SMS: Água da boa, o que nos salva

Dizem que o que nos salva é a esperança, mas por vezes o que nos salva verdadeiramente é a beleza. Ou talvez a beleza seja o que a esperança tem de mais esperançoso. Coisas simples – Há dias em que nos salva uma poça de água onde se reflete o voo de um pássaro, há dias em que nos salva a chuva a cair no telhado, lembrando que os abismos sedentes estão a encher para alimentar a seca do Verão, e há outros dias em que nos salva o formato de uma garrafa pousada sobre a mesa.

A manhã de hoje é-me salva porque surgiu exatamente essa garrafa sobre a mesa. Saboreio um copo dela e vou ler o seu rótulo. Virá do Norte do país? Do Centro? Virá de Espanha? Será uma garrafa que vem das fontes francesas de Évian? Será uma San Pellegrino? Nada disso – A sua tampa é lilás, olho-a de frente, e leio Monchique.

Monchique? – Em tempos, há muitos anos, Monchique era apenas uma serra lilás a poente, da qual se dizia que antes de os homens terem surgido entre os animais, havia sido lava ardente de um tremendo vulcão. Que a sua montanha não era mais do que a tampa desse vulcão desde então adormecido. Mas se um dia as crianças vissem um fumozinho a sair da Fóia, deveriam fugir para o mar, pois seria sinal de que o monstro subterrâneo entraria em ebulição. A prova desse fogo residia no próprio nome das Caldas, águas quentes, águas caldo. Aliás, com o latinório dos romanos – Mons Cicus. Cicus que deu Chique mas não abandonou o significado inicial – fonte sagrada.

No entanto, o que está agora sobre a mesa é fresco, é cristalino, é puro. Substância inodora, e, no entanto, cheira bem. Insípida, e, no entanto, doce. Transparente, e no entanto, brilha. Está dentro de uma garrafa e lembra fonte, a garrafa, sem saliências, fica bem na palma da mão. Uma vez na mão, agarra-se, porque o seu cilindro é dúctil, resistente ao mesmo tempo suave, e vêem-se os dedos do outro lado. Aqui está um copo, bebo de novo, confirmo. Uma boa água, uma boa mensagem para o corpo e a para a alma, logo pela manhã. O Covid anda pela Terra inteira a devorar pessoas e riquezas, a imagem de Trump está por todo o lado a excrementar a decência, a dissidência forjada e de sórdidos cálculos entre partidos é uma tragédia, mas se bebo esta água, vai correr bem o dia. Que bom que exista no Algarve, uma serra chamada Monchique, de dorso lilás, que envia para a nossa mesa esta garrafa logo pela manhã, para nos alegrar a vida.

Flagrante aberração: Os que, em política e por cultura, cavam a sua própria sepultura. Até rima, mas entende-se.

Carlos Albino

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