VAI ANDANDO QUE ESTOU CHEGANDO

Aos noventa anos morreu um dos maiores revolucionários do século XX e com ele também a imagem da última revolução deste século. Outros o acompanharam e tornaram-se ícones para gerações, sendo o mais referenciado Che Guevara. Camilo foi morto pouco depois, num atentado aéreo, dos múltiplos dirigidos ao longo de décadas a Fidel. Falo de revolução e das decisões e sociedades que se seguiram à tomada do poder. Não comparável portanto ao nosso 25 de Abril, quer no tempo quer no modo. Mas a revolução cubana inspirou outros movimentos contra ditaduras no continente sul-americano, sendo o mais referenciado o ocorrido na Bolívia sobretudo porque deu origem à morte de Che Guevara, a comprovar que não basta a disponibilidade generosa de um revolucionário para que a revolução aconteça.

A convite generoso de um amigo de sempre visitei Cuba, pela primeira vez, numa viagem de cerca de um mês, no início da década de noventa. Era muita a curiosidade que nos movia, tanto mais que o País estava ajustando-se, sem mudar de regime, ao colapso da União Soviética e do chamado campo socialista do qual, até então, dependia em muito a economia cubana, desde o fornecimento de petróleo à compra de toda a sua produção açucareira a preços mais generosos que os praticados pela generalidade do mercado. Enfrentando as consequências do bloqueio económico decretado pelos Estados Unidos, bloqueio que veio a perdurar durante décadas e com tal decisão, ao qual só isoladamente e desde início o Canadá não se associou, coube-lhe enfrentar dificuldades económicas maiores para um pequeno País do Caribe. Curioso é que, passadas longas décadas, o seu prestígio neste continente se tenha mantido, ao ponto do processo negocial que envolveu o governo colombiano e os dirigentes da guerrilha, tenha sido possível ter sido firmado em Cuba.

A viagem foi de Havana a Santiago e daí até à Serra Maestra, num longo percurso com pequenas paragens em Ciem Fuegos, Camaguey, Santo Espirito e finalmente Santiago. Fomos orientados por uma estrutura associativa que aglutinava pintores, escultores, escritores, o que nos permitiu conhecer gente, alguns dos quais, continuam no nosso leque de amigos, tendo sido possível, após o nosso regresso, organizarmos exposições em vários locais do país, como igualmente por decisão na altura do município de Faro, construir algumas peças escultóricas que embelezam ainda hoje alguns locais e praças da cidade.

Voltei a Cuba uma mão cheia de vezes, a maior parte delas, assessorando empresários portugueses com vontade e disponibilidade financeira para investir em grandes projectos relacionados com a indústria turística, caminho que não se revelou fácil num país, dei-me conta disso, em que a burocracia e o centralismo das decisões, não estavam conformes às sua necessidades de desenvolvimento. Não me dei conta de forma directa de sinais de corrupção, da mesma forma que não encontrei respostas para decisões tão desencontradas tomadas pelos vários círculos do poder, que acabaram por inviabilizar o interesse dos investidores.

Ao cabo de algumas das viagens como assessor fui dando-me conta que os estratos populacionais que de alguma forma tinham relações com a actividade turística vivam melhor. A exemplo recordo o relato de um casal de arquitectos com ele a tomar a decisão de deixar de exercer a profissão, trocando-a por condutor de táxi. Continuando o País a manter um alto nível de escolaridade e de especialização em várias áreas, dado o facto da economia não os absorver, conduziu a que a exportação de técnicos se revelasse mais rentável que a de charutos.

Com a morte de Fidel não prevejo que, só por si, conduza a grandes mudanças de regime alterações, algumas das quais, estão em curso tais como a da normalização das relações com os EUA. Por sua vez Raul anunciou a sua retirada em 2018. Acredito que se assim fôr se poderão criar condições de liberdade política, de encerramento do ciclo de partido único e da abertura de caminhos que para além do turismo promovam um novo ciclo de desenvolvimento económico.

Carlos Figueira

 

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