Quando parte um amigo…

Luísa Travassos
Luísa Travassos
Diretora do Jornal do Algarve Carteira Profissional - 588 A

“Quando um amigo se vai, fica um enorme vazio que não pode ser preenchido pela chegada de outro amigo…”

Chegámos a uma fase da vida em que, cada vez mais, nos chegam notícias de perdas! Acabámos de perder mais um grande amigo, José Fernandes Estevens, talvez um dos mais carismáticos autarcas deste país.

Frequentámos a mesma escola, em Vila Real de Santo António. Cada um seguiu a sua vida, cursos diferentes, um História outro Direito, mas a mesma profissão – ensino. Ao mesmo tempo que enveredava pelo jornalismo, seguiu ele pela política que o fez regressar ao seu concelho de origem – Castro Marim. Se o estudo nos afastou, este regresso encarregou-se de nos aproximar.

Estevens trazia consigo uma ambição, aproveitar as grandes potencialidades do concelho de Castro Marim, uma terra com história (como então lhe chamou) que passou a ter cada vez mais notoriedade a nível nacional.

Esteve à frente da autarquia três mandatos, ao serviço do PSD. Quando se aproximava o fim do último, foi convidado a ocupar um cargo regional, o que mantê-lo-ia na política, uma vez que não poderia candidatar-se de novo. Não aceitou! Tinha sido eleito para presidir a sua autarquia até final do mandato, pelo que não iria abandoná-lo por interesse próprio. Isso diz muito do seu caráter!

Não vou aqui falar da vasta obra que deixou, isso é assunto a ser tratado em peça para o efeito! Vou refletir um pouco sobre o homem, sobre o amigo. José Estevens parecia ser uma pessoa distante ao mesmo tempo que era afável. Parecia ter um semblante sério, ao mesmo tempo que tinha um humor fino. Era um bom contador de histórias de gente da sua terra, como era um bom defensor daquilo que considerava realmente importante valorizar.

Foi o que aconteceu com o sal tradicional, uma das mais valias do concelho que estava em franca decadência. Fez parcerias com a Reserva do Sapal, com cidades francesas produtoras de sal e flor de sal… enfim, foi em grande parte por sua influência, mas não posso deixar de referir que, fazendo dupla com Fernando Reis, sem tirar o mérito a todos os que os acompanharam, que este produto passou a ser conhecido como Ouro Branco e reconhecido como um dos melhores do mundo.

Também esta luta se encarregou de nos aproximar ainda mais, uma vez que, para além do jornalismo de causas que sempre tivemos em mente neste jornal, outra das nossas causas, enquanto família, era a defesa da biodiversidade, da Reserva do Sapal e das salinas, indispensáveis a essa defesa.

Já não eram o presidente, o diretor e a editora do Jornal do Algarve. Eram os amigos com lutas e causas comuns. E os amigos convivem e dão-se a conhecer! Recordo, com saudade, os momentos que privámos, as férias passadas em conjunto, a Isabel, a Rita e o Pedro.

Tanta coisa haveria para dizer… mas fico por aqui! Tal como diz o poema de Alberto Cortez, quando um amigo se vai, nada pode ocupar o vazio, mesmo que cheguem muitos e bons amigos!

Já são muitos os vazios!

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1 COMENTÁRIO

  1. A referência a que a dra. Luísa Travassos alude sobre a natureza única da amizade perene que nos recordam os bancos da escola mexeu com o próprio imaginário que deixaram em mim os saudosos amigos da Primária, quase todos já “idos” para outras dimensões …

    Apesar de haver quem o faça, não é muito o meu estilo colocar sobre os ombros os galões dos anos já vividos.
    Valemos pelas pessoas intrínsecas que somos – e isso não escolhe idades – e não meramente pelas cãs que nos adornam a fronte.

    A idade avançada traz experiências e saberes que os livros nem sempre ensinam, mas também nos brinda com os eventos tristes da perda sucessiva dos amigos de tempos mágicos, como foram os da infância, amigos que – permita-se-me a opinião – considero os mais puros, mais disponíveis, mais inteiros, mais fiéis, seja qual for o estatuto social a que subiram na vida e a que nos ligam as experiências mais fascinantes e nostálgicas de um tempo em que éramos felizes sem o sabermos.

    Nos momentos de recolhimento, de introspecção, geralmente no silêncio da noite, de cabeça pousada na almofada da cama, dou por mim a recordá-los, um a um, pelos seus nomes, no esforço inglório de lhes tentar insuflar vida: o Zé Calado, o Vasco, o Luís “Caixote”, o Manel Correia (companheiro de carteira, que partiu cedo), o Zé Guerreiro (que também nos deixou precocemente), o Manel “das Travessas” e as moças, a Aliete, a Lídia, a Idalina, a Luísa, a Ernestina, a Adélia …
    Sinto a presença de todos, ali, à minha volta, vindo cumprimentar-me ao meu chamamento …
    Recordamos os nossos passeios em grupo, aos domingos (o único dia de folga da semana, nesses longínquos anos 40), numa alegre e franca camaradagem entre risadas constantes, num tempo em que as nossas pernas eram o único meio de locomoção e em que as pessoas eram mais felizes com menos.

    E todos festejamos, em conjunto, os velhos tempos em que, no chão do adro da Igreja Matriz, ainda de terra batida – mais os moços do que as moças –, brincávamos aos nossos jogos: do berlinde, do pião, da cabra-cega, do eixo, do trapinho queimado, da marca ou botão, da apanhada, das escondidas, do jogo da bola (com uma bexiga de porco, à falta de melhor, ainda a deitar os últimos pingos de urina do animal, que enchíamos com a boca …) ou o jogo da carica.

    Estes são os jogos de que me recordo, embora haja outros, a que a memória já não chega.
    Por fim, com o sono a reclamar a entrada em cena, todos, embora com um sabor a pouco, nos despedíamos, num “até à próxima” …

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