O que se fala… E as crianças?

Muito se fala sobre a recuperação das aprendizagens. Os alunos estiveram em casa, não realizaram aprendizagens, estão muito atrasados, estão mal preparados…


Os alunos estiveram em casa cerca de dois meses, mas não estiveram parados. Houve sessões síncronas todos os dias com os professores e houve trabalhos assíncronos atribuídos. As aprendizagens recuperam-se. Não é este ano, é no próximo. As crianças são resilientes, têm tempo.


Até já se fala em recuperar as aprendizagens com programas culturais e desportivos de verão. Mas, será necessário? As crianças vão permanecer na escola até à primeira semana de julho. Nesta altura, e estamos a meio do mês de maio, os alunos já estão cansados, saturados da sala de aula, ainda mais por não se poder estender a sala de aula a visitas de estudo, a bibliotecas, museus… Mas mesmo que se pretenda recuperar as aprendizagens com estes programas de verão, visando o bem estar físico, continuará a ser prudente não frequentar estes espaços.


As temperaturas altas que tão prazenteiramente deleitam os turistas que procuram o nosso país, também são foco de sonolência, cansaço, exaustão e dificuldade em focar a atenção para aqueles que estão numa sala de aula. Na semana passada, já se atingiram os 27 e 28 graus centígrados e este clima já teve repercussões na concentração das crianças, em salas de aula onde não existe ar condicionado, onde as portas e janelas têm de estar abertas, onde os intervalos desencontrados das crianças da escola resultam numa alegre parafernália de gargalhadas e risos tão característicos da realidade escolar, mas tão indutores de desconcentração para aqueles que permanecem nas salas, pois não podem ir simultaneamente para o recreio. Fará sentido aulas até julho? O que se recupera de aprendizagens num contexto de saturação e desconcentração?


O período em que as crianças estiveram em casa poderia ter sido evitado, se as indicações da direção geral de saúde tivessem sido aplicadas: distanciamento físico e menos alunos em cada sala de aula. Mas estas medidas foram aplicadas em todos os setores, menos na educação. Porquê? As crianças são imunes? Não! Teria sido necessário contratar mais professores, mais pessoal não docente. Investir na educação nunca está na agenda orçamental do governo e a prova disso são os 3,16% destinados à educação, no orçamento do estado para este ano letivo, muito longe dos 6% recomendados pela OCDE e reivindicados pelo SPZS e pela FENPROF.


Outra questão que urge colocar: o que é, de facto, melhor para as crianças? Lembraram-se de perguntar aos professores? Se esta pergunta tivesse sido feita aos verdadeiros profissionais da educação, as respostas seriam unânimes: deixem as crianças brincar e usufruir das famílias e do descanso tão merecido depois de 3 meses de aulas ininterruptas.


Não é por permanecer mais tempo na escola ou por existir programas culturais e desportivos que as crianças vão superar algumas lacunas que surgiram devido ao incaracterístico ensino a distância. Não nos podemos esquecer que este tipo de ensino também desenvolveu competências nos alunos que de outra forma não teria acontecido. Os alunos aprenderam a gerir o seu tempo, a utilizar os computadores, a aceder às plataformas digitais usadas neste tipo de ensino…

Muito se fala que as crianças do 1.º ciclo são aquelas que mais tempo passam na escola, comparativamente com os restantes países europeus, e são aquelas que, juntamente com o 2.º ciclo, vão terminar as aulas mais tarde. Onde está o bom senso desta decisão?


É necessário e urgente respeitar as crianças, o seu ritmo de trabalho, de concentração. Deem-lhes tempo de qualidade com as famílias, reduzam a carga letiva, revejam os currículos extensos e diminuam o número de alunos por turma. Começamos por aqui, pode ser senhores governantes?

Sandrine Coelho

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