Sócrates recusa pulseira e conta porquê numa carta

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José Sócrates decidiu colocar uma batata quente nas mãos do juiz de instrução Carlos Alexandre. O ex-primeiro-ministro decidiu “não dar consentimento” à proposta do Ministério Público para que deixe de estar em prisão preventiva e passe a estar em prisão domiciliária, com uma pulseira electrónica.

A decisão foi comunicada esta segunda-feira à tarde pelo antigo líder socialista aos seus dois advogados. Durante a visita de três horas de João Araújo e Pedro Delille ao estabelecimento prisional de Évora, Sócrates optou por explicar os motivos da sua recusa numa carta dirigida ao juiz de instrução e a Rosário Teixeira, o procurador do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) que coordena a equipa dedicada ao caso.

Numa declaração divulgada em exclusivo no Jornal da Noite da SIC, e paralela à carta enviada ao procurador e ao juiz, Sócrates explica como não poderia decidir de outro modo. “Nas situações mais difíceis há sempre uma escolha. A minha é esta: digo não.”

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Preso preventivamente há mais de seis meses, depois de ter sido interrogado e constituído arguido por indícios de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais, José Sócrates pretende usar a recusa da pulseira electrónica como um manifesto contra a forma como considera estar a ser tratado pelo sistema judicial.

Um dos seus amigos mais próximos revelou esta segunda-feira à tarde, ao Expresso Diário, qual era a postura do recluso 44 em relação ao assunto: “Quiseram-me preso? Agora apresentem-me as provas. Estou preso e continuarei. Não me venham passar a mão pelo lombo para que o juiz possa corrigir, junto da opinião pública, os erros grosseiros que cometeu.”

A mesma fonte próxima do ex governante lembra que é inegável que a saída de Évora só teria “vantagens” (“podia ver a família, estar mais perto dos advogados, podia receber jornalistas etc”), mas que Sócrates está a pensar em tudo “menos nele”. “Ele irá usar esta recusa nunca em benefício próprio mas em benefício do bem comum” e é “preciso haver uma coisa muito forte para que um cidadão não aceite sair da prisão”. E que coisa é essa? Mais do que a vitimização, Sócrates quer mostrar ao país “o que se está a passar com a justiça”. “Um ato destes [recusar a pulseira eletrónica] tem de significar algo inédito e deve servir para mostrar aos portugueses como o nosso sistema está a funcionar”.

Tudo nas mãos de Carlos Alexandre

De acordo com vários juízes consultados pelo Expresso, o Tribunal Central de Instrução Criminal tem agora de aplicar uma de várias soluções possíveis: manter Sócrates na cadeira de Évora; libertá-lo com Termo de Identidade e Residência ou apresentações à polícia ou prisão domiciliária sem vigilância eletrónica, mas com um polícia à porta. Caberá ao juiz de instrução Carlos Alexandre decidir qual considera a mais razoável.

Uma alteração feita ao Código do Processo Penal em 2013 permite a um juiz, em processos que estejam ainda em fase de investigação, como é o caso, aplicar medidas de coação que sejam mais graves do que aqueles que são sugeridas pelo Ministério Público. Até 2013, um juiz de instrução nunca poderia decidir-se pela prisão preventiva de um arguido sem que fosse o procurador do caso a propor isso. Mas com as novas regras, mesmo que Rosário Teixeira proponha a prisão domiciliária para o arguido, uma medida menos gravosa, a lei permite que Carlos Alexandre possa optar por manter Sócrates na cadeia. Desde que o faça tendo como fundamento o perigo de fuga; ou, em alternativa, o perigo, de “continuidade da atividade criminosa” ou de “perturbação grave da ordem e a tranquilidade pública”.

O perigo de fuga foi afastado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, num acórdão proferido em março, em resposta a um recurso apresentado pela defesa de Sócrates. Um dos magistrados ouvidos pelo Expresso diz que “o juiz de instrução vai ter de levar em linha de conta esse acórdão da Relação”. Uma vez que a continuação da atividade criminosa, aparentemente, não pode ser posta em causa, uma vez que os crimes em investigação dizem respeito a atos alegadamente cometidos na qualidade de primeiro-ministro, cargo que o arguido já não ocupa, sobra apenas como justificação a perturbação grave da ordem e da tranquilidade pública.

Mas tudo isto é teoria. Carlos Alexandre pode simplesmente optar por ser prático e concluir que, uma vez que o arguido não consente a aplicação da medida do uso da pulseira eletrónica, não há condições para a aplicação da medida de coação promovida pelo Ministério Público e, em face disso, mantém-se tudo tal como está. Isto é, com Sócrates na prisão.

RE

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