DANIELA PEREIRA

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Colaboradora. Designer.

EXPOSIÇÃO “ALGARVE – DO REINO À REGIÃO”

Em Lagos, os descobrimentos e a cartografia

O Reino dos Algarves de Aquém e para Além Mar/Algarbia Cartographica – leituras e resenha da Cartografia Regional são os temas que o município de Lagos apresenta no âmbito do projecto “Algarve, do Reino à Região”, uma iniciativa da Rede de Museus do Algarve.

A exposição O Reino dos Algarves de Aquém e para Além Mar, apresentada no Forte da Ponta da Bandeira, conta com um conjunto de posters, textuais e iconográficos, que visam explanar a génese dos Descobrimentos levados a cabo pelos portugueses e a importância do Algarve, e de Lagos em particular, nesse contexto de conquistas e descobertas.

1415, ano do assalto a Ceuta, organizado por D. João I e comandado por um dos seus filhos, o Infante D. Henrique, marca o momento em que o Algarve passa a ter importância no contexto da expansão portuguesa. A partir daqui, tornou-se imperioso manter o domínio português sobre a recente conquista, que passaria por assegurar o abastecimento em homens, munições e mantimentos provenientes, justamente, das terras litorâneas algarvias como Lagos, Vila Nova de Portimão, Faro e Tavira. Todavia, é a vila de Lagos que mais se destaca neste primeiro avanço de descobertas.

Que motivos teria o Infante D. Henrique para preferir esta pequena vila piscatória em relação a Faro e Tavira? Os terrenos férteis que envolviam o termo de Lagos, propícios à prática de uma policultura, e a posição geográfica terão pesado na escolha do sítio. Era em Lagos que os navegantes que vinham da Costa Ocidental portuguesa e de outras regiões europeias do norte acostavam após a passagem do Cabo de São Vicente. Era na baía de Lagos que os navegantes oriundos do Mediterrâneo ou do Magreb esperavam até que as correntes e os ventos permitissem continuar a viagem para lá do Cabo de São Vicente.

Por outro lado, o Infante D. Henrique observara ainda que as gentes de Lagos detinham uma ancestral experiência nos assuntos do mar e aproveitou-as para as orientar num outro projecto: o da descoberta e, posteriormente, o da expansão. Desses mareantes lacobrigenses destaca-se Gil Eanes, que destemidamente conseguiu, em 1434, passar o temeroso Cabo Bojador. Como refere Zurara, cronista dos feitos do Infante D. Henrique, “e já seja que o feito, quanto à obra, fosse pequeno, só pelo atrevimento foi contado como grande”. Deste atrevimento retém-se o seguinte aspecto: a superação do medo, que rapidamente colocou em causa grande parte do conhecimento antigo. Todas estas informações expostas fazem-se acompanhar de miniaturas de caravelas e réplicas de alguns instrumentos de orientação, nomeadamente a bússola e o quadrante.

Noutro compartimento do Forte da Ponta da Bandeira, está uma reprodução do políptico de São Vicente, atribuído ao pintor Nuno Gonçalves (estando o original no Museu Nacional de Arte Antiga) cuja obra, constituída por seis painéis, tem representada a sociedade portuguesa da época dos Descobrimentos, nomeadamente a figura do Infante D. Henrique.

Por último, e relacionado com as viagens dos Descobrimentos, pode-se visionar um breve documentário intitulado Vida a Bordo, onde podemos ter a percepção das dificuldades que a tripulação da caravela ou da nau passava quer na ida quer na volta da viagem. Juntamente com as incertezas e os medos, o documentário recria parte do quotidiano a bordo: desde a organização hierárquica da tripulação e dos haveres de cada um, passando pela hora da oração e do sono, até às doenças, fome e sede que os mareantes aturavam.

Algarbia Cartographica – Leituras e resenha da Cartografia Regional, patente no Museu Municipal Dr. José Formosinho, comissariada pelo tenente-coronel Berger, do Exército Português, e por Paulo Estrela, do Instituto Geográfico Português, mostra ao público um conjunto de reproduções de mapas, cartas, planos e plantas que dizem respeito ao Algarve. Nesta exposição iremos encontrar alguns exemplos que reflectem a multiplicidade cartográfica que se elaborou: cartas náuticas e cartas terrestres; mapas do território; plantas de reconhecimento das vilas e cidades fronteiriças; planos de localização de fortes, vilas e caminhos de acesso, e ainda planos de estruturas militares.

Todo este conjunto cartográfico exposto, cujos originais se encontram no Instituto Geográfico Português (IGP), visa explicar ao visitante que ao longo da história houve um uso político da cartografia que se reflecte, justamente, nas respectivas finalidades.

Todavia, a ausência de um pequeno texto que documente o contexto económico e político impede o visitante de saber que razões levaram à elaboração de tais cartografias. Por exemplo, sobre a figura de José de Sande Vasconcelos, engenheiro militar que elaborou a maior parte das obras patentes nesta exposição, não consta qualquer informação. José de Sande Vasconcelos veio para o Algarve, por volta de 1772, juntamente com outros engenheiros da corte, para projectar uma estrada que ligasse a Serra de Monchique a Vila Nova de Portimão (para facilitar, desse modo, o transporte das madeiras).

Por esta altura, foi chamado a trabalhar na edificação de uma nova vila – Vila Real de Santo António – onde, para além de trabalhar nas marcações do terreno, realizou diversos planos e mapas da vila. Daqui, ter-se-á estabelecido em Tavira. José de Sande Vasconcelos realizou, por mais que uma vez, diversos levantamentos de todos os fortes, fortalezas e baterias do Reino do Algarve. Alguns desses desenhos contêm diversas curiosidades, nomeadamente a indicação de sítios arqueológicos.

Realizou mapas de reconhecimento dos terrenos; plantas das praças de guerra algarvias e ainda plantas de algumas cidades: Tavira, Lagos e Vila Real de Santo António. Todos estes levantamentos eram acompanhados por uma explicação onde constavam informações que diziam respeito ao estado de conservação das estruturas militares; e ainda o que devia ser, ou não, reparado e o respectivo orçamento.

Pequenos blocos de texto elucidativos do que se mostra teriam, certamente, valorizado muito esta exposição. As duas mostras patentes no Forte da Bandeira e no Museu Municipal merecem ser visitadas, porquanto testemunham através da Cartografia e outros elementos gráficos o papel que a cidade de Lagos desempenhou na Expansão Portuguesa.

Trata-se de exposições dirigidas a todos os públicos, ainda que se apresentem especialmente indicadas para jovens em idade escolar pelas muitas curiosidades que oferecem e ensinamentos que proporcionam através da imagem. Há, pois, que visitá-las antes do seu encerramento, previsto para final do ano!
CEPHA/UAlg

Nota: O autor não escreveu o artigo ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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