A Associação Terras do Baixo Guadiana surgiu através de uma parceria para apresentar uma candidatura ao Programa de Iniciativa Comunitária LEADER+ e pela constituição desta entidade pela Associação de Defesa do Património de Mértola (ADPM), Associação para o Desenvolvimento do Baixo Guadiana (Odiana) e pela Associação para o Desenvolvimento do Nordeste Algarvio (ALCANCE), oficialmente em 18 outubro de 2001.
Após a criação da Associação Terras do Baixo Guadiana, seguiu-se a elaboração de uma Estratégia de Desenvolvimento Local para um território que abrange cinco concelhos (Vila Real de Santo António, Castro Marim, Tavira, Alcoutim e Mértola) e duas regiões (Algarve e Alentejo).
A Associação Terras do Baixo Guadiana gere programas através dos fundos comunitários e de um modelo de financiamento multifundos e multifuncional, com sistemas de incentivos a várias áreas como o empreendedorismo e o emprego, direcionados a empresas e outras entidades.
Ao longo destes 20 anos, a Associação Terras do Baixo Guadiana fez a gestão dos fundos e financiamentos que foram aplicados em empresas e produtos regionais como o sal, mel, plantas aromáticas e medicinais, produtos naturais espontâneos, produtos agro-alimentares, na criação de gado, na caça, na pesca, no turismo de natureza e em espaço rural, restauração e artesanato.
Ricardo Bernardino, de 46 anos, é o diretor executivo da Associação Terras do Baixo Guadiana e explicou ao JA que esta entidade dá “apoio, orientação e acompanhamento às candidaturas e aos projetos, que seguem para um órgão de gestão superior que aprova ou não”.
Os trabalhos feitos nos últimos 20 anos têm vindo a demonstrar bons resultados, uma vez que “este tipo de projetos funciona muito através do efeito demonstrativo” e têm “uma taxa de mortalidade muito pequena”.
“Há 20 anos não havia quase turismos rurais neste território e muitos dos que existem agora, passaram pela nossa gestão”, salienta.
A associação gere também o programa PADRE, sendo responsável pela temática do turismo ativo em toda a região algarvia, ou seja, todos os projetos que as câmaras municipais queiram fazer, passam pela entidade.
Um dos projetos que atualmente a associação está a desenvolver é um guia de observação de aves para todo o Algarve, em formato de livro de bolso.
A proximidade com a comunidade
Com sede no Centro de Apoio ao Desenvolvimento de Alcoutim, com vista para o rio Guadiana, a Associação Terras do Baixo Guadiana veio aproximar-se do território e das pessoas do sotavento, uma vez que esta área era anteriormente abrangida pela associação In Loco.
“Um dos objetivos é a proximidade com as pessoas e a In Loco, ao estar tão longe, não conseguia garantir esse trabalho. Daí surgiu a necessidade das entidades do sotavento começarem a discutir a criação desta associação”, explica o diretor natural de Mértola e residente em Vila Real de Santo António ao JA.
Sendo a única entidade que faz a ponte entre duas regiões administrativas diferentes, Ricardo Bernardino refere que “os projetos deste território são aprovados neste território por entidades deste território”.
“O nosso esforço diário nesta casa é ajudar as pessoas que querem fazer projetos, arranjar soluções dentro do possível e dando esse contributo para combater a desertificação. Nós, ao apoiarmos empresas vamos criar postos de trabalho e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Ao longo destes 20 anos temos criado dezenas de postos de trabalho, que são resultados destes projetos financiados com a gestão da nossa entidade”, explica.
O diretor executivo garante ao JA que “o dinheiro tem sido bem dividido pelo território”, mas Alcoutim “é o concelho que tem o maior número de projetos aprovados”.
“Temos sempre conseguido aplicar todas as verbas, apesar de trabalharmos num território muito complicado e com poucas pessoas, vamos conseguindo gastar as verbas que vão sendo postas à nossa disposição”, conta.
Nestes 20 anos, a associação já geriu projetos como o barco que faz a passagem para Sanlúcar del Guadiana, em Espanha, de três dos quatro restaurantes que funcionam em Alcoutim e ainda outros três turismos rurais daquele concelho.
“Isto é o resultado, a marca, o selo e a importância que esta associação tem. Eu costumo dizer que se o território continua a ficar desertificado e despovoado com este contributo, o que seria se a associação não existisse”, confessa.
