Inteligência artificial à algarvia

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A inteligência artificial está a "invadir" o mundo e o Algarve não é exceção

É na sede da empresa, localizada em frente do antigo hospital de Loulé, que Paulo Bica e José Pedro abrem portas ao JA, numa viagem pela tecnologia do futuro.

“O potencial associado à inteligência artificial é infinito”, começa por dizer ao JA um dos proprietários da empresa SPIC, sediada naquela cidade algarvia, que começou recentemente a trabalhar nesta área que está nas bocas do mundo.

As imagens são tratadas e melhoradas frame a frame

Paulo Bica, natural de Lagoa, revela ainda que “esta será uma revolução que vai acontecer e que vai determinar uma nova fase na tecnologia e nas nossas vidas”.

“Sinceramente acredito que vá ter um impacto muito forte, ao contrário de, no passado, tecnologias como os avatares ou a questão muito debatida do metaverso, que toda a gente dizia que tinha um potencial enorme e acabamos por constatar que não teve assim tanto impacto”, acrescenta.

Paulo Bica considera que “esta tecnologia vai ter um impacto completamente diferente de tudo o resto. Não tenho nenhuma dúvida que daqui a 10 anos vamos olhar para trás e pensar como é que nós vivemos tanto tempo sem inteligência artificial”.

Mas na realidade o que é a inteligência artificial? Segundo Paulo Bica, “é a capacidade da máquina ou do computador poder ‘sonhar’ ou ele próprio compreender e sugerir algo”, uma vez que a inteligência artificial “tem várias ramificações”.

“Sei que é um bocadinho estranho, porque o computador consegue processar informação desde que esteja caracterizado nesse sentido. A diferença da inteligência artificial é que a máquina já consegue, sem configuração prévia, dar uma resposta a um problema ou uma necessidade. Ou seja, tem essa capacidade de idealizar”, explica.

O lagoense acha que esta nova tecnologia “é extremamente benéfica”, apesar de perceber “que existam receios” e de considerar que “é necessário existir regulamentação”.

“Essencialmente é uma ferramenta útil, de tarefas, de trabalhos, de projetos, que irá fazer com que os processos sejam muito mais rápidos e eficientes e, sem dúvida, que acho que nos próximos anos, muitos empregos vão deixar de existir, mas outros vão ser criados a partir dessa tecnologia”, alerta.

No entanto, Paulo Bica refere que não acredita “que o caminho seja receá-la”.

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Um dos incovenientes que a inteligência artificial pode criar é “ampliar aquilo que é o problema das redes sociais, ou seja, a desinformação”, além da possibilidade do sistema começar “a ser demasiado inteligente e que isso, de alguma forma, possa representar perigo para o mundo”.

“Compreendo esse tipo de receio que existe, mas o que é importante é regulamentar. Em Portugal, tal como noutros países, ainda não existe regulamentação. Em alguns países a resposta foi bloquear, parar e proibir, mas acho que esse não é o caminho, mesmo que seja durante algum tempo para perceber o impacto, o potencial ou os problemas que possam daí vir”, afirma ao JA.

Relativamente à desinformação, José Pedro, natural de Quarteira, refere que “já estão a ser criados sistemas de inteligência artificial de forma a identificar ou a validar conteúdos”.

Holograma de Angélico que interpreta uma das música da banda nos concertos deste ano

Holograma abre portas à inteligência artificial
O contacto de Cifrão, membro da banda D’ZRT, veio incluir a inteligência artificial na SPIC, em outubro do ano passado. Esta empresa, criada em 2007 em Almancil e primeiramente focada no webdesign, ficou a cargo de ‘ressuscitar’ Angélico Vieira, que faleceu em 2011 vítima de um acidente de viação, para a digressão de regresso da banda, que tem estado a ter lotação esgotada e uma corrida às bilheteiras.

“Começamos no ano passado a explorar e a perceber o potencial que existia, como é que nós poderíamos aplicar essa nova tecnologia na área dos eventos e das ativações de marca”, explica Paulo Bica.

