O Algarve perante o Orçamento de Estado

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O que pensa o Algarve da proposta do novo orçamento de Estado, que subirá a plenário para votação na generalidade na próxima quarta-feira, dia 28? O JA foi ouvir um conjunto de sete políticos e dirigentes empresariais e sindicais da região.
A maioria tece críticas ao documento, mas também há quem o aprove sem grandes restrições. Seja como for, até à votação na especialidade muita água vai correr debaixo das pontes. E nem há certezas absolutas quanto à aprovação…

José Apolinário,
presidente da CCDR/Algarve

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“Destaco as medidas de natureza social. Estamos numa situação social muito difícil e garantir complementos de RSI, salários e de compensação para as pessoas que estão desempregadas é absolutamente essencial. Apoiar as empresas e as pessoas são os grandes desafios.


Nós já não estamos na fase do betão, estamos na fase das pessoas. Temos a mais alta taxa de desemprego do País. O orçamento, os fundos, têm que ser canalizados para as pessoas e esse é o caminho deste documento.


O caminho dos complementos e dos apoios deve ser explorado, monitorizado e acompanhado na sua execução.


Temos duas emergências: a social, que exige a concentração de esforços no apoio às pessoas e às empresas e a emergência que tem a ver com a água e a gestão dos recursos hídricos. Não estamos na fase de avaliar o orçamento para ver quais são as obras de megamilhões, mas sim de olhar para o orçamento e saber como é que ele vai ajudar as pessoas que passam dificuldades na região.


Parece-me um orçamento que vai no sentido correto, agora vamos ter que implementar as medidas, monitorizá-las e aplicá-las.

Jamila Madeira,
deputada do PS

“O Hospital Central encontra-se no documento, está vertido nas Grandes Opções do Plano, tal como no ano anterior. E esse é um objetivo do Governo. É um processo de 2008 suspenso em 2011 e teve que haver uma avaliação jurídica e técnica desse processo para ser retomado. Quando eu saí do Ministério da Saúde o processo já estava fora do Ministério nas instância competentes para avaliação que carece de ser feita antes do desbloqueio. Esse desbloqueio não carece de incorporação imediata em OE por se tratar de um processo de uma PPP. A PPP é paga ao longo do tempo e enquanto não começar a obra não há rubrica orçamental.


Outro ponto é o plano de eficiência hídrica. Esse plano é particularmente relevante nos momentos de alterações climáticas e de afetação por seca do nosso território. A matéria está vertida no Plano de Recuperação e Resiliência.


Continuação da evolução das portagens nas ex-SCUT, onde o Algarve é vertido. É um processo que tem sido paulatinamente consolidado em passos progressivos e onde o PS se tem empenhado. Apesar da conjuntura económica e do contra-ciclo em que vivemos, o compromisso continua a ser cumprido, passo a passo (não nego isso), mas esse também foi o compromisso do PS.


O quarto compromisso é a eletrificação e requalificação da ferrovia também vertido neste OE.


Este OE corrobora a dinâmica deste Governo de apoio às famílias e empresas, de particular importância neste momento difícil para a nossa sociedade e economia. Pelo quinto ano consecutivo continuamos a reforçar o caminho para o incremento do salário mínimo nacional, até atingir o propósito dos 750 euros.


Uma medida cara para o Algarve é o vaucher do IVA, que contempla o IVA pago à restauração, e cultura vai ser devolvido em vauchers para os mesmos setores, com impacto muito positivo ao nível das empresas e ao nível das empresas temos ainda a redução da taxa de IVA aplicada à eletricidade, o que terá um impacto muito grande na nossa região.

Cristóvão Norte,
deputado do PSD

“Numa primeira abordagem ao documento, não encontro o Hospital Central, nem a requalificação da EN125, que continua em águas de bacalhau por força daquele negócio absurdo de 2009 que resultou num processo de litigância do qual o Estado ainda não se conseguiu libertar. Se o Estado vai resgatar devia ter lá as verbas previstas para a requalificação.


Temos que olhar para a questão da água, em que o Governo acompanha o sentimento geral mas ainda não há soluções. O plano apresentado tinha um conjunto de possibilidades mas não dizia que qualquer delas era adequada para responder aos problemas prementes da água no Algarve.


Nota positiva no orçamento: permitir que quem tinha alojamento local deixe de ser obrigado a pagar mais valias quando retira a casa do alojamento local e a utiliza para uso próprio para colocar no arrendamento. Com menos turismo, isso pode ser importante para colocar estudantes e para fazer baixar os preços da habitação na região.


