FERNANDO PESSANHA

Câmara Municipal de Faro desvaloriza património arqueológico

As investigações da arqueóloga Teresa Gamito, reputada professora e investigadora conhecida internacionalmente, em muito contribuíram para aprofundar o nosso conhecimento acerca da história das várias civilizações que, desde a proto-história, habitaram o espaço geográfico correspondente à actual cidade de Faro.

Estas investigações começaram em Abril de 1984, com uma escavação de emergência no cemitério romano na Rua das Alcaçarias que, naturalmente, vieram a comprovar a riqueza patrimonial e arqueológica existente no centro histórico da cidade.

Os anos que se seguiram foram pautados por várias escavações no centro Histórico de Faro, nomeadamente na Horta da Misericórdia, junto ao Museu Municipal, entre 1993 e 2001.

Entre o espólio arqueológico recolhido da Horta da Misericórdia encontram-se inúmeros materiais representativos da presença islâmica na cidade, nomeadamente, cerâmicas de grande interesse e até um fragmento de candelabro de mesquita!

As estruturas descobertas revelam um bairro islâmico com uma utilização criteriosa do espaço; casas simples e pequenas, ruelas estreitas e algumas dependências de utilidade pública, nomeadamente uma cisterna com a sua área de lavagem de roupa e um lagar.

No entanto, não obstante a importância destas descobertas arqueológicas e o impacto que estas poderiam ter no âmbito do turismo local, é intenção da Câmara Municipal de Faro aproveitar a chamada Horta Misericórdia para criar 12 hortas de 40 metros quadrados! Segundo a autarquia, o objectivo passa por fomentar a agricultura biológica e chamar a atenção para as questões ambientais nas cidades. Ora, é absolutamente inconcebível que a escolha do local para tão ecológicas preocupações recaia exactamente num local de inquestionável valor histórico e patrimonial.

Os americanos, mais pobres que os europeus no que se refere ao património, compram claustros inteiros e reconstroem-nos na América. Nós, que temos património, temos destas atitudes incompreensíveis, típicas de um país subdesenvolvido em que as querelas partidárias se sobrepõem aos valores defendidos na própria Constituição da República!

É lamentável que nenhum dos autarcas que ao longo de 20 anos passaram pela Câmara de Faro tenha compreendido que seria do interesse estratégico da autarquia e dos empresários farenses, a aposta na reabilitação do sítio arqueológico da Horta da Misericórdia, tornando-o visitável e fomentando assim o turismo cultural na capital do Algarve.

No final acabamos todos por perder: perdem os turistas por se verem privados de visitar um sítio de inquestionável interesse histórico, perde o comércio e a restauração por verem o negócio privado do turismo e perdemos todos nós que ficamos ainda mais pobres do ponto de vista histórico, cultural e patrimonial. E que ficamos a ganhar? Um par de couves e cenouras…

*(CEPHA/UALG)

Nota: O autor não escreveu o artigo ao abrigo do novo Acordo Ortográfico

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