É necessário refletir sobre o impacto da “Escola a tempo inteiro” que surgiu para resolver um problema social gerado pela falta de disponibilidade das famílias para acompanhamento das suas crianças. Criaram-se, assim, um conjunto de atividades enriquecedoras do currículo, de acesso gratuito, para todas as crianças. O que se verificou, realmente, foi que o espaço de tempo que muitas crianças tinham para usufruir de algum tempo livre foi ocupado por tempo de trabalho, com outras atividades letivas. Com o aumento significativo do horário escolar, o tempo livre para brincar, jogar e desenvolver outras atividades de livre escolha, por parte da criança, foi substancialmente diminuída.
A luta pela redução do horário semanal dos trabalhadores foi uma das mais importantes conquistas das sociedades industriais. Uma sociedade desenvolvida é aquela que proporciona a possibilidade do indivíduo usufruir de tempo para desenvolver tarefas autónomas e de participação voluntária, libertando-o, assim, das necessidades profissionais, mas, em simultâneo, possa desenvolver conhecimento e formação não intencional. Os tempos livres são, nesta sequência, da maior importância para o crescimento saudável das nossas crianças. Este conceito de “Escola a tempo inteiro,” com a criação das Atividades de Enriquecimento Curricular (A.E.C (s)) deve ser visto na ótica da valorização do tempo livre onde se aprende a brincar.
As atividades letivas permitem que as nossas crianças explorem e reflitam sobre a realidade e a cultura na qual vivemos e promove o desenvolvimento das capacidades relacionais, das atitudes e dos comportamentos. Assim sendo, é indispensável o uso de estratégias diferentes das que são usadas em sala de aula. É importante também que a metodologia se distancie das atividades formativas organizadas pelos adultos com uma estrutura escolarizada. É, por isso, necessário identificar o papel fundamental exercido pelas atividades de enriquecimento curricular nos domínios das relações interpessoais e cognitivas nas aprendizagens. Temos que facultar às nossas crianças a possibilidade de construírem a sua autonomia, ganhando espaço para desenvolverem o seu projeto de futuro e cidadania.
Beatriz Calafate
* Dirigente sindical do SPZS