Os líderes dos 28 recusaram na terça-feira à noite endossar o nome de Jean-Claude Juncker, o candidato do partido mais numeroso do Parlamento Europeu (PE), para o cargo de presidente da Comissão Europeia. Não excluíram o nome do luxemburguês, mas lançaram as bases para que a escolha do sucessor de Durão Barroso seja feita na base de um lote mais vasto de possibilidades.
Os chefes de Estado e de Governo da União Europeia (UE) decidiram seguir à letra o estipulado no Tratado de Lisboa, que lhes confere poder de iniciativa nesta matéria, com uma referência vaga à necessidade de “ter em conta” os resultados das eleições de domingo.
A ausência de uma decisão já era esperada, na medida em que o jantar informal entre os chefes de Estado e de Governo da União foi convocado para apenas dois dias depois das eleições europeias, para fazer uma primeira análise das mesmas e no pressuposto de que seria “muito cedo para decidir sobre nomes”.
Mais surpreendentes foram as declarações de alguns responsáveis europeus, a começar por Angela Merkel. Apesar de ter apoiado Juncker enquanto candidato do Partido Popular Europeu (PPE), de que a CDU germânica faz parte, tal como o PSD e o CDS, a chanceler alemã sublinhou que não existe “automatismo” entre o resultado das eleições e a escolha do presidente da Comissão.
Merkel nunca foi entusiasta da nova metodologia, por considerar que a mesma é abusiva em relação ao espírito e à letra do tratado e porque reforça o poder do PE, em detrimento do Conselho Europeu. E na conferência de imprensa com que encerrou a sua participação no jantar, a chanceler expôs o seu pensamento sobre o assunto, resumindo-o assim: “Apesar de o PPE ser a principal força política e de Jean-Claude Juncker ser o nosso candidato, nenhum partido tem uma maioria sozinho, (…) por isso temos que olhar para um quadro mais vasto de opções adequadas”.
Enquanto a Alemanha parece questionar sobretudo a metodologia, outros países manifestaram-se abertamente contra a escolha de Juncker, como o Reino Unido, a Holanda, a Hungria e a Suécia. No entanto, mesmo em conjunto, estes quatro países não teriam força suficiente para bloquear a eventual nomeação de Jean-Claude Juncker, uma vez que o tratado estipula que a decisão é tomada por maioria qualifica e não por unanimidade.
Outros ainda, como o Presidente francês e o primeiro-ministro italiano, ambos socialistas, defenderam a necessidade de discutir primeiro a futura orientação política da União e apenas depois os nomes a escolher para a implementar.
Pedro Passos Coelho apoiou e diz que continua a apoiar Juncker. Embora admita que “é teoricamente possível” que a solução que venha a ser encontrada deixe de fora os nomes avançados pelo Parlamento, o primeiro-ministro português foi mesmo dos poucos manifestar-se contra tal opção, referindo que a mesma “não seria um bom sinal”. “Não creio que seja o caminho desejável”, resumiu.
A discussão mantida pelos líderes não mata a candidatura de Juncker, mas não deve deixar de ser sentida como um balde de água fria pelo ex-primeiro-ministro do Luxemburgo.
Os governos entendem que o Parlamento Europeu se pôs em bicos de pés ao querer impor um nome para a presidência da Comissão e decidiram subir a parada no que se desenha como um braço de ferro entre as duas instituições.
Herman Van Rompuy, o presidente do Conselho, foi mandatado para negociar com os novos grupos políticos que ainda se estão a constituir no Parlamento (processo que decorrerá durante o mês de junho) e para levar a cabo contactos bilaterais com os diferentes Governos, na expectativa de poder colocar uma proposta concreta em cima da mesa a tempo da próxima reunião do Conselho Europeu, agendada para os dias 26 e 27 de junho.
Uma proposta que muito provavelmente passará pela negociação de um pacote que englobe os demais postos institucionais europeus em causa, como a presidência do Conselho Europeu, o cargo de Alto Representante para a Política Externa e o de presidente permanente do Eurogrupo, tendo este último sido explicitamente referido por Angela Merkel.
Para ilustrar o processo em curso como um exemplo das vicissitudes e surpresas da vida política, Passos Coelho recordou que Juncker venceu as últimas eleições no seu país, o Luxemburgo, para ver depois os demais partidos formarem uma coligação que o deixou de fora do Governo. O futuro dirá se a história se repetirá, desta vez ao nível europeu.
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