"Do Algarve Que Temos à Região que Queremos"

No 66.º aniversário abrimos o debate e desafiámos algumas personalidades algarvias de vários setores e idades, para se pronunciarem sobre o muito que foi feito, mas também  sobre as estratégias e liderança que, em seu entender, conduzirão a um Algarve cada vez melhor

O Algarve visto por Isilda Gomes

1 – O JORNAL do ALGARVE tem orientado o seu trabalho, desde a sua fundação, com um objetivo muito marcado pelo desenvolvimento sustentado da região. Passados estes 66 anos de luta, como vê e sente o Algarve? Que avaliação faz do Algarve que temos? Quais são os seus principais problemas?
Isilda Gomes
– O Algarve foi uma das regiões portuguesas que sofreu maiores e mais profundas alterações, e num curto espaço de tempo. A descoberta das nossas potencialidades turísticas levou a uma alteração tão profunda no nosso tecido económico e produtivo, que teve consequências a nível sociológico, que podemos mesmo falar de uma revolução. Eu vejo o Algarve como um sonho eternamente inacabado. Cada avanço que conseguimos, cada melhoria que promovemos é sempre mais lenta que a mudança da nossa sociedade e que as necessidades que essas mudanças trazem. Somos uma região com uma população fixa apenas ao nível de um concelho da Área Metropolitana de Lisboa, mas sazonalmente a nossa população multiplica por três ou por quatro. Isso cria uma pressão excessiva sobre as nossas infraestruturas viárias, sociais, de saúde, de saneamento, etc, que não estamos preparados para gerir. O facto de sermos uma região eminentemente turística coloca o nosso parque habitacional sob elevadíssima procura, exponenciando os preços e tornando virtualmente impossível a aquisição ou arrendamento de casa para os algarvios, ou os profissionais especializados que assim evitam vir para o Algarve, como profissionais de saúde, professores, funcionários judiciais ou das forças de segurança, o que tem efeitos nefastos no funcionamento de áreas fundamentais como a saúde, a educação e a justiça.

2 – A liderança que temos tido e os representantes políticos, quer autárquicos, quer deputados, têm defendido e lutado o suficiente por esta região?
IG
– Eu acredito que os representantes políticos têm tentado dar o seu melhor, a questão é que nem sempre o fazem em nome da região. Todos sabemos que o combate político democrático se faz em partidos políticos e esses partidos vivem, felizmente, num clima de constante competição pela adesão do eleitorado aos seus programas. Isto é saudável. O que já não é saudável para a região é quando as lealdades partidárias se sobrepõem à necessidade de defender o melhor para o Algarve. Quando temos representantes políticos que, num governo liderado pelo seu partido, responderam com silêncio ao mais assanhado ataque de sempre contra o SNS na região, e quando outro governo liderado por outro partido tenta suprir as necessidades extremas que foram criadas até abaixo assinados com viagens oferecidas fazem, a saudável competição política é transformada numa chicana.

3 – Para que haja desenvolvimento, tem que haver uma estratégia. Que estratégia preconiza para a região?
IG
– A estratégia que preconizo para o Algarve é uma estratégia que, a caminho do futuro, tem algumas paragens obrigatórias. A primeira é a habitação. Temos que apoiar os planos municipais de habitação para voltar a construir e lançar no mercado a quantidade de imóveis suficiente para nivelar por baixo os preços praticados. A segunda é o conhecimento. A nossa Universidade já é referência nacional e internacional. Temos que aumentar o leque da nossa oferta formativa, atrair mais estudantes, nacionais e estrangeiros, atrair mais mestrandos e doutorandos, fazer do Algarve uma região reconhecida internacionalmente no campo universitário, científico e tecnológico. Outra paragem é a coesão territorial. A esmagadora maioria da economia algarvia está concentrada numa curta faixa litoral da região. O barrocal e a serra têm enormíssimas potencialidades e essas zonas parecem ter sido condenadas à desertificação e ao envelhecimento. É possível e desejável um futuro diferente para toda uma área que não pode ser parente pobre dentro de uma região rica. Há finalmente uma última paragem a caminho do futuro, a do turismo. Deixei-a para o fim por ser a atividade económica fundamental da região, mas não podemos correr o risco de acreditar que tudo está bem e não deve mudar. O Algarve tem de diversificar a oferta turística. Não é crível que continuemos a viver baseados na massificação ligada ao binómio sol – praia. O Algarve tem de oferecer mais para entrar em novos mercados e tornar-se mais competitivo. O turismo de natureza nos estuários das nossas zonas húmidas, a observação de aves e mamíferos marinhos, o turismo gastronómico numa região que tem o que de melhor há em Portugal na gastronomia, o turismo rural que é possível desenvolver no barrocal e serra, o turismo de mergulho nas nossas fantásticas águas, o turismo geológico e paleontológico nas falésias e formações rochosas únicas como o granito da serra de Monchique ou as pegadas de dinossauro nas praias dos concelhos de Lagos e Vila do Bispo. São apenas alguns exemplos de como poderemos aproveitar melhor as riquíssimas potencialidades desta nossa região para atrair um leque cada vez mais diversificado de turistas.

4 – Fala-se muito em descentralização e/ou regionalização. Que tipo de liderança precisa o Algarve?
IG
– O Algarve precisa de uma regionalização efetiva. Precisa desde sempre e quando for implementada será sempre demasiado tarde em relação à sua necessidade. Ainda assim, e dado o facto de, como respondi antes, para alguns a lealdade partidária ser superior aos interesses da região, são necessários passos intermédios até atingir o nosso objetivo. Dada a constante oposição do partido mais centralista de Portugal, que é também o maior partido da oposição, estamos a apostar crescentemente numa descentralização de competências para as CCDRs, para que, a tempo, a regionalização seja apenas uma evolução natural e não a terrível revolução com que demagogicamente assustam os portugueses para que nada mude.

5 – Há “massa crítica” capaz de revolucionar o Algarve, transformando-o, efetivamente, numa região diversificada, multicultural, onde é bom trabalhar e viver, com uma boa saúde e oferta cultural para além do sol e praia?
IG
– Há. Essa massa crítica existe, tal como centenas ou milhares de tijolos existem antes de um cimento lhes dar a coerência de uma parede, ou uma casa. O Algarve tem nomes de créditos firmados em todas as áreas e sectores de atividade. O Algarve precisa de um cimento que una, que potencie e crie sinergias entra a imensa qualidade que se encontra dispersa na nossa sociedade. O Algarve precisa de se tornar, política e administrativamente, aquilo que já é intrinsecamente: uma Região ativa e dinâmica, fonte de inovação e conhecimento, aberta, integrada, solidária e multicultural, com os pés assentes no presente mas os olhos focados no futuro.

*Ex-governadora Civil, atual presidente da Câmara pelo PS

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