SMS: Hospital Central. A hora crítica

As populações do Algarve têm razões sobejas para estarem ressentidas. Existe um contraste gritante entre a força criativa e laboriosa da região e a atenção que os sucessivos governos da Democracia nos têm dispensado. Em certas situações, esse desprezo tem sido tão grosseiro que chega a ser chocante. O mais recente episódio aconteceu com o plano gigantesco traçado para a exploração de petróleo no Algarve, o que custou vários dissabores, embora no final tenha ganho a pertinência de uns quantos grupos que não desarmaram. Claro que o governo de Portugal contava com a nossa proverbial mansidão, a nossa desinteligência, a nossa rivalidade paroquial, a nossa luta intestina entre as formações partidárias que colocam a cor política do seu fato místico acima do interesse comum. Mais grave ainda – acima do bem comum.

Em relação ao tal Hospital Central – ou o que se lhe queira chamar mas tenha essa mesma função – claro que a situação volta-se a colocar. Infelizmente, neste caso, não há grupos ecológicos e individualidades irritadas que façam manifestações e exijam no plano da saúde o respeito que nos é devido. E é pena. Numa população iô-iô, que no Verão passa de meio milhão para milhão e meio, o que se observa nos hospitais do Algarve fica a nível do Burundi. Não admira que os médicos não queiram permanecer, que os jovens médicos e enfermeiros não desejem estagiar, nem ficar por cá e eu alguns poucos sabidos não se sintam desvanecidos pelos serviços privados que têm clientela assegurada na lógica do salve-se quem puder. Os residentes e os visitantes não têm confiança nos serviços públicos de saúde da região. Não podem ter. A situação actual se não é de calamidade, é de rotura. Não é preciso partir a perna, basta uma disenteria para se compreender que não funciona. Se a rotura é intencionalmente provocada, a isso chama-se perversão. A situação é de tal modo gritante que não se imagina que o próximo governo não se veja na obrigação de quebrar este feitiço. O problema é que entre nós, agora que discutimos a localização e a concepção dessa futura unidade hospitalar, entrámos no momento crítico.

É pois a hora de se analisar a situação com cabeça fria e sentido de partilha. As soluções, num caso destes, têm de partir de uma visão eminentemente técnica que tenha a ver com o peso distribuído da população ao longo da região, os recursos naturais e humanos, as vias de acesso e condições de mobilidade, a geografia diversificada da zona, os recursos disponíveis, e as valências concretas das unidades hospitalares existentes. Será uma pena se num caso destes, os decisores locais se envolverem em desavenças que tenham por base os interesses exclusivos dos votos da sua rua, a dimensão das suas próprias enxaquecas, os interesses privados dos seus primos, as rivalidades das bandeiras políticas. Que a discussão possa ser acesa, sim. Mas que as manobras tão cheguem ao ponto de dar argumentos àqueles que dizem que os algarvios não se entendem, que para contentar as várias facções, ter-se-á de construir um Hospital acima das nuvens. Para que tudo continue na mesma.

Flagrante anedota: Aquela imagem de calendário que serve de alerta para as cooperativas, com dois burros a puxarem cada um pela extremidade da corda, também serve para o calendário regional.

Carlos Albino

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