“Reformas estruturais” na periferia não resultarão tão cedo

ouvir notícia

.

O impacto das chamadas reformas estruturais no quadro de uma consolidação orçamental é muito diferente nas economias do “centro” da zona euro e nas da “periferia”. “Para a periferia, onde a consolidação é, grosso modo, o dobro da requerida no centro, os resultados [recorrendo a um modelo] sugerem que passarão vários anos até que as reformas estruturais façam com que o nível de produção regresse à trajetória anterior à consolidação”, dizem três técnicos do Fundo Monetário Internacional (FMI) num artigo publicado nos “Working Papers” da organização.

A “periferia” é definida pelos técnicos como abrangendo o que hoje se alcunha com o acrónimo inglês GIIPS (Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Espanha). O modelo usado é o Global Integrated Monetary and Fiscal Model do Fundo. E as reformas estruturais a que o documento se refere são as que abrangem as condições do mercado do país e os regimes laborais locais.

O artigo assinado por Derek Anderson, Benjamin Hunt e Stephen Snudden é intitulado sugestivamente de “Consolidação Orçamental na Zona Euro: Quanta dor podem as reformas estruturais aliviar?” (Working Paper 13/211, outubro 2013). Sobre a dor ou o seu alívio, os autores dizem nas conclusões que “os resultados sugerem que para o centro é praticamente provável que as reformas estruturais possam contrabalançar o próprio impacto negativo no curto prazo da consolidação em curso”. O que já não é transponível para os GIIPS: “Contudo, para a periferia, mesmo no caso em que se alcança 75% da distância para as melhores práticas [em matéria de mercado competitivo e regime laboral], serão precisos vários anos para que o PIB regresse ao seu nível anterior à consolidação”.

- Publicidade -

O trabalho parte do princípio que as reformas estruturais serão positivas no médio e longo prazo. E admite vários impactos positivos no próprio curto prazo. Mas, logo, adverte: “Há um conjunto de razões para que as estimativas apresentadas neste trabalho possam estar a sobrevalorizar os impactos positivos das reformas no curto prazo”.

‘Fraqueza cíclica’ atrapalha efeito das reformas

É interessante averiguar, depois, quais são esses constrangimentos. O primeiro tem a ver com o mercado do emprego. Por mais reformas que se implementem, há uma variável incontornável que tem a ver com o atual período de “fraqueza cíclica”, como lhe chama o artigo.

Por mais facilitado que seja o despedimento, por menor que seja o subsídio de desemprego e por mais ajustados em baixa que sejam os salários para contratar, se não houver procura (externa e interna) não há criação líquida de empregos. Ou seja, se os tempos que se vivem forem de “procura fraca e excesso de capacidade instalada”, as reformas não produzem efeito. Dito de outro modo: “Durante um período de fraqueza cíclica, pode acontecer que o excedente de mão-de-obra só seja absorvido muito devagar”. E o próprio aumento da produtividade será pequeno e gradual.

O segundo aspeto tem a ver com as próprias reformas estruturais, nas quais os técnicos do FMI incluem algumas que implicam despesa pública no que é designado por políticas ativas de emprego e cuidados infantis (que permitam sobretudo às mães ter atividade profissional). “Se estes gastos [públicos] têm de ser financiados reduzindo outras despesas, levará muito mais tempo para que as reformas estruturais contrabalancem os efeitos negativos da consolidação”.

O terceiro constrangimento tem a ver com a própria dinâmica da realidade face às reformas de mercado que pretendem combater regulamentação anti competitiva quer nos serviços quer na produção e, por essa via, induzir aumento de produtividade e renovação do tecido económico. “Implementar reformas de mercado num período de fraqueza cíclica também pode reduzir temporariamente o produto e o emprego, pois as firmas ineficientes são obrigadas a fechar, antes que novas empresas ou mais eficientes possam aumentar a produção”.

O estudo admite que este tipo de reformas de mercado terá um impacto “cinco vezes maior” no PIB, nos cinco da periferia, do que as reformas laborais.

Exportações e poupança privada em dúvida

O modelo não inclui nas suas variáveis a possibilidade de melhoria do custo de financiamento da dívida na periferia, ou seja de queda do prémio de risco. Se isso acontecer terá impacto positivo na sustentabilidade orçamental. O modelo tem por base dois cenários de consolidação orçamental, um de compressão do rendimento das famílias através da redução de transferências, e outro “misto”, mais complexo.

O modelo considera, ainda, que as reformas estruturais acabam por “reduzir a contribuição líquida das exportações” (por efeito das importações para o investimento) e que, apesar do aumento da poupança pública, “a poupança privada não é suficiente para financiar plenamente o aumento de investimento resultante das reformas estruturais”.

Jorge Nascimento Rodrigues (Rede Expresso)

- Publicidade -

Deixe um comentário

+Notícias

Exclusivos

Deixe um comentário

Por favor digite o seu comentário!
Por favor, digite o seu nome

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.