Francisco Amaral: “Há um acordo manhoso para destruir o município”

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O social democrata Francisco Amaral venceu as últimas eleições autárquicas e foi reconduzido como presidente do município de Castro Marim, mas sem maioria. O executivo ficou reduzido a dois membros, enquanto a oposição passou a ter três (dois do PS e um do movimento CM1). Na assembleia municipal, a oposição também está em maioria. Em entrevista ao Jornal do Algarve, o autarca lamentou que lhe tenham sido retiradas quase todas as competências e voltou a alertar que alguns projetos correm o risco de perder o financiamento comunitário

DOMINGOS VIEGAS

Depois dos resultados eleitorais de outubro terem ditado um executivo em minoria, houve negociações. O que é que aconteceu para que não tivesse havido acordos?

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Qualquer pessoa faz esta leitura dos resultados: a população quer que eu seja o presidente da Câmara, mas que procure entendimentos. E foi precisamente isso que eu fiz. Convidei a vereadora Célia Brito para ocupar o cargo a tempo inteiro e disse-lhe que poderia escolher os pelouros que quisesse. Não aceitou. Fiz a mesma proposta ao vereador Mário Dias e ele também não aceitou. Depois lancei um segundo desafio à vereadora Célia Brito: reunir comigo sempre que eu estivesse a fazer a ordem de trabalhos das reuniões, para analisarmos quais seriam os pontos de entendimento entre as duas forças políticas. Também não aceitou. Qual não foi o meu espanto quando me apercebi que existe uma coligação entre os vereadores do PS e o movimento CM1 do vereador José Estevens para obstaculizar, dificultar e destruir o município de Castro Marim.

Mas as tentativas de acordo que refere foram com vereadores do PS. Tentou também com José Estevens, do movimento independente CM1?

Não. À partida já sabia que o vereador José Estevens está cá só para me dificultar a vida. Basta ouvi-lo nas reuniões de Câmara.

Falou de “coligação” na oposição, mas não houve qualquer indicação oficial e formal nesse sentido…

Não há uma coligação formal, mas, até hoje, a postura nas reuniões de Câmara é essa. Quem assiste às reuniões de Câmara vê que a oposição tem uma vontade permanente de dificultar, de obstaculizar, de fazer com que o executivo não realize obra, de fazer com que a Câmara paralise. A oposição quer destruir este município. Aliás, o mais escandaloso é que isto demonstra que não há memória nem vergonha.

Como assim?

Durante dezasseis anos houve um conflito permanente entre o ex-presidente da Câmara, José Estevens, e o Partido Socialista. Era uma guerra constante. O anterior presidente nunca respeitou o PS, discriminou-o, maltratou-o e espezinhou-o sempre. Os socialistas só começaram a ser tratados com respeito quando eu cheguei à Câmara. Arranjei-lhes, por exemplo, um gabinete com mesas e cadeiras para poderem reunir aqui na Câmara, uma coisa que nunca tiveram anteriormente. Não se podiam nem ver, mas agora, para espanto de toda a população, estão todos muito amiguinhos para lutar contra o atual executivo, contra a Câmara e para destruir o município. Ninguém de bom senso compreende uma situação destas.

Tem ideia de como é que a população está a ver essa situação?

A população está revoltada, as pessoas que votaram no PS estão revoltadas e as que votaram no movimento CM1 do anterior presidente José Estevens também estão revoltadas. Não foi para isto que votaram no PS e no CM1. É um acordo manhoso, de lideranças, e a população está desgostosa porque vê que o objetivo é destruir e é não olhar a meios para que eu e a vereadora Filomena Sintra abandonemos os cargos.

Chegou a pensar em desistir e abandonar o barco?

Nunca. Há duas palavras que não existem no meu dicionário: uma delas é medo e a outra é desistir. Ao fazerem-me mais coisas destas, estão a dar-me ainda mais garra. Já tive dois ataques cardíacos devido ao terrorismo psicológico que me foi movido, com cartas anónimas e perfis falsos no facebook. E até sei quem está por trás disso tudo, mas, como deve compreender, não lhe posso dizer. É um autêntico terrorismo psicológico praticado por pessoas cobardes, sem escrúpulos, sem ética… São autênticos psicopatas. Na política, em Portugal, já houve um que foi primeiro-ministro e deixou este país como todos sabemos, agora há outro nos Estados Unidos, outro na Coreia do Norte, outro na Venezuela… E na política local, nos municípios, pelos vistos também há psicopatas.

