Duas entidades permitiram legalizar falsa ruína na REN

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Proprietária legalizou a ruína nas Finanças, no final de 2013, com uma certidão emitida pela Câmara de Faro, e na Conservatória de Olhão, no início de 2014, recorrendo à referida certidão e a um novo documento das Finanças. CCDR garante que está a investigar a situação para aplicação das devidas sanções

DOMINGOS VIEGAS

A Câmara Municipal de Faro e as Finanças emitiram documentos que certificam a existência de uma ruína num terreno localizado na freguesia de Estoi (Faro), em plena Reserva Ecológica Nacional (REN), mas a ruína é falsa e foi criada pela proprietária com o objetivo de valorizar a propriedade e de poder construir no local.

A criação da falsa ruína tinha sido denunciada pelo Jornal do Algarve, há duas edições (23 de junho), com base na queixa apresentada junto da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve por José Carlos Gonçalves, proprietário de um terreno contíguo.

Não existe nenhum documento anterior a 2013 que indique a existência de uma ruína no local. As imagens de satélite do Google Earth confirmam que a ruína só apareceu no local nesse ano. E um relatório do Serviço de Proteção da Natureza (SEPNA) da GNR, a que o Jornal do Algarve teve acesso, também considera como plausível que a situação configure uma “ruína” construída recentemente. No entanto, a proprietária do terreno conseguiu legaliza-la.

Como se legaliza uma falsa ruína?

Mas como é possível legalizar uma falsa ruína e numa zona de REN? Há duas semanas, a Câmara Municipal de Faro explicou ao Jornal do Algarve que tinha indeferido, em 2014, um pedido de certidão de antiguidade do prédio. Porém, entretanto, a nossa investigação levou-nos até uma certidão, assinada por Armando Cochado, diretor do Departamento de Infraestruturas e Urbanismo do Município de Faro, com data de 03 de dezembro de 2013, ou seja, antes de ter sido feita qualquer alteração na Conservatória, em que aquele responsável certifica que “existem ruínas no terreno”.

Posteriormente, a 12 de dezembro de 2013, ou seja, apenas nove dias depois de ter sido passada a referida certidão pela autarquia farense, e ainda antes da ruína estar legalizada na Conservatória, a proprietária do terreno entregou nas Finanças um pedido para alteração à matriz original, para poder legalizar a ruína junto desta última entidade.

No mês seguinte, a 22 de janeiro de 2014, deu entrada na Conservatória de Olhão um registo de averbamento de alteração ao prédio (terreno) em causa: onde antes constava “terra de mato com árvores”, passou a constar “terra de mato com árvores e ruína”. A proprietária apresentou a certidão que lhe tinha sido emitida pela Câmara de Faro e o documento das Finanças, para legalizar a ruina junto da Conservatória.

Depois de legalizar a falsa ruina nas Finanças, a proprietária passou a ter, a partir de janeiro de 2014, uma ruína em área de Reserva Ecológica Nacional também devidamente legalizada na Conservatória. E um terreno cujo valor aumentou de tal forma que chegou a estar à venda, recentemente, através de uma imobiliária, por 200 mil euros.

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Refira-se que, a 13 de agosto de 2014, depois da falsa ruína estar legalizada há mais de seis meses, Vítor Manuel Neto Dias, secretário da União de Freguesias de Conceição e Estoi assinou um atestado em que confirma que o referido terreno “tem uma ruína construída em data anterior à publicação do Regime Geral da Edificação e Urbanização de 7 de Agosto de 1951”.

Entretanto, contactada pelo Jornal do Algarve, a CCDR Algarve, que já tinha rejeitado em 2015, no âmbito da REN, um pedido para “alteração e ampliação de moradia para casa de campo e construção de piscina (empreendimento de turismo rural)” no referido terreno, garantiu que está a investigar a situação.

“Subsistindo dúvidas quanto à situação da ‘ruína’ (ou existia anteriormente ou nunca ali existiu), a CCDR do Algarve encontra-se simultaneamente a diligenciar junto da Câmara Municipal de Faro pelo cabal esclarecimento dos factos com vista à atuação sancionatória que se justifique.”, explicou David Santos, presidente daquela entidade.

Há duas semanas, na altura em que o Jornal do Algarve denunciou a situação, José Carlos Gonçalves, o proprietário que apresentou a queixa junto da CCDR já lá vão quase quatro anos, garantiu que “há outras situações semelhantes, que as autoridades deveriam investigar”. E explicou que tem indicação de que a mesma proprietária conseguiu “fintar o sistema” noutras zonas da região. “Há aqui muita gente envolvida”, considerou, garantindo que, esta semana, já avançou com queixas junto de associações ambientalistas e da própria Polícia Judiciária.

Bloco leva o caso ao Parlamento

Entretanto, o deputado João Vasconcelos, do Bloco de Esquerda e eleito pelo Algarve, já questionou o ministro do Ambiente sobre este caso.

João Vasconcelos quer saber se o Governo irá agir “com a urgência que a situação requer” e que medidas tenciona tomar a fim de repor a legalidade de forma a salvaguardar e defender o interesse público.

“A propriedade em causa, agora com uma falsa ruína legalizada em área de Reserva Ecológica Nacional, viu aumentada de forma substancial, a sua valorização”, afirma João Vasconcelos, acrescentando que “esta situação, a ser verdade, reveste-se de particular gravidade, motivo pela qual deve ser investigada com a maior urgência, custe o que custar e doa a quem doer”.

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2 COMENTÁRIOS

  1. Impressionante até onde a inveja do ser humano nos leva, que mesquinhez. Do BE não me surpreende repare-se que o que choca o Sr Deputado é a valorização do imóvel e ainda consegue ter destaque do Sr Jornalista como se tivesse praticado um acto heroico. E assim vai a europa afundando-se cada mais por dar ouvidos a estas pessoas que nada adicionam de produtivo. A sociedade do bota a baixo é cada vez mais enaltecida com o objectivo claro de nos nivelar por baixo, lá virá o tempo dos remorsos tardios… Para que não subsistam dúvidas não sei quem é a proprietária e nem qual o terreno em concreto. É esta a Liberdade que queremos?

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