Presidente da Câmara de Alcoutim: “A ponte que eu gostava de ter é pedonal!”

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Aos 52 anos, o socialista Osvaldo Gonçalves é um homem tranquilo. Tranquilo com a obra feita ou em construção, mas também com aquela que lhe foi deixada pelo antecessor social-democrata, Francisco Amaral. Obra que elogia, nas contas deixadas e nas concretizações herdadas, a ponto de lhe ter feito pública homenagem, em nome do município. O mesmo se aplica aos vizinhos espanhóis, agora de cor política diversa da sua, PP. As pontes com Espanha transcendem as cores políticas, advoga. Quanto à outra, a ponte de que se fala há tantas décadas, nem pede nada de muito diferente daquela que, à rés da água, é montada todos os anos por alturas do Festival do Contrabando: que seja pedonal!

Jornal do Algarve – Como é possível rejuvenescer a população tão idosa do concelho? Tem esperanças que seja possível?
Osvaldo Gonçalves
– Tenho esperança. Esse é um dos graves problemas que temos e temos que acreditar que é possível estancar e fazer regredir esta tendência, que ao longo das últimas décadas tem feito descer o número de pessoas. Esse é de facto o grande problema que temos no concelho.

J.A. – A maior parte da população que emigra vai para fora ou fica cá, no Algarve?
O.G.
– Neste momento não temos um surto migratório relevante. Tivemos no passado, felizmente tivemos alguns casos do processo inverso, não tantos quantos gostaríamos. Mas quanto aos jovens, tendencialmente, eles têm evoluído em termos de formação académica e depois procuram fora daqui as oportunidades de emprego que não encontram.

J.A. – Contudo, a maior parte deles ficam no Algarve…
O.G.
– Muitas vezes não ficam! Vão para outras regiões. Há uns anos era frequente a maioria das pessoas estudarem na Universidade do Algarve, hoje as universidades de Lisboa, Coimbra, Porto, Aveiro, absorverem muita gente de fora. Criam lá afetos e raízes e acabam por ficar por lá.

J.A. – No geral como tem sido a evolução da população residente? Tem diminuído?
O.G.
– Sim, no geral tem diminuído. Nos cadernos eleitorais, relativamente ao último período eleitoral, há uma quebra.

J.A. – Quanto ao Turismo, a Via Algarviana trouxe mais oportunidades para o Turismo?
O.G.
– Trouxe. A Via Algarviana é um dos vetores que acompanham e combatem a sazonalidade. Os percursos que são procurados mais na primavera, outono e inverno trazem mais pessoas a Alcoutim. Mesmo nas pequenas rotas, conhecidas pela promoção que fazemos. Ainda agora almocei no hotel e eles disseram que têm muita gente. E isso não é por causa da caça, é sobretudo devido aos percursos pedestres.

J.A. – O número de camas turísticas tem crescido no concelho?
O.G
. – Em 2013, quando cheguei à Câmara, tínhamos a Pousada da Juventude, alguns alojamentos locais e mais nada. O Hotel de Guerreiros do Rio fechou em 2013. O agora Hotel de Alcoutim, que era na altura era a estalagem, fechou também. Ficámos quase sem resposta em matéria de dormidas. Foi um trabalho hercúleo, mas tentámos reabrir Guerreiros do Rio, embora essa não fosse nossa competência. O mesmo não fizemos em relação à estalagem. O edifício era nosso, felizmente conseguimos, mas levámos dois anos no processo. E conseguimos que reabrisse portas em 2017, reconfigurado, remodelado, e ficou convertido em hotel. Portanto, crescemos bastante em número de camas nestes últimos seis anos.

J.A. – No que respeita ao orçamento camarário deste ano, houve uma descida de 820 mil euros. A que atribui esse decréscimo? Haverá menos obra este ano?
O.G.
– Não. O número de obras que temos em curso e para lançar e relançar, temos muita obra para fazer e esperamos conseguir fazer até ao final do ano. A maior parte delas têm candidaturas a fundos comunitários aprovadas.