Não é a melhor altura para aumentar o salário mínimo: estamos com um desemprego brutal, a destruição de emprego diária é um efeito de dominó imparável. Uma das áreas em que o salário mínimo é mais comum é na hotelaria e restauração. O próprio Governo já entendeu que era preciso desonerar as empresas de um conjunto de custos por ser asfixiante haver custos sem receitas. E paradoxalmente, reconhecendo-se isto, depois por força do aumento do salário mínimo aumentam-se os custos das empresas. E este ano não há inflação, ou seja, a manutenção do salário mínimo não prejudica ninguém, pois as pessoas não ficam a ganhar menos. Mantém-se o poder de compra.


Eu acho que o layoff devia ser mantido até abril e não até ao fim do ano. E este regime de layoff já é mais indesejável do que o que vigorava. E este já foi revisto porque o original, que vigorou em agosto e setembro, era mais prejudicial do que este e ainda mais prejudicial do que o originário.


Temos que fazer tudo ao nosso alcance para manter o emprego e depois temos que encontrar mecanismos de capitalização das empresas para que elas não se transformem em empresas “zombie”.


Encontro um desequilíbrio global no documento, que não combina bem a preservação do emprego, o apoio às empresas e a redistribuição. É bom que haja proteção social mas temos que prover o apoio às empresas e a redistribuição.

João Vasconcelos,
deputado do Bloco de Esquerda

“O OE2020 é uma profunda desilusão. Porque em termos de investimento nada está contemplado. O Hospital Central não tem nada, ao contrário do que foi decidido na Assembleia da República. Em maio tínhamos um plano de emergência para o Algarve em que estava contemplado o início da construção do Hospital Central e não aparece no OE, o Governo fez tábua rasa.


A questão rodoviária é outra desilusão. Sobre a EN125 nada consta. O TC não deu o visto, mas o Governo tinha obrigação de avançar com essa construção e não cumpre o que a AR determina. Vamos ter mais acidentes e cidadãos de primeira e de segunda porque não se avança com uma obra estruturante por que se espera há anos.


Foi aprovado também no Parlamento o levantamento de portagens no Algarve e não avançou. Temos a ferrovia, que contempla 60 milhões de euros, mas falta a ligação à Andaluzia.


A nível de educação precisávamos também da requalificação de algumas escolas, como a Secundária Manuel Teixeira Gomes, em Portimão, que precisa de uma requalificação urgente, nada contemplado.


Quanto ao desassoreamento de barras e canais, como a barra de Tavira, há um plano de dragagens mas nada está previsto no OE.


Quanto à água, fala-se por alto na reutilização das águas residuais, fala-se nesse sentido, mas não há nada de concreto. E há uma situação que se passa há 50 anos que é escandalosa: na zona do Rogil (Aljezur) há um canal do perímetro do Mira que debita milhões de metros cúbicos de água para o mar.


As medidas sociais ficam muito aquém do que pretendíamos. O Algarve depende do Turismo e é preciso tomar medidas extraordinárias porque a crise vai bater à porta de muita gente. Defendemos medidas a fundo perdido para as pequenas e micro empresas.


Temos que ter prestações sociais consistentes, para evitar que alguém fique para trás. E é preciso criar apoios que atinjam essas pessoas. E evitar que as pessoas sejam despedidas, quando as empresas têm lucro.


Contudo, não falta dinheiro para as PPP: temos mais 1548 milhões de euros no OE. E só a Via do Infante dá um prejuízo de 60 milhões de euros por ano.

Vítor Neto,
presidente do NERA


“Trata-se de um Orçamento muito defensivo, que evidencia alguma intenção de responder a alguns aspetos sociais mais graves, mas sem constituir uma resposta mais consistente à crise.


A proposta IVAucher de recuperação do IVA na Hotelaria, Restauração e Cultura através do desconto direto no consumo nesses setores – apesar de tímida e complicada – é positiva. Espero que possa ser reforçada e agilizada.


Por outro lado, tendo em conta a gravidade da situação da economia do Algarve associada ao Turismo – que não é só hotelaria e restauração, mas envolve muitos setores… comércio… transportes, etc. no Orçamento não se veem medidas fortes destinadas a apoiar as empresas em situação dificil, nesta conjuntura negativa.


