“Não existirão ‘elefantes brancos’ na costa vicentina”

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“É conhecido o historial dos ‘grandes projetos/investimentos’ no município, que sempre retumbaram em grandes fracassos e que ainda hoje oneram e muito, a Câmara de Aljezur”, lembra José Amarelinho

Uma empresa imobiliária colocou à venda há pouco mais de um mês, por 10 milhões de euros, um terreno com três quilómetros de praia, em Monte Clérigo, concelho de Aljezur. Neste terreno, que equivale a mais de 300 campos de futebol, existe um projeto turístico para três hotéis, 200 moradias e 200 apartamentos. Porém, em declarações esta semana ao JA, o presidente José Amarelinho nega qualquer pretensão nesse sentido. “Os mega projetos acabam invariavelmente por constituir verdadeiros ‘elefantes brancos’”, salienta o autarca de Aljezur

Caso se concretize, este será o maior empreendimento localizado no parque natural da costa vicentina: “Terreno de 311 hectares para venda em Aljezur. Terreno em Monte Clérigo, com três quilómetros de praia. Existência de projeto para três hotéis, cerca de 200 moradias, 200 apartamentos, heliporto e golfe com 18 buracos.”

Este é o anúncio que o JA encontrou na página de internet da empresa imobiliária MediPred, com sede em Lisboa. A descrição do terreno já está online desde meados de abril, sendo que o preço está fixado nos 10 milhões de euros.

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Em declarações esta semana ao JA, o presidente da autarquia assegura que, “ao dia de hoje, não se encontra nesta câmara municipal aprovada qualquer pretensão para o efeito, nem tão pouco decorre qualquer processo nesse sentido”.

José Amarelinho explica que esta polémica remonta ao final de 2006, quando a Câmara de Aljezur indeferiu um pedido de informação prévia para o alegado projeto turístico em Monte Clérigo. Já na altura, a autarquia considerou que existia “manifesta incompatibilidade com os instrumentos de gestão territorial em vigor”.

Com a venda do terreno a decorrer atualmente através de uma empresa imobiliária, poderá surgir a qualquer momento um novo investidor que consiga enquadrar o mega empreendimento num “projeto de interesse nacional”. Porém, o autarca de Aljezur promete lutar contra essa eventualidade e é peremptório: “Com o atual executivo, nunca!”

“Grandes projetos retumbaram em grandes fracassos”

“É conhecido o historial dos ‘grandes projetos/investimentos’ no município de Aljezur, que sempre retumbaram em grandes fracassos e que ainda hoje oneram e muito, a Câmara de Aljezur”, lembra José Amarelinho, adiantando que depois da conclusão do plano de pormenor do Espartal, “estamos agora focados em resolver definitivamente, entre outros, Paisagem Oceano e Vale da Telha, planos bastante complexos, mas que contamos estabilizar e resolver de vez com a administração central, indo de encontro à vontade da população e proprietários”.

O presidente da autarquia sublinha ainda que o município tem apostado estrategicamente no turismo da natureza e que, qualquer projeto turístico de grande dimensão que coloque em causa essa vertente, não será bem acolhido pela câmara nem pela população. “Assim sendo, fácil será de entender a nossa posição em relação a mega projetos que invariavelmente acabam por constituir verdadeiros ‘elefantes brancos’”, refere.

José Amarelinho confessa mesmo ao JA que este tipo de pretensões suscitam “desconfiança”, tal como “sempre me suscitaram muitas dúvidas os famigerados projetos de interesse nacional, vulgo PIN´s, essencialmente pela ausência de sustentabilidade ambiental, apesar de no início ter entendido algumas virtudes no conceito”.

Aljezur aberta a unidades de baixa densidade

Apesar de tudo, o autarca admite – até porque “é nossa obrigação” – apreciar todas as propostas e projetos dos investidores. José Amarelinho diz que o concelho de Aljezur pode dispor de “uma ou mais unidades hoteleiras, de baixa densidade, devidamente enquadradas, vocacionadas para o turismo, sustentáveis, capazes de gerar postos de trabalho diretos e indiretos”.

Já em relação a projetos de grande dimensão, como aquele que está em causa em Monte Clérigo, o presidente da câmara sustenta que “um empreendimento desta envergadura dificilmente seria compaginável e entendível em presença de algumas restrições a que os particulares estão sujeitos em sede de parque natural”.

Há cerca de um mês, o grupo parlamentar do PCP também questionou o ministro do Ambiente e Ordenamento do Território sobre a eventual implantação deste empreendimento imobiliário, mas ainda não há resposta do governante. Os comunistas exigem saber qual a avaliação que o Governo faz do impacto ambiental de um empreendimento desta dimensão e qual a justificação que o Governo dá para facto de “o plano de ordenamento do PNSACV abrir a possibilidade de implantação de estruturas e empreendimentos imobiliários de grande dimensão, ao mesmo tempo que estabelece um conjunto vastíssimo de restrições, imposições e proibições para os usos comuns e tradicionais do espaço e dos recursos por parte das populações locais”.

“A posição do PCP não é a de hostilização do investimento no turismo e no setor imobiliário, mas não pode aceitar que se sacrifiquem a conservação da natureza e os direitos das populações, os seus hábitos e meios de subsistência à avidez dos grandes grupos económicos”, conclui o grupo parlamentar dos comunistas.

População nem quer acreditar

Já a população nem quer acreditar que um mega projeto turístico deste tipo seja algum dia aprovado em pleno parque natural. “Há pessoas idosas que têm uma pequena casinha, com divisões minúsculas, e não lhes é permitido aumentar nem mais um centímetro, apesar de estar inserida num terreno enorme”, protesta Pedro, um dos moradores. “A neta dessa senhora só queria dar melhores condições à casa de uma pessoa já com algumas limitações de mobilidade. Mas como não é uma grande empresa multinacional…”, continua.

Já Vítor Marques, um algarvio que passa “muitos verões e alguns invernos” em Monte Clérigo, refere que este “é um dos muito poucos santuários que ainda existem no nosso Algarve”. “Não deixem os vampiros sugarem o sangue das nossas lindas praias”, comenta.

Por sua vez, Alexandra Prata considera que a construção do mega projeto será “um assassínio de um lugar valioso da paisagem natural”. “Portugal vai ver gravemente adoecido o seu território nacional. O turismo de massas tem que ser travado. Se tal empreendimento for avante, este país apodrece um pouco mais e quem desta praia tem beneficiado, ano após ano, vai morrer também”, remata.

Nuno Couto/JA

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