J.A. – Que obras são essas?
O.G.
– Temos em fase de conclusão uma ampliação do centro de náutico de Alcoutim, que é o equipamento de apoio à atividade náutica do Guadiana; temos a obra do espaço de promoção e comercialização de produtos endógenos; temos um espaço com cinco habitações para arrendamento em Alcoutim; temos um loteamento com 26 lotes em Martinlongo; temos para lançar a empreitada de um pavilhão na zona industrial para promoção de produtos endógenos; temos uma obra que temos que relançar (porque o concurso ficou deserto) que é um espaço para o observatório astronómico dos Moinhos da Pateira.

J.A. – Voltando à quebra dos 820 mil euros. Afinal porque desceu?
O.G.
– Para a execução de obras nós temos este ano menos receita de capital que advém dos fundos comunitários. Temos um conjunto significativo de obras com fundos comunitários mas há um conjunto com financiamento que não vem daí. Essa será a principal razão porque o orçamento desceu. Embora de receitas próprias nós tenhamos uma expectativa menor relativamente ao ano passado…

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J.A. – Por causa do IMI [Imposto Municipal sobre Imóveis]?
O.G.
– Não, o ano passado tivemos uma receita extraordinária de IMT [Imposto Municipal sobre Transmissões], que este ano não teremos.

J.A. – E ainda quanto ao orçamento, Alcoutim tem um peso enorme das despesas fixas…
O.G.
– Exatamente. Temos uma dependência muito grande das transferências do Estado. Em relação a 2020, depois de termos feito o orçamento é que saiu o Orçamento de Estado e sabemos agora que a nossa receita irá aumentar com verbas para investimento. Mas o peso da Câmara, a sua estrutura, os custos com funcionários e com o funcionamento da Câmara, serviços sociais, proteção civil, são despesas fixas.

J.A. – Isso leva que percentagem dos 10,7 milhões de orçamento?
O.G.
– Em despesas com pessoal temos 3,5 milhões de euros. Isto é sintomático do peso das despesas fixas. Mas no total estamos a falar em mais de 50% de despesas correntes.

J.A. – Qual o estado das relações com os vossos vizinhos espanhóis mesmo aqui ao lado)
O.G.
– São excelentes. Desde que aqui cheguei tentei uma aproximação com eles e mesmo depois de ter havido uma alteração política no Ayuntamento [de San Lucar] as relações mantiveram-se.

J.A. – Eles eram PSOE e agora são PP. Mesmo em áreas políticas diferentes, dão-se bem…?
O.G.
– Na nossa relação isso aí é o que há-de contar menos. Porque se estivermos sempre à espera de termos cores iguais para fazermos alguma coisa corremos sempre o risco de não fazermos coisa nenhuma.

J.A. – No que respeita a essa relação com Espanha, o Festival do Contrabando é um evento fundamental, do ponto de vista histórico-cultural, não é?
O.G.
– Sim. É um evento já com uma expressão nacional e até internacional. Nos dias 29, 30 e 31 de março a 4ª edição. É o maior evento cultura do concelho de Alcoutim. Isso só é possível graças a essas boas relações que existem com San Lucar. Temos a ponte flutuante que une as duas margens nesse dia do Festival, que simboliza a nossa ânsia de vermos aquelas duas margens unidas através de uma ponte.

J.A. – Ainda tem esperança que um dia haja essa ponte a ligá-los, ou agora que há uma embarcação marítimo-turística isso faz menos sentido?
O.G.
– Há um serviço marítimo-turístico que funciona muito bem. Não há horários mas há uma grande proximidade e disponibilidade desse serviço junto dos passageiros. Mas quanto à ponte, de há dois ou três anos para cá, das conversas que tenho mantido com os nossos vizinhos espanhóis, concordamos que gostaríamos de ter uma ponte. Mas a ponte que eu gostaria de ter aqui seria uma ponte pedonal. Porque o turismo de Natureza, que tem um nicho de procura elevado, aumentaria com uma ponte com essas características. E as próprias rotas.

J.A. – Mas podia ser mista…
O.G.
– Ela tem que ser mesmo mista, porque a legislação não permite que se faça uma ponte só para peões. Uma ponte dessas ficaria obrigatoriamente preparada para veículos de emergência.

