“Ser destino turístico de excelência significa ser local de qualidade para trabalhar”

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A ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, visitou no dia 10 de março, em Portimão, o Campeonato Nacional das Profissões. Em entrevista ao JA, a responsável defende que "é possível esbater a sazonalidade" através da "diversificação da atividade turística a meses menos tradicionais". Por outro lado, revela que o volume de financiamento público em respostas sociais na região, incluindo o PRR, já ultrapassa 10 milhões de euros em projetos aprovados

JORNAL do ALGARVE (JA) – O Algarve continua a ser umas das regiões mais afetadas pela sazonalidade. Como resolver uma questão que ‘assombra’ há anos os empregadores algarvios?
Ana Mendes Godinho (AMG)
– A sazonalidade não pode ser uma fatalidade. Nos últimos anos tem sido evidente o alargamento e a diversificação da atividade turística a meses menos tradicionais, mostrando que é possível esbater a sazonalidade. É essencial criar as condições para que os trabalhadores mantenham os contratos de trabalho durante todo o ano, desde logo para garantir a estabilidade e os seus rendimentos e também para conseguir reter talento. Ser destino turístico de excelência significa, antes demais, ser destino de qualidade para trabalhar. Uma condição não pode dissociar-se da outra. É um desafio coletivo, com o qual estamos comprometidos e estamos a avaliar mecanismos específicos que possam ser instrumentos que podem ajudar.

JA – Apesar de ser uma problemática transversal a todo o território nacional, a região algarvia é das que mais sofre ‘na pele’ com a escassez de recursos humanos nos mais variados setores, mas em especial no ramo da hotelaria. Quais são as medidas que podem reverter esta situação? Como voltar a tornar o setor e a região atrativos?
AMG
– O distrito de Faro tinha, em 2022, um total de 238 mil trabalhadores com remuneração declarada à Segurança Social. Ou seja, mais 67 mil trabalhadores do que em 2022. Um aumento de cerca de 40%. Em relação ao desemprego, no Algarve, a evolução também foi positiva: menos 32% do que em 2015. Em Portugal, baixámos a taxa de desemprego para níveis historicamente baixos, incluindo no desemprego jovem, e atingimos o recorde de população empregada. A falta de recursos humanos é consequência desta evolução e é um desafio comum a muitos países. É por isso fundamental criar as condições para atrair e fixar trabalhadores. No caso do turismo, este compromisso é essencial e determinante, pois trata-se da atividade que mais trabalhadores perdeu durante a pandemia. A recuperação da atividade turística em 2022 teve consequências diretas no emprego, com a criação de mais de 40 mil postos de trabalho, mas ainda longe do número de trabalhadores que trabalhavam no turismo em 2019. O mundo do trabalho é aberto e global, e as pessoas decidem as suas opções em função da forma como são valorizadas. Daí que estejamos numa fase de transformação profunda, à qual temos todos de responder em várias dimensões. Refiro-me, concretamente, ao investimento nas qualificações em programas articulados com as empresas, à valorização dos jovens no mercado de trabalho, ao combate à precariedade, à promoção de emprego digno e sustentável, à valorização dos salários, à conciliação da vida pessoal, familiar e profissionais e à atração e integração de imigrantes. As medidas que temos colocado no terreno têm estes objetivos. E são estes, aliás, as grandes linhas do Acordo de Rendimentos, Valorização dos Salários e Competitividade e a Agenda do Trabalho Digno. Neste sentido, lançámos medidas de apoio à contratação de jovens com contratos permanentes, (que apoiaram 550 jovens último ano no Algarve), simplificámos os processos de vistos e mecanismos de livre circulação entre trabalhadores dos países da CPLP e criámos instrumentos para apoiar as famílias em termos de respostas sociais (de que é exemplo o alargamento da rede de creches e a gratuitidade das creches, que já abrange 2.700 crianças no Algarve). O volume de financiamento público em respostas sociais, no distrito de Faro, incluindo o PRR, já ultrapassa, neste momento, 10 milhões de euros em projetos aprovados. A componente de financiamento público serve de alavancagem para investimentos que ascendem a 20 milhões de euros. Temos todos de fazer a nossa parte. Este é um desígnio que exige de todos um compromisso coletivo para garantir que conseguimos um crescimento inclusivo. O turismo pode e deve liderar este novo tempo. E o Algarve pode e deve posicionar-se, como sempre, na linha da frente.