O governo, entretanto, anunciou outras medidas no quadro do PRR Plano de Recuperação e Resiliência em que sugere novos instrumentos de apoio às empresas, que aguardamos que sejam positivas e que as empresas do algarve aproveitar…

Elidérico Viegas,
presidente da AHETA


“É uma queixa recorrente das empresas que o orçamento pensa pouco nas empresas e dá mais atenção a outras áreas. Isso resulta dos acordos e arranjos que o Governo tem que fazer à esquerda para que o orçamento seja aprovado.


Se estivesse a negociar com a Direita, porventura seria melhor para as empresas e para os trabalhadores em geral. Porque ao centrar os apoios em áreas que são menos produtivas a riqueza gerada será menor. O efeito multiplicador não existirá.


O problema do Algarve não se resolve subindo o salário mínimo, mas mantendo os postos de trabalho. O problema do salário mínimo deve ser entendido sobretudo na repercussão que tem nos salários mais altos. Porque ao subir o mínimo não se aumenta apenas o mínimo, provoca-se o aumento dos salário que estão acima dele. Independentemente da justeza do aumento do salário mínimo, que ninguém põe em causa, no período que atravessamos, o que é mais importante é manter postos de trabalho.


Se para o resto do País há queixas e críticas que se conhecem, no Algarve as queixas são maiores, porque tem uma atividade económica muito importante e que é a mais afetada da economia do País e não havendo apoio específico para as empresas isso vai ter repercussões no aumento do desemprego, nas insolvências, nas cessações de atividade, encerramento de negócios de empresas familiares, etc.


Havia uma forma mais simples do que o I-Voucher, que era baixar os impostos. Discordo completamente da medida. O que estaria certo era criar medidas que possam promover o consumo e nada melhor para isso do que baixar os impostos, como o IVA. Não faz sentido aumentar os salários e ao mesmo tempo aumentar os impostos. O que faz sentido, quando se quer melhorar as situações das pessoas, é descer os impostos. Cria-se a ilusão de que as pessoas vão ganhar mais mas depois o que ganham a mais não é suficiente para suportar o aumento de impostos.


Temos hoje uma perceção mais precisa da dimensão da crise e as consequência que ela tem na economia e no Turismo. O regresso à normalidade vai levar uns tempos. Se é verdade que antes da pandemia tínhamos turismo e depois também vamos ter, o que é preciso fazer para aguentar este interregno. E nessa situação, o que é preciso fazer é criar condições para que o know-how acumulado não se perca, para que no regresso à normalidade estejamos em condições de responder à retoma. Não havendo políticas ativas de promoção do desemprego, perde-se know-how, porque as empresas agora não precisam dos trabalhadores não os contratam e quando precisarem eles não estão disponíveis porque entretanto terão que partir para outra.

António Goulart,
coordenador CGTP no Algarve


“Há três instrumentos que têm que ser analisados em conjunto. Um deles é o Plano de Recuperação e Resiliência, outros é a estratégia para o Algarve aprovada no mês passado no conselho geral da CCDR/Algarve (com o voto contra da CGTP) e o Orçamento de Estado. Por exemplo, sabemos que vai haver a ponte de Alcoutim, não pelo OE mas pelo PRR.


No concreto, temos que questionar se o OE responde de forma satisfatória às necessidades da região no momento presente no que se refere ao investimento público. E as necessidades são estas: responder a uma região que tem a maior recessão do País e que temo maior nível de desemprego de todas as regiões. E a resposta é não. Faltam os investimentos públicos, particularmente na saúde, na educação, apoios sociais.Por outro lado, é insuficiente a criação de elementos dinamizadores da economia regional. é insuficiente para dar resposta às preocupações regionais, que têm a ver à má situação da sua economia e ao enorme volume de desemprego. Estas são duas áreas em que o OE precisava de dar resposta cabal e ela é manifestamente insuficiente. O OE deveria apostar mais no investimento público.


Havia necessidade de outro tipo de respostas, além destas: investimentos nos transportes públicos coletivos, linha férrea, a requalificação da EN125. O que surge é pouco.


No que respeita ao salário mínimo, estamo-nos a bater pelos 90 euros por mês. Se cada trabalhador tiver mais 90 euros no seu bolso, são as empresas a venderem mais 90 euros a cada trabalhador e isso seria um estímulo muito importante para a economia. É uma exigência da CGTP para todos os trabalhadores. Seria uma bazuca de 5 mil milhões por ano injeção na economia.

João Prudêncio

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