J.A. – Mas isso não deve ser muito popular. Com certeza aqui as pessoas devem estar fartas de ter que ir à ponte internacional do Guadiana para voltar para cima.
O.G.
– Não é muito popular mas em termos estratégicos é um bom caminho. E até já mandei fazer um estudo prévio sobre essa matéria, quanto a exequibilidade e custos, e apresentei isto ao anterior ministro das Obras Públicas e está sempre na minha agenda, no meu calendário de reivindicações.

J.A. – Vamos falar da energia solar. Têm dois grandes projetos em andamento no concelho, um dos quais em obra. Mais empregos para Alcoutim, ou os futuros empregados virão de fora?
O.G.
– O que faz de Alcoutim um concelho com muita qualidade de vida a nível do Ambiente, desde que exista uma ação parcimoniosa deste tipo de intervenções no território, não estaremos a estragar essa característica do concelho. Uma prova disso é que um destes projetos foi desenvolvido sobre um importante troço da Via Algarviana e depois conseguiu-se conciliar as duas coisas. Esse [o risco ambiental] seria o risco maior que poderia acontecer. Temos um território com quase 600 quilómetros de área e a nossa densidade populacional é baixa e um investimento destes dá um contributo muito forte para a melhoria do ambiente, porque se está a criar energia limpa. Quanto aos postos de trabalho diretos e indiretos, não é verdade o que se diz, que isto não cria postos de trabalho. Não é verdade, isto cria postos de trabalho. Temos um exemplo, um pequeno parque demonstrativo à entrada de Martinlongo, com quatro ou cinco hectares, e estão lá três pessoas a trabalhar.

J.A. – Há alguma previsão de quantas pessoas trabalharão nessas centrais?
O.G.
– Nestes dois projetos fala-se na criação de entre 60 a 100 postos de trabalho fixos.

J.A. – Para três mil habitantes de Alcoutim, não é nada mau.
O.G.
– Pois não. Considero que é muito bom.

J.A. – O problema é se parte dessas pessoas terão que vir de fora.
O.G.
– Esperamos que estes postos de trabalho sejam ocupados por pessoas que aqui precisem de trabalho, mas se algumas tiverem que ser de fora que sejam ocupados por pessoas que tiveram que sair de cá e que isto seja uma oportunidade para regressarem.

J.A. – Um destes projetos, o Solara 4, arrisca-se a ser o maior da Europa, não é?
O.G.
– Na altura, quando foi comunicado, era o maior da Europa, depois começou a ser um dos maiores da Europa e agora é o maior do País. Sendo o maior do País talvez seja um dos maiores da Europa.

J.A. – Gostava que o concelho de Alcoutim fosse energeticamente autónomo?
O.G.
– Era uma forma muito justa de retribuir aos alcoutenejos para a contribuição que damos com o nosso solo e o nosso sol para a produção dessa energia. Que a energia viesse dali e os custos também fossem mais baixos para as pessoas de cá.

J.A. – Quanto à água, Alcoutim arrisca-se a ser ainda mais o concelho fornecedor de água do sotavento do Algarve, pois pode vir a acrescentar a Odeleite e Beliche mais uma barragem, a da Foupana. Qual a sua opinião sobre essa possibilidade?
O.G.
– Nós já somos o fornecedor. A água que é consumida no sotavento, que é distribuída através do subsistema Odeleite/Beliche, é captada na bacia hidrográfica da Barragem de Odeleite, que atravessa uma parte significativa do concelho de Alcoutim. Uma parte da bacia do Beliche absorve águas que caem no território de Alcoutim. Se nós construirmos a Foupana, ela atravessa todo o concelho de Alcoutim.

J.A. – O que acha da Barragem da Foupana?
O.G.
– Quando eu e aqueles que falámos disso primeiro, acharam que nós estávamos a ter uma ideia tresloucada. Mas fazer a Foupana para resolver os problemas da água do Algarve é a coisa mais acertada que se poderá fazer quanto às soluções apontadas. Vamos ter dificuldades no futuro se não arranjarmos formas alternativas de reter água. E a Barragem da Foupana é a melhor opção, porque permite um alargamento da bacia da retenção de águas da chuva e aumenta a oportunidade para captar as chuvas torrenciais. Por exemplo, agora em dezembro choveu muito, Odeleite apanhou um bocadinho de água, a Foupana apanhou uma grande cheia e o Vascão teve uma cheia como não tinha há 30 anos! A Foupana tem uma enorme capacidade de armazenamento, da ordem dos 90 milhões de metros cúbicos.