Regresso às origens
Ricardo Bernardino destaca que “continuam a haver pessoas persistentes e resilientes a querer apostar na sua terra e nos negócios locais” e que “já se nota um movimento e fluxo de pessoas a querer voltar e a querer aproveitar as terras que eram das suas famílias, muitas delas abandonadas”.
“Há muitas pessoas entre os 60 e os 70 anos nestes projetos, mas começaram a aparecer jovens, como os netos dessas pessoas, que têm propriedades de família e alguns estão até a pensar em regressar à terra e aproveitar essas pequenas parcelas de terreno para amendoeiras, medronheiros e apicultura, muitas vezes complementando este tipo de rendimento com o alojamento local ou o turismo rural”, refere.
Para o diretor executivo, este “é um casamento feliz” entre o alojamento e as pequenas atividades agrícolas, uma vez que “viver só das parcelas de quatro ou cinco hectares não é fácil”.
Segundo Ricardo Bernardino, as taxas de ocupação dos turismos rurais deste território “não sentiram muito a pandemia de covid-19”, uma vez que as pessoas decidiram não viajar para o estrangeiro e vir para o interior, onde estavam mais isoladas.
“Alguns turismos rurais até melhoraram as taxas de ocupação relativamente a anos anteriores”, destaca.
Outro facto curioso revelado ao JA é que “os investimentos que antes eram feitos no turismo, agora estão a passar para a área da agricultura”.
“As pessoas investem também pelas oportunidades que aparecem, porque os terrenos no interior são mais baratos do que no litoral”, explica.
Atualmente, a associação está a ter muitas candidaturas na área da agricultura, como a sua vertente biológica.
“Nestes últimos cinco ou seis anos, na zona da serra algarvia, tivemos muitas candidaturas para exploração agrícola. Começámos com muitos projetos de medronheiros, que agora estão a passar para a alfarroba. Também já apoiamos projetos de amendoeiras, abacates na zona litoral e apicultura de uma forma mais profissionalizada”, refere Ricardo Bernardino.
O futuro
Para o futuro, a associação está a trabalhar num novo projeto em parceria com a Direção Regional de Agricultura do Algarve e a Universidade do Algarve com foco na alimentação sustentável e equilibrada, além de outro projeto que pretende criar uma rede de produtores regional para “dar apoio aos produtores e convertê-los para uma plantação biológica, modernizando também as técnicas”.
No próximo mês de maio, a associação vai abrir os últimos avisos, sendo a última oportunidade no âmbito do PDR de se candidataram a apoios.
No entanto, na opinião do diretor, esta ajuda tem de ser complementada com outros fatores necessários neste território.
“Este é um dos territórios mais complicados, porque é muito desertificado. Os nossos governantes ainda não olharam para este sítio com olhos de ver. Tem de haver um programa de discriminação positiva já, não é daqui a 20 anos, porque quantas menos pessoas deixam de existir por aqui, mais serviços e comércios vão embora”, explica.
Para Ricardo Bernardino, Alcoutim “corre atualmente um grande risco de se tornar numa aldeia e de eventualmente ser englobado noutro concelho, uma vez que tem pouco mais de dois mil habitantes. É dramático”.
Com o objetivo de inverter a desertificação e o despovoamento, o diretor considera que “mediante estes projetos conseguimos travá-la, mas não conseguimos resolvê-la”, pois o Algarve tem a “atração para o litoral”.
Em relação à futura ponte de Alcoutim, o concelho “pode vir a beneficiar, porque temos uma boa gastronomia e preços acessíveis para o poder de compra espanhol, contribuindo assim para a economia destes territórios.
No entanto, o diretor relembra que “não nos podemos esquecer que, além da ponte, precisamos de acessos à IC27”, pois “se não houver estruturas e facilidades de comunicação, as empresas não se instalam”.
Outro aspecto fundamental nos dias de hoje é “um bom investimento na cobertura de internet e de telefone”, pois “atualmente um pequeno negócio não consegue ter sucesso se não tiver internet ou rede”.
A falta de um hospital “médio” na zona do sotavento algarvio, segundo o diretor da associação, também afeta a atração por este território, uma vez que “muitas pessoas saíram daqui, com problemas de saúde, porque têm medo de estar longe dos hospitais”.
“O caminho e apostar nas potencialidades do território”, conclui.
Gonçalo Dourado