O 25 de Abril e a Liberdade…

Vivemos num país em liberdade. A liberdade é tão importante que acho que deveria ser sempre
escrita com letra grande: Liberdade! Até ao 25 de Abril de 1974, eu só sabia o que era a liberdade porque a tinha em casa. Tinha-a em casa ao mesmo tempo que era avisado que na rua não a tinha: precisava ter cuidado com o que dizia e com o que fazia, o mesmo é dizer com o que expressava! O meu pensamento seria livre, mas a sua expressão podia fazer-me correr riscos e isso limitava o meu pensamento! E se quisesse empreender qualquer acção que para ela contribuísse, teria de ser cauteloso! Era assim que vivíamos: num país despótico onde, por momentos, pensámos que a liberdade seria possível. Aconteceu isso em finais de 1968 quando, finalmente, Salazar foi apeado do poder e substituído (embora sem nunca o saber! Explico-me: a 3 de Agosto de 1968 Salazar, de férias no Forte de Santo António no Estoril, caiu violentamente de uma cadeira e bateu com a cabeça no chão. As consequências de tal queda levaram-no à inconsciência e, consequentemente, à sua substituição) por Marcello Caetano. Foi a chamada “primavera marcelista” em que se vislumbrou algum abrandamento do despotismo salazarista em que sempre tinha vivido. Esboçaram-se algumas liberdades tais como a autorização do II Congresso Republicano de Aveiro (o primeiro havia sido em 1957, por ocasião da campanha de Humberto Delgado) e até umas eleições que acabaram por ser tão fraudulentas quanto todas as anteriores.


O nó górdio de toda a situação radicava na existência de três guerras nas então chamadas “províncias
ultramarinas” que era o que restava do que pomposamente chegou a ser chamado de Império Colonial Português!


E digo “pomposamente” porque, em minha opinião, Portugal foi quase sempre um país de comerciantes e não de colonos e, sobretudo após o período das Descobertas, um país de intermediários, de feitores.

Enquanto tal, estabeleceu feitorias um pouco por todo o Mundo, dos pontos de abastecimento de escravos, de especiarias, de ouro, prata e pedras preciosas e de outros produtos que a Europa consumia, até às feitorias na própria Europa, onde tudo isso era vendido com lucros: Flandres (Antuérpia), Inglaterra, Veneza, etc. Do descobrimento das rotas de navegação da Europa à Ásia ficaram todas as feitorias africanas na costa atlântica, de que Arguim foi a primeira, seguida de S. Jorge da Mina e muitas outras que serviriam como entrepostos de compra e embarque de escravos para o que então se chamava Novo Mundo, bem como de ouro e alguns produtos exóticos. Na costa africana índica estabeleceram-se feitorias em Moçambique e Mombaça e, já na Ásia, Goa, Malaca, Ormuz, Maldivas e tantas outras ao longo do Pacífico. Tudo isto pedaços de terra, muitas vezes fortificados, que serviam como armazéns do que se comerciava. A excepção é o Brasil porque, tendo sido sede da coroa portuguesa (já no século XIX), teve um tratamento como um país a sério, embora tenha começado como o resto do Mundo, com feitorias: Rio de Janeiro, Fernão de Noronha, etc. O “império” é por isso coisa tardia, apressada pela voracidade das potências europeias que, tendo ficado para trás na descoberta das rotas dos novos e ambicionados produtos, tentavam cada vez com maior obstinação, um naco do Mundo que os reis de Portugal e de Espanha tinha entre si dividido em Tordesilhas.

A capacidade bélica estes dois povos algo periféricos à Europa sucumbe perante as frotas da Europa Central -Grã-Bretanha, França, Alemanha e Países Baixos que vão paulatinamente tomando posse de muitas das feitorias e territórios até então sob domínio ibérico e transformando-os em colónias. Só depois da independência do Brasil, Portugal empreende o reconhecimento (por Ivens, Capelo e outros) e a ocupação dos territórios africanos que lhe restavam. A partir daí sim, Portugal agiu como qualquer país colonialista: ocupou territórios, ditou o que lá se agricultava, minava ou comerciava e como, para isso utilizando trabalho forçado e a força das armas. Contudo, fruto da Segunda Guerra Mundial, toda a Europa descolonizou. Ficou o “Portugal pluricontinental e multiracial” de Salazar, “orgulhosamente só”
(como ele próprio dizia), lutando contra os movimentos de libertação que até pelo papa eram reconhecidos! Claro que uma guerra é incompatível com qualquer democratização e a imaginada “Primavera Marcelista” sucumbiu, e o regime voltou a endurecer. Mas há coisas que não têm retorno e as Forças Armadas, cansadas de 13 anos de uma guerra fratricida que além do mais sabiam não poder vencer (a guerrilha é imbatível!) decidiram reescrever toda a História deste país! E assim nasceu o 25 de Abril de 1974, faz agora 50 anos, acabando com a polícia política, com a censura, com a guerra, com as colónias e com tudo o que se interpunha entre nós e a Liberdade, abrindo espaço à Democracia. Foi (é), no belo dizer de Sophia.

“(Esta é) a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo”

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