O holograma de Angélico Vieira, que fala e canta durante os concertos do regresso dos D’ZRT, foi o abrir de uma nova janela de oportunidades desta empresa trabalhar na área da inteligência artificial, uma vez que já estão a receber mais alguns pedidos “porque agora é tendência e as marcas também gostam de mostrar que estão a acompanhar e que estão atualizadas”.

Este holograma teve um grande impacto a nível nacional. Angélico Vieira era um dos elementos da banda nascida na série televisiva “Morangos Com Açúcar”, que se transformou num sucesso único e marcou uma geração.

Criada em 2004, esta banda composta também por Cifrão, Paulo Vintém e o algarvio Edmundo Vieira, vendeu mais de 500 mil discos. Agora a banda está de volta com uma digressão repleta de nostalgia, que desperta emoções e que terminará com um concerto no Estádio Algarve a 19 de agosto.

“Ainda estamos a receber e a tentar perceber o impacto deste holograma. No primeiro concerto em Lisboa houve pessoas a sentirem-se mal. O espetáculo em si está muito bem produzido. Eles foram muito felizes e acho que é uma viagem. Toda aquela produção por si só já é forte e bastante impactante”, diz Paulo Bica, destacando ainda o trabalho do tavirense Telmo Pereira, que ficou a cargo da área de vídeos e de multimédia dos espetáculos.

Quando viram o seu trabalho surgir em palco, à frente de 20 mil pessoas, a reação “foi muito mais forte do ponto de vista emocional, muito mais forte do que qualquer coisa que já tivessemos feito, porque normalmente costumamos fazer coisas mais divertidas”, no meio de palmas e lágrimas de saudade dos fãs da banda.

Ao contrário de outros hologramas que já foram criados pelo mundo fora, como é o caso de Tupac ou Whitney Houston, feitos através da imagem modular, o de Angélico Vieira inclui inteligência artificial, conseguindo “um nível de realismo muito mais interessante”.

Dois dos responsáveis pelo holograma de Angélico Vieira

Trabalhar nove mil fotos e vídeos
Este holograma foi criado a partir de nove mil registos de vídeo e de fotografias de Angélico Vieira, de entrevistas, novelas, concertos ou sessões fotográficas, mas apesar destes conteúdos terem pouco mais de uma década, uma das dificuldades foi a qualidade dos mesmos.

“O Cifrão começou por partilhar connosco vários vídeos que tinha dos D’ZRT. Uma das dificuldades que tivemos era, apesar de existirem muitos, a sua qualidade, porque já lá vão uns anos. Além disso, a maior parte desses registos eram planos sempre diferentes e muitas das vezes estavam outras pessoas. Tudo isso dificultou um bocadinho a nossa tarefa”, refere.

Todo este processo foi dividido em várias fases. Começando com a pesquisa e por reunir todos os materiais e elementos, seguindo para a retirada de todas as caras, frame a frame. Posteriormente, as fotografias tiveram de ser trabalhadas para melhorar a sua qualidade “porque tem de se dar o melhor possível à máquina para ela realmente fazer o melhor trabalho”.

Para melhorar essa qualidade, os empresários recorreram também à inteligência artificial “para ampliar a resolução dos ficheiros”.

Por fim, é tudo colocado dentro do algoritmo da inteligência artificial e “alimentar a máquina que ficou a trabalhar durante mais de duas semanas”.

Após o vídeo estar concluído, a empresa teve ainda de trabalhar no ficheiro em pós-produção “para dar os retoques finais”, que foram feitos até pouco antes do primeiro concerto. Ainda na véspera do regresso dos D’ZRT, os empresários fizeram “algumas afinações em palco”, na MEO Arena.

O facto da digressão percorrer o continente e ilhas criou algumas limitações, uma vez que cada sala tem diferentes características, mas este holograma foi criado através da técnica da retenção por retroprojeção.