J.A. – O Osvaldo faz parte do grupo de trabalho criado para apresentar soluções quanto à seca. Vai defender a Foupana em detrimento de São Brás?
O.G.
– Defendo as barragens, porque de todas as soluções que nos apontam – dessalinização, aproveitamento das águas das ETAR – não resolvem o problema. A dessalinização é um processo muito caro, não resolve o problema da agricultura.

J.A. – O presidente da AMAL [António Pina] defende-a.
O.G.
– Acredito que sim, para resolver os problemas do litoral. Mas como é que se traz essa água para os montes mais recônditos do concelho de Alcoutim? O problema não é o consumo, é a rega, que são 60% do consumo de água. Nós fomos os últimos a ter água, primeiro foi o litoral. Se nós vamos para uma situação em que tenhamos que ser servidos pela água do mar, vamos ter que esperar mais tempo.

J.A. – Qual é a percentagem de população de Alcoutim que é ainda servida por furos?
O.G.
– Temos a freguesia de Vaqueiros com 65 a 70% da população servida por furos. E em Martinlongo temos cerca de 10%. Nas 100 povoações do concelho de Alcoutim só 20 ou 30 povoações é que não têm água das Águas do Algarve.

J.A. – E até ao final do seu mandato gostava que todas elas passassem a ter?
O.G.
– Temos projetos para continuar esse trabalho mas isso vai depender também da capacidade de entrega das Águas do Algarve. Daí que seja tão importante nós reforçarmos a nossa capacidade de armazenamento de água.

J.A. – O seu antecessor, Francisco Amaral, era uma pessoa querida de grande parte da população tinha já ganho várias eleições. Como é que foi o receber de testemunho dele? Foi difícil? Chegou a falar com ele na altura, quando entrou?
O.G.
– Claro que falei! O que encontrei quando cheguei aqui foi uma casa que financeiramente estava saudável. E essa saúde financeira que esta casa teve ao longo dos anos – que eu partilhei aqui de 2009 a 2013 como vereador não permanente – foi a situação que recebi e que hoje se mantém. Quanto a projetos que tinham sido iniciados e estavam em curso foram todos concluídos. Os que não estavam em curso e foi possível lançar eu dei essa continuidade. Na área da saúde, que era uma das grandes bandeiras do Dr. Amaral, o que tentei fazer foi dar continuidade ao que estava bem, melhorar no que foi possível. E duas coisas que consegui melhorar foi a unidade móvel de saúde, peguei nessa unidade, que fazia os montes com um enfermeiro a medir tensões arteriais e criei uma unidade móvel de saúde com um médico e um enfermeiro. Outra coisa que me caiu na sorte quando tomei posse, a 15 de outubro de 2013 e três dias antes tinha sido assinado um despacho de encerramento de uma extensão de saúde em Vaqueiros. E felizmente, no dia 29 de agosto de 2017 aquela extensão de saúde foi reaberta. Tenho a agradecer à ARS mas foi uma das coisas que mais insisti e lutei.

J.A. – Não desiludiu as pessoas da terra que gostavam do Dr. Francisco Amaral?
O.G.
– Aliás sempre achei que o trabalho que foi feito foi um trabalho bom. Eu inclusivé, em 2015, levei à câmara a proposta de atribuição de uma medalha de honra ao Francisco Amaral como reconhecimento do município ao trabalho que eles desenvolveu nos 20 anos que esteve aqui na câmara.

J.A. – No fundo, a interioridade junta as pessoas?
O.G.
– Por muitas coisas que nos possam dividir há outras coisas que nos unem que é o gosto e responsabilidade de uma gestão ao serviço de quem nos elege. E desse ponto de vista nós estamos alinhados.

João Prudêncio

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