Quais são os obstáculos que diz terem sido colocados pela oposição?

Entretanto, têm-se passado coisas do arco-da-velha. As reuniões de Câmara eram quinzenais e passaram a ser semanais. Castro Marim é o único concelho do sul do país em que isso acontece. Não sei se será porque os vereadores da oposição estão preocupados em ganhar mais senhas de presença. Retiram-me competências que qualquer presidente de Câmara deste país tem. Chegámos a um ponto em que, por exemplo, qualquer prova desportiva, baile ou uma simples licença para a colocação de uma rede ovelheira têm de ir a reunião de Câmara em forma de proposta. Tudo, até à coisa de importância mais ínfima, tem de ir a reunião de Câmara em forma de proposta para ser aprovado pela oposição. Isto dificulta o serviço administrativo normal da Câmara. Por exemplo, uma das funcionárias, que fazia as atas há muitos anos, teve que meter baixa por esgotamento e recusou-se a fazer mais reuniões de Câmara. O serviço está sobrecarregado e há mais funcionários que estão com muitas dificuldades porque, de facto, isto é incomportável. Na tentativa de humilhar o presidente da Câmara, a oposição maioritária definiu que o presidente da Câmara só tem competências no cemitério. É isso que está a acontecer. E, com isso, a oposição também está a impedir que coisas importantes avancem.

Quais, por exemplo?

Acabaram, sem qualquer justificação minimamente aceitável, com a Unidade Móvel de Saúde com médico, que era uma coisa maravilhosa e que fazia um serviço ímpar. Houve desculpas esfarrapadas para acabar com esse serviço e ninguém percebe porquê.

Entretanto, o executivo já colocou a Unidade Móvel de Saúde em funcionamento mediante ajuste direto. Porque é que isso não foi feito antes, de forma a evitar que o serviço estivesse tanto tempo parado?

Está a funcionar, mas não da forma que seria ideal. O ideal seria com médico, enfermeiro e com outras valências. E não é isso que está a acontecer. A solução foi, como se costuma dizer, uma forma de desenrascar a situação para que a unidade não continuasse parada. Chegámos a acreditar que a oposição tinha chumbado a nossa proposta para implementar um serviço melhor, mas, cinco meses depois, verificámos que as pessoas foram enganadas e não há nada. Veja-se que nunca arranjaram um médico.

Mas a ARS Algarve anunciou há alguns meses que iria avançar com dez novas unidades móveis de Saúde na região e que uma seria para Castro Marim…

Há, de facto, uma candidatura a fundos comunitários que prevê a aquisição de uma dezena de viaturas novas para vários municípios. Entre estes está Castro Marim que também já concorreu. Mas isto é para ter viaturas novas, que custam cincuenta mil euros e nós financiamos uma parte, não é para colocar o serviço a funcionar. A ARS não vai pagar um único tostão. É verdade que o serviço terá, depois, que ser protocolado, mas, à partida, cada unidade será aquilo que os municípios entenderem que deve ser.

No seu discurso no Dia do Município alertou que a oposição, ao bloquear propostas, estava a contribuir para que alguns projetos corressem o risco de perder financiamento comunitário por causa dos prazos. Quais são esses projetos?

Por exemplo, a praia fluvial de Odeleite. Seria uma atração turística muito grande. É muito importante que este projeto avance porque estamos a falar de um investimento para uma zona do interior, da serra algarvia, que está a sofrer um grande despovoamento. Elaborámos o projeto, há financiamento assegurado, mas a oposição está contra. Ainda temos uma réstia de esperança em que surja alguma lucidez por parte da oposição, porque é um projeto que representaria um contributo muito importante para o desenvolvimento daquela zona.

Mas o PS diz que está há sete meses à espera que o executivo apresente uma nova proposta ajustada aos investimentos que são consensuais…

O PS e o CM1 chumbaram a proposta em dezembro de 2017. O executivo é que tem feito o apelo ao consenso, protelou as consequências dessa aprovação. Agora tem havido muitas reuniões com os vereadores do PS e eles estão irredutíveis, nomeadamente, em relação às plataformas flutuantes que, para nós, são o essencial da questão. É o essencial e é o mais barato. Parece que o PS está apostado em que as pessoas não possam tomar banho naquela barragem. É uma atitude irracional.

