Portugal recusou €50 milhões da UE para compra de aviões

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Governo alega altos custos de manutenção para fazer borregar a operação ‘low cost’

Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC) não aceitou a disponibilidade dos fundos europeus do Portugal 2020 para a compra de dois aviões pesados anfíbios de combate a incêndios com um “desconto” que podia chegar aos 85%.

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O convite esteve aberto até 29 de fevereiro de 2016, mas a ANPC optou por não apresentar qualquer candidatura. Em causa estavam €50 milhões, a fundo perdido, para comparticipar, até 85%, a compra das duas aeronaves.

A decisão do atual Governo causou estranheza na ‘máquina’ que trata dos fundos comunitários, até porque não foi nada fácil, durante o anterior Executivo, convencer a Comissão Europeia a aceitar desembolsar dinheiro para Portugal adquirir aviões. Bruxelas evita subsidiar meios de transporte e, no âmbito das negociações do Portugal 2020, Lisboa teve de justificar quão decisivo era este investimento.

Portugal “é o único país do sul da Europa que ainda não dispõe deste tipo de meios”, ficando “dependente do mercado internacional de locação durante a época mais crítica de combate a incêndios florestais, mercado esse cada vez mais exíguo e oneroso”, lê-se no convite do Portugal 2020 que a ANPC recusou.

ALUGAR EM VEZ DE COMPRAR
O gabinete do secretário de Estado da Administração Interna (SEAI), Jorge Gomes, explicou ao Expresso as razões da recusa: “Não basta comprar os aviões. É preciso garantir a operação e manutenção, os voos de treino, os salários dos pilotos e mecânicos, a substituição de peças e os combustíveis, entre outros aspetos”.
O Governo está agora a reavaliar a questão: “A sustentabilidade da operação e manutenção dos meios deve ser um fator decisivo na decisão de aquisição. É essa avaliação que, com transparência e rigor, iremos realizar”.

Segundo o SEAI, atualmente, no período crítico de incêndios florestais, Portugal aluga dois aviões pesados anfíbios, que atuam em parelha. Para garantir a plena operacionalidade desses dois meios (ou seja, para acautelar as paragens para manutenções ou reparações), a empresa fornecedora tem três aviões em permanência. O Estado paga anualmente pela disponibilidade, manutenção e operação destes meios €4,7 milhões. Sem mais despesas ou custos de investimento.

Para o membro do Governo, comprar sai mais caro do que alugar. Primeiro, a aquisição de três aeronaves idênticas às usadas atualmente teria um custo aproximado para o Estado de €140 milhões. Depois, os encargos com a manutenção de dois aviões pesados anfíbios, para um ciclo de vida de 25 anos, foram estimados em €15 milhões.

Além disso, os €50 milhões davam apenas para comprar um avião e não dois. Quando o atual Governo iniciou funções, tomou conhecimento de que o modelo de avião previsto (Canadair) foi descontinuado pelo fabricante, que encerrou a linha de produção. Esse facto limitou, desde logo, a elaboração do estudo económico e financeiro (análise custo-benefício da operação), obrigatório em candidaturas deste montante.

João Almeida, secretário de Estado da Administração Interna do Executivo PSD/CDS, membro do Governo que se empenhou para que Bruxelas abrisse os cordões à bolsa para a compra de aviões pesados, mostrou-se prudente, quando instado a comentar a situação.

“Não conheço a decisão”, disse o deputado do CDS, justificando assim ausência de qualquer juízo sobre a opção do Governo socialista. O ex-secretário de Estado acrescenta desconhecer também qualquer resultado da “análise custo-benefício” da operação, em vias de ser iniciada quando cessou funções governativas. Por outro lado, João Almeida ressalva que a compra dos dois aviões se “enquadrava num projeto mais vasto, em que a Força Aérea participaria no combate aos fogos a partir de 2018”.

Abandonada a compra dos Canadair, o SEAI quer agora inverter as prioridades do Portugal 2020 no que respeita ao combate a incêndios. Jorge Gomes acusa o anterior Governo de ter destinado €50 milhões para meios aéreos e apenas €7 milhões para o restante investimento na proteção civil: “Durante seis anos, não haveria fundos comunitários para requalificar o parque automóvel das forças que integram o dispositivo operacional de combate aos incêndios. Não haveria dinheiro para equipamentos de proteção individual, nem para a reabilitação de quartéis de bombeiros e de outras infraestruturas de proteção e socorro”.

UMA RARA UNANIMIDADE
O deputado CDS salienta, no entanto, que “todos os outros países mediterrânicos [com condições climáticas idênticas às de Portugal] possuem aeronaves com este perfil”. João Almeida acrescenta que a iniciativa do Governo de que fez parte surgiu “na sequência dos relatório de um grupo de trabalho da Assembleia da República que definiu a compra dos aviões pesados como uma prioridade. E a deliberação do Parlamento acabou por ser aprovada por unanimidade”, sublinha.

Com efeito, em 2014, o Parlamento, na sequência das conclusões do grupo de trabalho para o acompanhamento da problemática dos incêndios florestais, recomendou ao Governo para “avaliar a possibilidade de aquisição por parte do Estado de aviões pesados anfíbios (Canadair) recorrendo a fundos comunitários”.

Afinal, ao contrário da solidez política do processo no Parlamento, aos olhos do Governo a engenharia financeira é incapaz de suportar a compra de aviões pesados.

JA | REDE EXPRESSO
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