Feliz Natal

Nesta altura, é costume enviar a quem se gosta, desejos de Festas Felizes. Este ano é, no entanto, quase irónico formular tal desejo. O estado do Mundo e as perspectivas que se desenham são tudo menos felizes! Deflagrou no Médio Oriente uma guerra e consequente invasão da Faixa de Gaza, provocada pela retaliação do Estado de Israel a uma acção terrorista do Hamas -partido político armado palestiniano- sobre a população israelita que habita territórios usurpados aos palestinianos. Há quase dois anos que assistimos a uma guerra não formalmente declarada da Rússia à Ucrânia, com a invasão deste segundo país pelo primeiro. A apelidada “operação especial” russa parece-se tanto com uma invasão da Ucrânia quanto a “guerra contra o Hamas” se parece com uma invasão da Faixa de Gaza! As argumentações da Rússia e de Israel são semelhantes: ambos falam dos seus próprios cidadãos sequestrados ou mortos como motivo da retaliação e da liquidação dos seus agressores. No entanto, a quantidade de ucranianos e palestinianos mortos ou feitos prisioneiros parece ser escandalosamente superior aos crimes alegadamente perpetrados anteriormente, e os “danos colaterais” (leia-se “destruição de alvos civis e a existência de mortos e feridos não relacionáveis com a origem do conflito”) completamente desproporcionais.

Em todos os lados de ambos conflitos há vozes discordantes, mas quem manda é o poder, que gere autocraticamente tanto a informação sobre o conflito, como a forma como este é conduzido! Uma guerra é a liquidação da democracia em nome da verdade oficial e a liquidação dos que se entendem antagónicos. É, portanto, a substituição da discussão e da argumentação pela agressão e pelas armas. A justificação para a morte “do outro” é ele não pensar ou não concordar com o seu oponente ou, pior ainda, com o ou os mandantes do seu oponente, ou, ainda pior mas muito mais comum, serem discordantes os mandantes de ambas as partes e os beligerantes -chamados “carne para canhão”- nem sequer terem de concordar sobre o que os seus mandantes pensam!

Foi no intuito de privilegiar a discussão e o diálogo na resolução de conflitos que, logo após a Segunda Guerra Mundial, foi instituída a ONU, que tem cumprido razoavelmente, não se sabendo como estaria hoje o Mundo se ela não existisse. Contudo, a ONU só pode ter uma acção eficaz e efectiva, se for reconhecida e acatada pelas forças beligerantes. E isso, nestes dois conflitos (e, de certo modo, nos outros sete que actualmente afligem o Mundo -Burkina Faso, Somália, Sudão, Iêmen, Mianmar, Nigéria e Síria), não tem acontecido: a ONU é desrespeitada e os acordos obtidos sistematicamente violados. O conflito na Faixa de Gaza é disso flagrante símbolo, ocorrendo na terra onde tiveram origem as religiões abraâmicas que têm servido de guarda-chuva a múltiplas guerras! É na Palestina, também chamada não por acaso Judeia, que os grandes confrontos entre as diferentes religiões têm ocorrido desde há uns dois mil anos, ou mais! Contudo, judeus e palestinianos, dois povos semitas, raramente tinham sido actores principais: há cerca de 1000 anos, foram cristãos e muçulmanos que se defrontaram nas Cruzadas (que do lado muçulmano se chamou Jihad, “Guerra Santa”). Toda esta região – dos actuais Israel, Cisjordânia e Faixa de Gaza- tem uma área semelhante à Região Centro de Portugal: 28 200 km2 e hoje, o conflito é sobretudo entre ambos, pela posse da Faixa de Gaza que, no total, tem uma área equivalente aos Municípios de Alter do Chão ou de Trancoso (360 km2)!

Na verdade, que bom seria se a paz chegasse neste Natal à chamada Terra Santa e se acabasse com esta guerra que tem vindo a liquidar milhares de palestinianos, independentemente da sua filiação partidária! É evidente que condeno da operação do Hamas sobre Israel, mas a comparação entre a acção terrorista do Hamas e a sequente acção terrorista do exército israelita, em termos de violência, de destruição, de número de mortos, de feridos e (sobretudo) de deslocados, deixou de ter qualquer espécie de comparação. Espero ardentemente que este e todos os outros conflitos actualmente existentes, mas sobretudo este e a invasão da Ucrânia sejam rapidamente resolvidos, em nome da Vida! Em nome da Paz! Em nome deste martirizado planeta e sobretudo em nome dos povos que o habitam.

Desejo a todos um Feliz Natal e um 2024 mais pacífico que este ano que agora termina.

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