O PS defende, em vez da praia, investimento na aldeia e a jusante da barragem. As duas propostas não são compatíveis? Não se pode fazer as duas coisas?

Essa foi a proposta chumbada em dezembro, um compromisso para dois investimentos. Neste momento, depois de termos visitado a zona com técnicos da APA, já temos uma ideia sobre o que se pode fazer a jusante da barragem, nomeadamente, no espaço onde se realiza a festa do 1.º de Maio. E já temos arquitetos paisagistas a trabalhar numa solução para transformar aquela zona num espaço de lazer, mais apetecível. Dentro de poucos dias também vamos limpar a ribeira naquela zona. Outra coisa é a praia fluvial a montante da barragem, que o PS não quer. É impensável fazer uma praia fluvial a jusante, porque não há garantias mínimas de água em condições. Nós não mandamos na barragem de Odeleite. A Agência Portuguesa do Ambiente e a Águas de Portugal não irão fazer descargas, com o objetivo de garantir água para essa hipotética praia, como tem acontecido ao longo dos anos.

Também acusou a oposição de bloquear a requalificação da envolvente à Casa do Sal. Mas o PS já disse que não está contra e que quer é a garantia de um parecer da CCDR como o projeto não viola o plano de pormenor daquela zona. Esse parecer existe?

Estamos a falar de uma zona no centro da sede do concelho que, no inverno, é um autêntico lamaçal. Mandámos fazer um projeto para requalificar aquele espaço, com um piso em condições, zonas de sombra, parque de estacionamento, balneários e sanitários públicos… E também para criar condições dignas para a realização do mercado mensal. Depois vem a oposição e chumba isto, com a desculpa de que o projeto iria conflituar com um plano de urbanização que está previsto para aquela zona. Os nossos técnicos dizem que não há qualquer conflito, a CCDR diz não há qualquer conflito… E o que é um facto é que temos garantia de financiamento comunitário para aquela obra e andamos aqui enrolados há sete ou oito meses com o projeto a correr o risco de perder esse financiamento.

O PS diz que ainda não viu o pedido de parecer à CCDR? O parecer existe? Ou já foi pedido?

Esse parecer já existe há alguns meses e permite que se faça o que nós queremos fazer ali. Aliás, os técnicos da CCDR não são mais fiáveis do que os técnicos da Câmara. Não faz qualquer sentido haver desconfiança em reação aos técnicos da Câmara, que já garantiram que o projeto pode ser realizado.

Então porque é que ainda não lhes foi mostrado?

Porque eles não vão acreditar, tal como também não acreditaram nos pareceres dos técnicos da Câmara. E desde quando é que os técnicos da CCDR são mais fiáveis do que os técnicos da Câmara? A verdade é que queremos acabar com aquele lamaçal e a oposição não nos deixa avançar.

A oposição controla a empresa municipal. Como é que convive com esta situação?

Sou democrata, por isso, mesmo quando tinha maioria na Câmara, nunca quis controlar a empresa municipal. A empresa municipal tem a sua autonomia e tem os seus diretores executivos. Respeito a autonomia de cada órgão e espero que a oposição não se sirva da empresa municipal como arma de arremesso contra a Câmara. Espero que a oposição não caia nessa tentação. De resto, mantenho uma relação cordial com a empresa municipal e respeito toda a gente, desde os diretores até aos restantes funcionários.

Juntou-se ao Movimento Cidadãos Utentes da EN 125 – Sotavento na luta pela requalificação da estrada e foi acusado de “oportunismo”. Quer comentar?

Quando cheguei a Castro Marim defini claramente as minhas prioridades. Ajudar as pessoas que estavam a passar mal, levar água domiciliária potável às povoações e melhorar as ruas e as estradas. Em relação à requalificação da EN125, que não é uma obra da competência da Câmara, senti-me enganado, fazia parte do nosso programa eleitoral. Tentei marcar reuniões, junto com a minha colega de Vila Real de Santo António, Conceição Cabrita, tanto com o secretário de Estado como com o presidente da Infraestruturas de Portugal, mas, quando pensávamos que iríamos ser recebidos pelo presidente daquela empresa pública, fomos recebidos por uma terceira ou quarta figura daquela entidade. Isto revela uma perfeita falta de respeito pelo poder local democraticamente eleito.

Mas foi isso que o levou a aderir?