“Nós focámo-nos mais nos últimos registos que existiam do Angélico. A banda achava que era importante que o Angélico tivesse aquela característica do cabelo comprido e da pena na orelha, mas no que diz respeito ao rosto, a nossa preocupação é que fosse feito com os conteúdos mais recentes. Fomos mostrando à banda os resultados que íamos obtendo, também para reduzir a ansiedade, e para eles perceberem que está a acontecer. O primeiro que viram, gostaram logo muito e isso transmitiu-nos alguma tranquilidade”, conta.

holograma angelico
Paulo Vintém, Edmundo Vieira e Cifrão atuaram ao lado dos hologramas

Para este holograma “é utilizada uma película totalmente impercetível e transparente, mas onde tem de ser aplicada uma tensão muito grande até ficar totalmente invisível. Ao fazer isso, quando se desmonta, perde essa característica e tem de ser substituída por outra e são bastante caras. Cada concerto tem uma nova”.

Além do holograma principal, de Angélico Vieira vestido de branco, esta empresa algarvia criou outra imagem do cantor português, que espera pelos outros elementos da banda encostado a uma carrinha que virou a imagem de marca do single e videoclip “Verão Azul”.

No entanto, “é apenas conteúdo digital que está no ecrã, mas também foi feito por inteligência artificial”.

“A técnica é a mesma, mas a forma como é apresentado ao público é que é diferente. Um é em ecrã, enquanto o holograma já tem uma técnica diferente”, explica Paulo Bica.

Com o objetivo do resultado final corresponder às expectativas do cliente, que estava “consciente das dificuldades, do potencial e dos caminhos possíveis”, os empresários tinham sempre em mente a reação da família de Angélico Vieira.

“Isso fez-nos respeitar ainda mais o projeto. Fez-nos dedicar-nos mais para perceber que tinha de ser uma coisa bem feita. Aquilo que se pretende na experiência holográfica é o maior nível de realismo possível. Estávamos também conscientes que era um projeto que tinha um impacto emocional muito grande, não só para a banda, mas para toda uma geração”, acrescenta.

Antes da estreia da digressão foram feitos os últimos testes em palco

Algarve tem empresas tecnológicas “muito interessantes”
Acreditando que possam existir outras empresas algarvias que já utilizam a inteligência artificial, Paulo Bica considera que “a região já tem empresas muito interessantes na área das tecnologias”.

“O que nós estamos a assistir hoje em dia é que as pessoas desta área das tecnologias, trabalham de qualquer parte do mundo e o Algarve tem uma vantagem que é a qualidade de vida, o clima, as pessoas e a gastronomia. Isso faz com que muitas empresas se comecem a instalar no Algarve”, refere.

Com sete pessoas a trabalhar nesta empresa, algumas vindas da Universidade do Algarve, Paulo Bica acrescenta ainda que não é fácil arranjar mão de obra.

“Por um lado estas empresas são boas, porque dão mais valor à região, mas não há trabalhadores e pela primeira vez temos um elemento que não é algarvio”, conta ao JA.

O facto de cada vez mais existirem empresas tecnológicas no Algarve “traz mais pessoas com outro tipo de qualificação para a região, porque daqui podem estar a criar para o outro lado do mundo. Temos vindo a ver cada vez mais empresas multinacionais a abrirem no Algarve, que já não está a ser tão conectado apenas como uma região em que a única atividade é o turismo e a hotelaria”.

A SPIC trabalha também com ativações de marca em eventos e festivais, mas também já tem vindo a realizar trabalhos para museus.

No entanto, todos esses trabalhos são feitos para outras regiões e países, para marcas como Fnac, Sommersby, HBO, Vodafone ou EDP, tendo recebido poucas propostas para o Algarve, como é o caso do Hotel Faro.

Questionados sobre um próximo holograma que gostariam de criar, a resposta foi a fadista Amália Rodrigues “só pelo impacto emocional que também iria gerar. Era muito interessante porque também faz parte da nossa cultura”, conclui.

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