JA – A formação profissional é uma das bases para qualquer atividade. As empresas têm apoios suficientes para poderem formar os seus colaboradores?
AMG
– Assumimos a formação e a qualificação como motores determinantes da transformação de vidas, de quebra de ciclos de pobreza e condição crítica de crescimento. Dou como exemplo o Programa UpSkill, que tem de muito diferenciador o facto de ser um compromisso tripartido, desenhado entre o IEFP, as pessoas e as empresas, à medida das necessidades específicas de cada setor de atividade. Lançámo-lo, por coincidência, em março de 2020, em pleno início da pandemia.
Foi um enorme risco assumido por todos e que agora se demonstra que valeu a pena. Passados três anos, este é um dos programas como maior sucesso em termos de adesão de empresas e de integração de trabalhadores. O modelo assenta numa palavra: compromisso. Compromisso das organizações de formação, que desenham os cursos à medida das necessidades das empresas. Compromisso das empresas, que identificam e nos fazem chegar as necessidades reais de talento e assumem a contratação permanente de, pelo menos, 80% das pessoas com o curso concluído com um salário pré-definido de 1.200 euros. Este tem de ser, cada vez mais, o caminho. Parceria, diálogo permanente.

JA – No caso dos centros de emprego, é defensora da necessidade de modernizar as estruturas e os procedimentos que balizam a atuação do IEFP?
AMG
– A pandemia abanou todas as estruturas e mostrou como temos de acelerar e transformar muitas das respostas existentes. Foi por isso, aliás, que no PRR incluímos o investimento estrutural nos centros de formação do IEFP e da rede protocolar, que têm neste momento em curso certa de 250 milhões de euros em investimento na modernização da oferta formativa e no foco nas qualificações diferenciadoras que acrescentam valor. Este investimento está a acontecer aqui no Algarve, como aliás tive a oportunidade de ver in loco em Albufeira e em Portimão, por exemplo.

JA – Do que teve oportunidade de observar em Portimão, no Campeonato Nacional das Profissões, quais são as áreas que ‘darão cartas’ nos próximos anos na região?
AMG
– Foi extraordinário o entusiasmo, o profissionalismo e a vontade de concretização que assistimos no Campeonato das Profissões. Espírito que traduz os melhores resultados de sempre que Portugal teve no mundial das profissões de 2022. Tivemos em Portimão perto de 400 Jovens a concorrer em cerca de 50 profissões, com uma dedicação enorme que mostra bem o espírito de superação e a garra que os move. Com a consciência plena de que as qualificações são o que os torna indispensáveis às organizações. Destaco algumas áreas que se têm afirmado e que são críticas para o nosso futuro coletivo: digitais, economia verde, desenho industrial e turismo, claro.

JA – Em termos salariais, ainda vale a pena tirar um curso superior em Portugal? Estamos a entrar numa fase em que “profissionalizar” compensa mais do que “licenciar”?
AMG
– A qualificação é o que distingue uma geração e um país. E não há campos estanques, há complementaridade entre formações e competências. Nenhum processo formativo, seja ele mais científico ou mais profissionalizante, é um fim em si mesmo, mas um princípio. Acima de tudo, devemos estar abertos a aprender. Aprender sempre. Quanto mais aprendermos, ao longo da vida, mais somos indispensáveis às empresas, às instituições, à sociedade, ao país. O maior recurso que nós temos são as pessoas. E hoje existe uma disputa enorme por pessoas, por talento. Quanto maior e mais abrangente a qualificação, maiores as oportunidades. O maior talento que nós temos são as pessoas. Temos de saber aproveitar esse recurso espetacular que nós temos e conseguir também, cada vez mais, dizer a estes jovens que são indispensáveis para Portugal.

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