Foi a gota de água para eu dizer ‘basta!’. Este movimento tinha surgido entretanto e, tanto eu como a presidente da Câmara de Vila Real de Santo António, não tivemos qualquer dúvida em aderir e apoiar. Aliás, ao contrário dos meus colegas de Tavira e de Olhão. Infelizmente, os socialistas têm um espírito demasiado clubístico.

Demasiado clubístico? Como assim?

Sim. Digo demasiado clubístico para não usar uma expressão pior. Uma das primeiras coisas que eu fiz quando cheguei a Castro Marim foi organizar uma manifestação, em frente à ARS do Algarve, porque a extensão de saúde do Azinhal e Odeleite tinha encerrado há poucos dias. Organizei essa manifestação contra um governo que era do meu partido, da minha cor política. Não estou a ver um autarca socialista a fazer isto. Uma coisa é o nosso emblema partidário, outra são os interesses da população que nos elegeu. Não podemos ter dúvidas e temos que estar sempre ao lado da população, por muito que isso doa aos governos. Por isso, lamento que as câmaras municipais de Tavira e de Olhão não estejam ao lado deste movimento cívico e das ações que eles realizam. É um movimento de cidadãos, que não tem nada a ver com partidos, constituído por pessoas sérias, que se preocupam com a EN 125 e que têm feito um trabalho digno.

Como é que vê o resgate da concessão que foi anunciado na última semana?

O grande problema de tudo isto são as célebres parcerias público-privadas do governo de José Sócrates, que, na prática, não são mais do que fazer obra sem ter dinheiro. Estamos a falar de parcerias com privados, que ficavam com todos os direitos e sem deveres, com contratos blindados. Isto é um escândalo. Claro que alguém teria que pagar essa loucura toda. Agora, espero que o Tribunal de Contas ponha cobro a essa vergonha e ajude a criar condições para que a requalificação avance.

Acredita que esse resgate pode ser o primeiro passo?

Se esse resgate tiver o aval do Tribunal de Contas, não vejo qualquer inconveniente. Espero que isso aconteça. Tem havido uma falta de respeito por parte do poder central em relação aos algarvios do sotavento e que tem sido transversal aos vários governos. Essa é que é a verdade. Este governo andou a enganar-nos dizendo que a culpa da requalificação da estrada não ter avançado era do Tribunal de Contas, mas descobrimos que era mentira, que era desculpa de mau pagador. Fizeram uma intervençãozinha de urgência, mas que fica muito aquém daquilo que é necessário. E não baixaremos os braços enquanto não for feita uma requalificação como deve ser. O sotavento tem que ser servido por uma estrada digna. Vivemos do turismo e não podemos ser servidos por uma estrada vergonhosa como aquela.

O que é que pode prometer aos castro-marinenses para o que falta de mandato?

Temos vários projetos, mas só podemos fazer o que nos deixarem fazer. Queremos criar parques de autocaravanas em Castro Marim e na Altura. Castro Marim é o único concelho do país que não tem quartel de bombeiros, mas temos tudo preparado e encaminhado para criar um miniquartel no Azinhal. É o único concelho do país que não tem um parque empresarial. O meu antecessor tinha o sonho de criar uma área de negócios, gastou centenas de milhares de euros em estudos e planos, mas não há lá nada. A zona industrial de Vila Real de Santo António está esgotada, já tive empresas interessadas em instalarem-se aqui e tive que mandar os investidores embora. Esse é outro projeto que é preciso concretizar. Também gostaria de ver Castro Marim ligado a Vila Real de Santo António, à Altura e ao Monte Francisco com ciclovias. A obra de ligação a Vila Real de Santo António já está a concurso e irá avançar. Noutro âmbito, as câmaras estiveram impedidas de contratar novos funcionários, alguns reformaram-se e isso criou-nos muitas dificuldades. Farei tudo para que avancem os projetos da Verdelago, Quinta do Vale, Almada de Outo, Retur, tal como outros hotéis em projeto. Qualquer destes investimentos irá gerar mais riqueza e emprego para bem de Castro Marim e dos castro-marinenses. A rede de rega da Várzea de Odeleite também vai avançar, já tem o financiamento aprovado, cerca de 1,7 milhões de euros, e o passadiço que ligará Manta Rota à Altura, no valor de 1 milhão de euros, tem garantia de financiamento. Esperamos que a oposição concorde.

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