SMS 897: Algarve, a Operação Marquês cá em baixo

A última cena da Operação Marquês aconteceu no Campus da Justiça em Lisboa, no passado dia 9 de abril. Passou-se longe, a quase três centenas de quilómetros, mas nada de mais perto se pode imaginar. O que por lá aconteceu não foi só nacional, foi regional, local, e pode dizer-se, também, que foi profundamente pessoal porque tocou fundo em cada um de nós, portugueses, e se ainda não nos transformou vai transformar-nos.

As razões são sabidas. O que aconteceu com o antigo Primeiro Ministro português veio pôr em causa não só a imagem de uma figura invulgar, como ele mesmo se tornou o símbolo de todo um sistema que mostra ter o coração corrompido, ainda que bata acelerado debaixo de uma vestimenta legalmente invisível fora do alcance da demonstração legal. Com o desencadear da Operação Marquês, José Sócrates e alguns dos seus tornaram-se, ao longo de vários anos, os rostos visíveis de um esquema de enriquecimento próprio de homens das Arábias, em contrate com a crise e o empobrecimento que ao mesmo tempo nós todos íamos vivendo.

Assim, no dia 9 de abril, julgávamos que pelo menos alguém iria ser encaminhado para um julgamento que se justificaria por isso mesmo – corrupção e fraude. As várias peças do processo que nos foram sendo mostradas ao longo de seis anos, embora indevidamente, traziam consigo marcas visíveis de negócios escandalosos e das trapaceirices que haviam sido cometidas. Mas nesse dia ficámos a saber que o esquema está montado de tal modo que nem Sócrates, nem os seus amigos, nem qualquer outro, jamais serão levados a julgamento por semelhantes actos. Difícil de aceitar? Sim. Neste caldo gorduroso, só irão ganhar, em breve, não os democratas que desejavam um esclarecimento neutro, mas sim, os inimigos da Democracia, aqueles que irão fazer coincidir estes percalços da justiça portuguesa, em relação a um ex-primeiro, com o que dizem ser o coração do sistema.

É então que revisitamos aqueles anos que antecederam a Troika, no que ao Algarve diz respeito, e se encontram pedaços de fantasmas por toda a parte – O caso Vale de Lobo, os Hotéis de sete estrelas de Manuel Pinho, as subidas e descidas pelas escadas de câmaras por advogados sempre famosos, a permissão de construir os grandes empreendimentos nas áreas reservadas, ou o Allgarve, essa sigla que transformou durante algum tempo esta região num palco dos grandes espetáculos internacionais, os acampamentos levantaram as suas barracas de feira, e nós ficámos com os tojos e as urtigas. Manuel Pinho de Sócrates dixit.

Não é bom recordar. Mas deve-se estar de sobreaviso porque este caso do 9 de abril vai fazer sair à rua os fantasmas da acusação, e a confusão dos argumentos vai ficar instalada. Num dia do próximo outono, vai operar-se uma dura prova. Os autarcas democratas da região que se cuidem! Limpem bem as mãos por aquilo que não vos diz respeito, pelas megalomanias que não interpretaram, pelas doenças do grande poder pelo poder que nunca tiveram. E se não tiverem essa coragem e limpeza de espírito, desistam já de aventuras. Mas os sérios, não deixem que vos confundam. Este caso surgiu na pior altura, facilita que o jogo se baralhe e que as cartas sejam dadas aos eleitores de costas viradas para cima, com os verdadeiros bonecos escondidos para baixo. E não vai ser fácil, embora não haja “democracias corruptas”, tal como não há ditaduras sérias… Há corruptos e uma pergunta bíblica feita pelo profeta antigo quando Deus prometeu juízes ao povo hebreu. A pergunta foi: “E quem julga os juízes?”.

Flagrante dose: Todos os dias, uma. Ora nacional, ora local. E não há vacinas.

SMS

Carlos Albino

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