Governo apresenta reforma do IRC

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O Expresso antecipa as principais alterações que António Lobo Xavier apresentará sexta-feira no Ministério das Finanças relativas ao IRC e que deverão entrar em vigor em 2014.

A descida do Imposto sobre as Pessoas Coletivas (IRC) é a medida que marca a reforma da tributação das empresas. Prova disso foi a guerra entre as Finanças e a Economia sobre a paternidade da redução da taxa. É um bom cartão de visita junto dos investidores estrangeiros e ao mesmo tempo dá resposta aos apelos dentro de portas para se baixar a carga fiscal.

O Expresso teve acesso a parte do relatório produzido pela Comissão para a Reforma do IRC, liderada por António Lobo Xavier, onde é sugerida a redução progressiva, até 2018, da taxa nominal agregada do imposto, que neste momento pode atingir 31,5% (ver texto em baixo), para 19%. A intenção é colocar o IRC ao nível do “primeiro quartil da União Europeia”, refere o documento. A comissão responsável pelo novo figurino do imposto, que foi criado há 25 anos, foi constituída, em janeiro, pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio. Em seis meses, o grupo de trabalho elaborou mais de 300 páginas com propostas e respetiva fundamentação, bem como um anteprojeto de lei com medidas concretas.

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É também proposto um regime simplificado de tributação para as micro e pequenas empresas, tendo em conta que “representam a esmagadora maioria do tecido empresarial português e têm uma importância decisiva no produto interno bruto e no emprego”. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, em 2011, 84,7% das sociedades não financeiras eram microempresas, ao passo que as médias empresas representavam 2% e as grandes empresas eram apenas 0,4% do total. Este regime simplificado será opcional e as empresas que quiserem ser abrangidas terão de seguir as regras da normalização contabilística para microentidades e cumprir as obrigações legais de faturação – como a utilização de programas certificados pela Administração Tributária e a comunicação dos elementos relevantes das faturas às finanças.

Menos burocracia

Há muito reivindicada pelos empresários, a simplificação das obrigações declarativas também foi contemplada. “A redução dos custos de contexto é um dos fatores que reforçam a competitividade do sistema fiscal”, mencionam os técnicos, especificando que a prioridade deve ser a diminuição da burocracia nos preços de transferência, no Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades e no regime dos prejuízos fiscais. As obrigações acessórias devem ser substituídas pela comunicação oficiosa por parte de entidades públicas (como o Banco de Portugal) ou pelo cruzamento de dados. O que vai evitar que a informação já prestada pelas empresas tenha que ser de novo inscrita em documentos vários.

Outra novidade importante para dar fôlego ao investimento é o alargamento para 15 anos do prazo de dedução dos prejuízos fiscais. A atual lei dá apenas cinco anos e é uma das mais restritivas da União Europeia (UE). “Desconsidera o ciclo médio de recuperação do investimento em diversos sectores da atividade económica”, diz o relatório. Por exemplo, em Espanha, o prazo é de 18 anos e na Alemanha não há qualquer limite temporal, como aliás sugere a proposta de diretiva europeia sobre a base consolidada comum (que harmoniza as regras de cálculo da base tributável das empresas da UE), atualmente em discussão.

O regime de tributação das sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) é outro calcanhar de Aquiles do sistema fiscal português. Apesar de inúmeras alterações, permanece a anos luz dos sistemas em vigor em Espanha, Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Malta ou Alemanha. Aliás, o grupo de trabalho menciona isso mesmo ao assinalar que temos um dos regimes menos atrativos a nível europeu “quer nos requisitos de aplicação quer no âmbito territorial” – já que abrange participações em firmas nacionais ou europeias, ‘esquecendo’ as participações detidas fora da Europa, ou seja, não é universal. “Isto significa que, por regra, as empresas portuguesas que investem no exterior são duplamente tributadas quando, em igualdade de circunstâncias, as companhias de outros países, nomeadamente da UE, são tributadas apenas uma vez”, salienta a comissão.

A sugestão é que o regime das SGPS seja substituído pela “adoção de regras de eliminação de dupla tributação de cariz universal que sejam aplicadas a todo o investimento independentemente da região do globo onde este seja feito” – os paraísos fiscais ficam fora deste enquadramento. Além disso, as novas regras devem incidir não só sobre a distribuição de lucros e de reservas, mas também sobre as mais-valias. Porém, a comissão ressalva que para beneficiarem destas mudanças, as empresas têm de cumprir determinados requisitos: deverão ter uma participação nos direitos de voto ou no capital de outra sociedade desde que cumpridos determinados requisitos, nomeadamente a filial tem que pagar, no mínimo, 10% de imposto.

Outro aspeto prioritário para a comissão é a política fiscal internacional de Portugal, que deve ser “redefinida”. “As linhas orientadoras desta política estão desatualizadas (remontam a 2001) e mesmo essas não foram integralmente satisfeitas”, sustentam os técnicos.

Em nome da proteção das empresas que operam no mercado global, a comissão avança que é necessário, entre outras medidas, promover a renegociação das convenções para evitar a dupla tributação (tem havido um esforço para aumentar a rede deste tipo de acordos, mas muitos dos que estão em vigor já não protegem os interesses nacionais), assim como introduzir regras nos tratados em que Portugal é parte que reflitam e defendam “a competitividade do sistema fiscal resultante da reforma”.

Reforma só resulta com consenso

Até setembro, o anteprojeto de reforma do IRC vai estar em discussão pública (ver caixa ao lado) e, por várias vezes, diversos membros do Governo afirmaram a importância de haver consenso em torno desta matéria. Apelando ao envolvimento, em particular, do PS e das restantes forças políticas. O que poderá ser possível no que toca ao principal partido de oposição, que recentemente votou de forma favorável o ‘supercrédito’ fiscal, lançado em maio. As empresas que aderirem e investirem até ao final do ano podem deduzir no IRC 20% do dinheiro aplicado, até um máximo de 70% do total da coleta (o benefício é válido para investimentos até €5 milhões). Esta medida integrou um pacote fiscal que foi o pontapé de saída da reforma do IRC, onde se incluem também o IVA de caixa e o reforço de vários incentivos que já existem.

Ana Sofia Santos (Rede Expresso)
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