Vou falar na primeira pessoa do singular, desculpem. Possivelmente com toda a justeza, fazem-me observações de que ultimamente está prosa está a ficar azeda, que não sai do pessimismo e da descrença, que não aplaudo quem é aplaudido, que, que e que… ah! e que sou “louletano”. Claro que para os desta última observação, vergo-me não sendo desconhecida a autodefinição que invoco sem qualquer pretensão – louletano de nascimento, mortal em qualquer lugar. Dito isto, concordo com todos outros reparos. Azedo? Azedo sim. Pessimista? É verdade, estão a passar 50 anos sobre 1974 e, como se se canta na canção do rio Mira – o Rio Mira vai cheio e o barco não anda, tenho o meu amor lá no outro lado. Além disso, para não fugir aos reparos da descrença e da apatia face aos aplausos de 2022, descrente e sem força ou vontade para bater palmas? Também é verdade, estou como o outro – ver para crer. E quanto às palmas, claro que qualquer passarinho que se contenta com o modesto ninho onde nasceu, canta melhor que os passarões que andam de árvore alta em árvore cada vez mais alta, até perderem de vista a terra natal que de vez em quando invocam, mas em vão.
E desculpem-me, continuando na primeira pessoa, devo dizer que sou indiferente a que o Algarve tenha sido reino sem rei ou que tenha algum tido algum rei sem reino, como azedume me causa chamar-se região ao baralho de 16 cartas insuficiente para um jogo da sueca a sério, como ainda em descrente e apático para aplausos me converto quando se verifica que afinal o Regulamento de Disciplina Militar do início do século passado determinava premonitoriamente que os mancebos algarvios apenas poderiam servir como cozinheiros e corneteiros.
E assim se chegou ao uso e abuso da palavra cidadania que é o pau de dois bicos nos tempos que correm. Dá para tudo. É cidadania calar e andar calado. É cidadania impor silêncio e acatar chantageando-se os passarinhos pelos passarões colocados nos becos municipais, sendo ainda cidadania traçar e manter becos onde há 50 anos se sonhava, em bem, com o delinear-se e construir-se as avenidas largas da Crítica, da Participação e do Desenvolvimento.
Temos elites, pelo menos 16, umas mais outras menos. Não temos escol. Desculpem.
Flagrante cálculo: Daqui a 97 anos tudo isso se concretizará. E o que não for inaugurado com a primeira pedra, será com a segunda decorridos outros 54 anos.