Havia mais um bebé. O preço dobrou

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Na Indonésia, algumas parteiras retêm os bebés quando os pais não pagam o parto

Todas as crianças são iguais, mas umas são mais iguais do que outras. As crianças indonésias, por exemplo, podem ter de esperar algum tempo pela mãe, se forem pobres. Não é invulgar as parteiras reterem um recém-nascido até a mãe pagar o parto. Num caso recente, uma mulher que não fizera uma ecografia teve a surpresa de dar à luz gémeos. Quando a parteira viu que havia um segundo bebé, exigiu ser paga a dobrar. Como os pais não tinham dinheiro suficiente, um dos bebés ficou na posse da parteira.

Fez-se um contrato. A dívida ficou estimada em quinhentos dólares, que os pais pagariam em prestações. Lá foram pagando como podiam, devagarinho, ao longo de meses – enquanto a dívida ia crescendo até aos oitocentos dólares, com juro. Um dia encontraram Robin Lim, uma americana que estabeleceu clínicas gratuitas na Indonésia para ajudar famílias pobres. Tomando conhecimento da situação, ela ofereceu-se para pagar o remanescente e resgatar a criança. Mas quando chegaram ao lugar do parto, uma ‘enfermeira’ (a parteira original não estava) desabafou contra “aqueles estúpidos pobres” antes de revelar que o bebé tinha sido vendido a alguém com meios para o criar como devia ser.

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Com outros intervenientes o caso teria ficado por aí. Mas Robin era americana, consciente e voluntariosa. Contactou logo a polícia e os jornais, que entraram em ação. Convém notar que tanto a venda como a retenção de bebés, embora relativamente comuns, são ilegais no país. Em três semanas o bebé desaparecido foi localizado (o facto de ser gémeo ajudou) e restituído aos pais. Hoje em dia só em raros momentos em que a mãe lhe tira a vista de cima, ou ao irmão.

“Estrela rock ou prostituta, é tratada como VIP”

Até hoje Lim já ajudou muitas mães. Com oito filhos ela própria, a saúde infantil e infantil é o trabalho da sua vida. Ainda nos Estados Unidos, escreveu livros sobre o assunto. Uma sucessão de tragédias mudou-lhe a vida. Primeiro morreu uma amiga, depois a parteira que a ajudara num dos partos, e a seguir uma irmã e o respetivo bebé.

Era desgosto a mais para um ser de compaixão. Filha de militar e criada nas Filipinas, Lim sempre fora feliz na Ásia. Emigrou para Bali e decidiu tornar-se parteira. Nessa qualidade, explica, podia contribuir para a realização de três dos Objetivos do Milénio: reduzir a mortalidade infantil, aumentar a saúde maternal, e combater a SIDA e a malária. “Isto são coisas que faço todos os dias”, explicou à BBC.

Fundou uma clínica em Udud, no Bali, onde qualquer mulher pode receber assistência médica gratuita antes, durante e após o parto. Uma outra foi estabelecida em Aceh após o tsunami de 2004. A regra de Lim é que toda a mulher, “estrela rock ou prostituta”, seja “tratada como VIP” nas suas clínicas. A fundação Bumi Sehat, que as opera, tem como lema “o parto gentil cura a mãe terra”.

O objetivo central de reduzir a elevada mortalidade infantil no país – 373 bebés por cem mil partos, a maior percentagem nos países da ASEAN – passa por muitos esforços. Entre eles, o de fazer com que seja aplicado o Código Internacional de Comercialização dos Substitutos do Leite Materno, um tratado internacional que pretende proteger as mães novas e influenciáveis. No pressuposto de que o leite materno é geralmente mais saudável para a criança, proíbem-se promoções agressivas do leite em pó, especialmente nos seus primeiros meses, e estabelecem-se normas para informação correta sobre as propriedades dos produtos.

Num país como a Indonésia, onde os níveis de corrupção desanimam, a tarefa não é fácil. Muitas vezes os bebés têm acesso ao biberão antes de experimentarem o peito da mãe. “Há uma coação que acontece com profissionais médicos, em particular pediatras e parteiras”, explicou Lim. “Conheço pessoalmente um pediatra que recebe um carro novo todos os anos”.

O leite em pó, diz ela, custa praticamente o mesmo que nos EUA, embora o salário médio na Indonésia seja oito dólares, uma fração do americano.

JA/Rede Expresso
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