Vai Andando Que Estou Chegando

Carlos Figueira
Carlos Figueira
Foi membro do Comité Central e da Comissão Politica do PCP até ao XVI Congresso. Expulso do Partido em Setembro de 2002, num processo que envolveu Edgar Correia e Carlos Brito. É membro da Refundação Comunista. Saiu do país clandestinamente em Agosto de 1964, foi aluno da Universidade Livre de Bruxelas em Ciências Políticas e Sociais e mais tarde no Instituto de Ciências Sociais e Políticas de Moscovo. Atualmente é consultor de empresas, escritor e cronista regular na imprensa regional e nacional.

Estamos a viver num ambiente político confuso, com excessivo dramatismo, sobretudo tendo em vista a aprovação ou não do próximo OE por parte do PCP e do Bloco já que toda a direita se demarcou do mesmo anunciando o voto contra.

Todo este predominante ambiente contrasta com a forma como o País enfrentou ano e meio de pandemia acudindo o Governo com vultuosas verbas em apoio a empresas, salários e reforço de apoios sociais, cujas repercussões se fizeram, e ainda se fazem sentir, nos resultados da economia do País. Mas chegamos aqui com mais de 85% da população vacinada, número que Países mais ricos não chegaram ainda a atingir. Singularmente, comentarista vários, predominantemente de direita, dirigentes políticos e associativos, para todos eles, a palavra pandemia deixou de ser usada, como se não tivesse existido, com as consequências que todos nós, de uma maneira ou de outra, enfrentamos e sofremos.

Todavia é em torno do OE/22 que se atinge o máximo do dramatismo. De facto se o documento não for aprovado na generalidade, de acordo com o Presidente da República, usando os poderes constitucionais, dissolverá de imediato a Assembleia da República marcando novas eleições a realizar previsivelmente em Janeiro próximo. O que significará entrarmos num ciclo de governação por duodécimos, impedidos de utilizar os dinheiros da Bazuca até finais deste processo o que pode ocorrer em Maio ou Junho do próximo ano. Tempo e modo contrário ao que se previa, ou seja, um forte impulso na economia e um reforço nos apoios sociais e em particular no SNS.

A acompanhar os tempos de iminente crise em que podemos mergulhar, somam-se a presença de um rol de comentários, na sua generalidade, apontando para a inevitabilidade, em particular quanto à posição a assumir pelo PCP, de votar contra este OE. Comentários, notícias, dos quais destaco o de Rosa Pereira Lima no último Expresso, fundada na opinião de sete comunistas, dos quais a não ser a do colonista do DN, não se sabe quem são e o que representam no universo do PCP, uma vez consultados sobre tal matéria, a acreditar no que a jornalista refere, a defender, que estaria criado o momento para abandonar acordos com o PS, por que tal postura favoreceria o esvaziamento da sua base eleitoral.

Ora, convém lembrar, que antes da chamada “Geringonça” já o PCP perdia em todas as eleições, quer para a AR quer nas consecutivas eleições autárquicas, a sua influência na sociedade. É necessário ter presente que a APU e posteriormente a CDU chegou a gerir cerca de 50 Câmaras (no Algarve em circunstâncias e momentos diversos obteve a maioria em três municípios) e hoje dispõe no plano nacional pouco mais de meia dúzia e um reduzido grupo parlamentar.

Portanto, trata-se de um decréscimo acentuado a partir de finais da década de oitenta fruto de uma orientação política que conduziu o Partido para o seu isolamento na sociedade, a quem era suposto dirigir-se, assente numa política sectária, centralista, condicionadora da opinião dos seus militantes, tendente a ocupar um lugar de simples Partido de protesto, não se dando, por ventura conta, das mudanças sociais que entretanto ocorriam na sociedade, sem se distinguir, no plano internacional, das razões que estiveram na origem da derrocada no Leste Europeu. O que o eleitorado e a militância não compreenderão porque se trata do senso comum, é o PCP a fazer acordos com o PS e no dia seguinte associar no plano político o PS com toda a direita. Simplificar, separar efeitos de conjuntura, ignorando as razões de fundo é deformar a história, é produto de mau jornalismo, em nada de surpreendente nos dias que ocorrem e daí não constituir surpresa que na abordagem do tema, no Público do último domingo, Ana Sá Lopes classifique este PS, que dirige o governo, como um partido de centro direita, quando estamos em presença de um governo mais à esquerda desde há longos anos.

Quanto ao Bloco, de forma contraditória, com na sua legítima aspiração a ter um lugar em próximo governo, é necessário não esquecer a erosão eleitoral que de seguida teve lugar em consequência do voto contra o último Orçamento.

No momento particular em que nos encontramos o País não perceberia o chumbo do OE por parte da esquerda, se assim for, o preço a pagar será avultado não excluindo responsabilidades do próprio PS.

Por muito que esteja presente, no plano político, a desvalorização dos ganhos obtidos para viabilizar a manutenção do Governo, não será demais reflectir que a oferta política da direita está alicerçada no mais violento liberalismo no qual para além de privatizações de tudo o que é representado pelo Estado, significará cortes em direitos e apoios sociais.

Carlos Figueira

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