Republicanos venceram e Obama parece que já sabia

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Obama participou em apenas sete comícios durante toda a campanha

Stephen Spicer, 78 anos, sempre votou democrata e desta vez, embora a custo, não foi diferente. “O entusiasmo das presidenciais de 2008 e 2012 já lá vai”, confessava, ao Expresso, o antigo professor do ensino primário à entrada do “Curley Community Center”, no sul de Boston.

Numa cidade maioritariamente liberal, a participação eleitoral rondava os 20% a meio da tarde de ontem. Um mau sinal para a esquerda e que aos poucos confirmava os dados das sondagens das últimas semanas, que atribuíam a vitória ao Partido Republicano nas eleições intercalares.

Enquanto Stephen votava, ouvia-se na rádio pública (“National Public Radio”), um excerto de uma entrevista exclusiva ao Presidente Barack Obama, que, tal como o septuagenário de Boston, parecia dar a corrida como perdida.

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“Neste ciclo eleitoral, este é provavelmente o pior conjunto de estados para o Partido Democrata desde Dwight Eisenhower. Em muitos deles a luta é renhida, mas a verdade é que por tradição votam republicano”, disse o chefe de Estado.

À mesma hora, em Washington, a líder da minoria democrata na Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, afinava pelo mesmo diapasão: “Será uma noite difícil”.

No “Curley Community Center”, em Boston, gerou-se um burburinho, com alguns dos eleitores que esperavam para votar a perguntarem porquê que se tinham dado ao trabalho, visto que o líder democrata parecia reconhecer a derrota antecipadamente.

À saída, Stephen apercebeu-se das declarações de Obama. Resignado, suspirava e encolhia, repetidamente, os ombros. “A verdade é que vim votar porque me lembrei muito do nosso ex-mayor nestes últimos dias. O Tom (Thomas) era um político da velha guarda, que nunca dava nada por perdido, insistindo com as pessoas para votarem. Por isso, não me interessa o que Obama vem agora dizer”.

Thomas Menino faleceu no passado dia 30 de Outubro, vítima de um cancro, doença que, ao fim de 20 anos, o arredou da autarquia de Boston.

O sentimento de desilusão em relação ao Presidente marcou a campanha para as eleições intercalares de ontem, que terminaram com a vitória do Partido Republicano – consolidação da maioria na Câmara dos Representantes e reconquista do Senado, respectivamente, câmaras baixa e alta do Congresso.

Impopular, Obama participou em apenas sete comícios durante toda a campanha. Por comparação, o antigo chefe de Estado Bill Clinton apareceu em 47, parte deles ao lado da mulher Hillary, a provável candidata democrata às presidenciais de 2016.

Nos vários debates televisivos houve até candidatos democratas que recusaram dizer se tinham votado em Barack Obama. “Tenho o direito de não revelar o meu voto”, explicou Alison Grimes, candidata ao Senado pelo estado do Kentucky.

Os EUA e o paraíso

“A Administração até tem feito um trabalho razoável, mas o problema é que as pessoas tinham expectativas muito elevadas quando elegeram Barack Obama. Ele salvou o país de uma depressão económica, mas os Estados Unidos não se tornaram num milagre económico ou numa espécie de paraíso na terra”, afirma ao Expresso Sean Wilentz, historiador da Universidade de Princeton.

Durante a festa conservadora na noite eleitoral de ontem, ouvia-se de tudo. Os mais pragmáticos explicavam que os próximos dois anos serão marcados por avanços na governação, enquanto os elementos mais à direita, com ligações ao movimento “Tea Party”, deixavam a ideia de que o “impeachment” (revogação do mandato) do Presidente deveria ser a prioridade.

“Há a possibilidade disso acontecer. Para já temos de nos organizar e depois olhar para todas as possibilidades”, disse Kenny Marchant, um congressista oriundo do Texas.

Conselheiro de Barack Obama até ao passado mês de Janeiro, Anton Gunn teme que a vitória republicana seja um sinal de instabilidade política para os próximos dois anos. “Desde que assumiram a maioria da Câmara dos Representantes, em 2010, os conservadores preocuparam-se apenas em dizer não. Por isso, este é o Congresso mais improdutivo da história. Bem que gostaria de pensar o contrário, mas, com uma maioria nas duas câmaras do Congresso, imagino que as coisas irão piorar”.

Algumas das bandeiras da campanha de Barack Obama para um segundo mandato, como a reforma do sistema de Imigração, essencial para resolver o problema dos 11 milhões de ilegais a viver nos Estados Unidos, dependerão de um acordo com o futuro Congresso.

O grande prémio

O democrata Jim Costa, um dos três congressistas luso-americanos que garantiram ontem a reeleição, é menos pessimista, recordando-nos algumas declarações conciliatórias de políticos conservadores. “O actual líder da maioria republicana na Câmara, Kevin McCarthy, disse há pouco tempo que o seu partido tem a obrigação de ajudar a governar o país. Disse mesmo que se não o fizer, não conseguirá ganhar o grande prémio, isto é, eleger um presidente em 2016”.

Todos os analistas e políticos ouvidos pelo Expresso indicam que a reforma da política de Imigração poderá ser aprovada, desde que Obama aceite voltar a discutir parcelas da reforma do sistema de saúde, conhecida como “Obamacare”.

A Presidência poderá ceder também ao nível do sector da Energia. “Prevejo que, rapidamente, seja colocada em cima da mesa do Presidente Obama uma proposta do Congresso para aprovação do oleoduto Keystone XL”, revela-nos um congressista conservador da Califórnia.

A proposta em causa prevê uma infra-estrutura colossal que transportará o crude canadiano da Província de Alberta até aos portos do sul dos Estado Unidos, em pleno Golfo do México.

Caso Obama ceda nas áreas da Saúde e da Energia, Anton Gunn considera possível um acordo de longo prazo entre republicanos e democratas sobre o financiamento do Estado. “Chega de Shutdowns!”, parodia o antigo conselheiro, referindo-se ao processo de suspensão de serviços públicos federais não essenciais, que ocorreu há cerca de um ano.

RE

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