Um exemplo e uma fé

Quando passam (alguma, muita) a publicidade do Euromilhões sinto um desconforto, que não é estômago nem fígado, mas antes a ideia que esta malta das apostas (ou a empresa que trabalha a sua publicidade), acaba por fazer a publicidade mais fácil do mundo: os putativos milhões são sempre distribuídos por alguém do interior (Cinfães é o último exemplo) ou do litoral a fazer que é do interior. Não vejam estas humildes páginas do Avarias como pontas de lança de qualquer forma de indignação; devo ser eu que estou a fazer uma tempestade num copo de água, mas olho esta maneira de dizer as coisas como um resquício daquela velha ordem mental tuga, que reafirma: “Portugal é Lisboa e o resto é paisagem”.

Provavelmente estarei a esquecer outros alvos até agora escolhidos, mas a ideia que fica é a de alguém que faz uma loucura com os sessenta milhões abichados, vive a cem quilómetros do litoral, diz ealma em vez de alma, pronuncia xexenta quando devia dizer sessenta e não é, apesar disso, repórter da CMTV. Não me vejam escondido dentro de uma trincheira a fazer contas de género, cor, sexo ou proveniência social (no caso vertente); a santa Casa da Misericórdia tem o direito de contratar quem quiser para lhe fazer a publicidade – que grande parte das vezes é muito engraçada, mas só queria deixar o meu testemunho.

As televisões fazem, pacificamente, o mesmo, o que já acontecia com a Liga dos Últimos e mais recentemente com o Canal 11. Vai-se falar com os adeptos da – como se diz em Lisboa – província, mas sempre de uma forma indulgente, como a lembrar ao mundo civilizado que há vida para além de Almada, Vila Franca de Xira e Vila Nova de Gaia. “Então ti Manel como vai isso por cá? Costumam ser sempre assim, tão divertidos? E as cachopas alinham nas brincadeiras na tasca? Se não fosse ter emprego na Federação mudava-me para cá”. A mim parece-me o princípio do parque temático, olhem que engraçados até sabem articular uma ou outra palavra, mas quando se embebedam é que são estrondosamente pitorescos. Se estiver redondamente enganado, paciência, pois a verdade é que não é Cavaco Silva quem quer.


A grande polémica do momento é a do PCP ter faltado à sessão em que o presidente Zelensky discursou. Não sei do que estavam à espera: lembro-vos que na durante a Segunda Guerra Mundial e durante o tempo em que a URSS manteve o pacto de não-agressão (e de mais alguns trocados) com a Alemanha, os comunistas ocidentais foram mudos e surdos perante a agressão nazi e juravam que os nazis eram, quase, do melhor que havia. Só viraram o bico ao prego, quando Hitler invadiu a Rússia. A questão é que muita água passou por debaixo das pontes, muitos comunistas renegaram o regime e saíram (alguns levaram uma vida a perceber. Parece-me normal, atendendo à norma), outros foram perdendo a fé – porque é disso que se trata. Agora foi com a Ucrânia, amanhã será com outro país. Até que tenha morrido o último militante.

Fernando Proença

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