Ser Festa ou Festival

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Não acredito que António Costa desconheça as características da Festa do Avante a ponto de a remeter para a inócua categoria de “atividade política”. Nem os comunistas estariam à espera de tão inusitada boleia e logo se apressaram a classificar o seu maior evento como um não-festival. E a puxarem pelos galões, autoelogiando-se como “imaginativos”, dando a entender que têm o exclusivo desse predicado. Como se religiosos, clubes de futebol, organizadores de congressos profissionais e até promotores do Rock In Rio não se pudessem gabar de ser detentores de tal atributo. 

No que respeita a aglomerações de gente, qualquer observador com um mínimo de bom-senso não distingue as características do evento de setembro no Seixal de festivais como o de Roberta Medina no Parque da Bela Vista, ou o NOS Alive, ou o Festival de Paredes de Coura, ou o algarvio Festival F. A não ser numa coisa, que conspira contra o enquadramento do primeiro-ministro: a maior parte dos eventos musicais de verão são mais pequeninos, e portanto menos potencialmente perigosos, do que a festa promovida pelos comunistas. A Festa do Avante é, em potência, uma das maiores incubadoras nacionais do “vírus chinês”.

Confesso que há uns bons 25 anos que lá não vou (ainda fui duas ou três vezes, ainda ao Alto da Ajuda), mas sei que tem vários palcos e magotes de espetadores à frente deles. E sei que o Palco 25 de Abril se abre para um mar de gente. E sei o que é a livraria, os anfiteatros, os pavilhões as barraquinhas de petiscos da Festa, onde se acotovelam velhos camaradas.

Não, não há comparação qualitativa entre o latente perigo epidemiológico da festa comunista e o do Festival de Paredes de Coura, ou mesmo a Festa da Sardinha, ou o inofensivo Festival F: a diferença é quantitativa. A festa dos comunistas é semelhante em tudo menos no tamanho. É maior e atrai mais gente. Do ponto de vista patológico, é mais arriscada e porventura até mortal. 

E compreende-se a revolta latente dos organizadores de festivais, perante a possibilidade de os comunistas terem a sua festa. Não porque eles defendam que haja festas, festinhas e festivais, mas pelo que a fresta aberta por Costa representa de injustiça perante tantos eventos, alguns minúsculos, cancelados por esse País fora.

Já assisti (na verdade assisto quase todos os anos) às mais variadas campanhas contra a Festa do Avante, por parte dos seus detratores, dos inimigos da causa comunista, ou dos simples invejosos de outros partidos que nunca hão-de conseguir organizar algo semelhante, nem fisicamente nem, sobretudo, em alma. Ele é o IMI da Quinta da Atalaia que não é pago, ele é o IVA dos comes e bebes que fica nos cofres do Hotel Vitória, ele são os negócios dos terrenos da Amora, ele é a agressão homofóbica que lá terá acontecido uma vez sem exemplo…

Agora, pela primeira vez me vejo do lado “do inimigo”, embora obviamente, consciente de que, a reboque das críticas justas, chegam os “haters” do costume, os adversários políticos e a esses não me atrelo. Não, este ano há, verdadeiramente, uma razão de saúde pública que deve fazer ressoar as campainhas até do comunista mais retinto. Não é uma questão política, é sanitária, ir avante com o Avante é um terrível perigo público. 

Reduzir tudo a uma questão política, mais não é do que imitar Bolsonaro, que politiza a pandemia e ladra que por trás do confinamento imposto pelos governadores do Rio e de São Paulo há pretensões eleitorais para as presidenciais de 2022. Não me obriguem a vir para a rua dizer que os extremos se tocam, que eu não vejo o PCP como “um extremo”.

Mas também não me venham dizer que na festa de setembro é possível dispor os espectadores em formatura tipo parada militar como no 1º de Maio da Alameda, ou que vai ficar tudo aos montinhos, como será na praia esta época balnear. Ou que vão pôr um semáforo! Reitero: a Festa do Avante é mais perigosa do que a maioria dos festivais de música.

Está a tornar-se mais endémica do que o Coronavírus se tornará um dia esta mania de Costa se antecipar ao direito, à justiça, às autoridades sanitárias, para agradar aos seus antigos companheiros de Geringonça. A “atividade política” não é menos perigosa que um festival de verão nem há diferença substancial entre o gigantesco anfiteatro do palco 25 de Abril na Atalaia e o palco NOS, em Algés. E ao aligeirar a questão como o fez, o primeiro-ministro correu o risco de desacreditar toda a excelente caminhada que desenvolveu nos últimos meses pela saúde pública e pela atenuação dos efeitos da pandemia no País.

Infelizmente, parece não ter aprendido com o erro: a polémica em torno do Novo Banco é prova disso. Desta vez fez depender um compromisso do Estado da conclusão de uma auditoria. Para agradar a Catarina Martins, com pedido de desculpas e tudo.

João Prudêncio

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