidade”, um dos livros colocados no índex da censura do anterior regime. É que a área de trabalho desta memória da “inovação e empreendedorismo em Faro” se transformou num verdadeiro estaleiro naval. O “Viking”, com os seus 12 metros de comprimento e dois motores Perkins, tinha todos os acabamentos em mogno, para além de outras inovadoras e confortáveis mordomias, bem como o casco, naquele tempo, forrado a fibra de vidro. Na sua construção houve o douto parecer e constante acompanhamento do sr. Fernando Belmarço, um farense profundo amante da “arte de navegar em todo o mar” e membro da conhecida e respeitada família do mesmo nome. E como veio esta embarcação para as águas da Ria Formosa? Uma odisseia, uma aventura e uma ação que foi temas de contínua e interventiva conversa que a cidade viveu. Saiu o “Viking”, sobre uma zorra e por ela puxado, da citada Rua do Matadouro, pelas ruas José de Matos, Cândido Guerreiro, Largo do Mercado, Rua General Teófilo da Trindade e Aboim Ascenção, até ao Largo Camões, Rua Gomes Freire, Miguel Bombarda e Ventura Coelho, Largo da Estação e Avenida da República, num percurso citadino de alguns quilómetros, até à Doca (frente ao Hotel EVA), flutuou perante aplausos, expetativas e entusiasmos. Mais tarde e com a participação de todos os elementos responsáveis e trabalhadores da CONSIL, o “Viking” sob o comando do conhecedor mestre Salvador, foi em cruzeiro de convívio e reconhecimento, até à Praia da Rocha. Mais tarde seguiu para Lisboa, afim de ser comercializado.


Breves traços de um grande marco da inteligência algarvia, que o foi o Centro Consultivo da Química Industrial (CONSIL), a merecer uma mais profunda investigação, quiçá uma tese de mestrado e uma homenagem – lembrança a esse insigno algarvio que foi o eng. José Maria Farrajota Alves.

João Leal

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