Alunos que não gostam de ler com melhores resultados em prova de leitura

Este resultado fez o ministro da Educação alertar para o modelo de ensino do Português e dos testes e provas nacionais

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As crianças portuguesas do 4.º ano que assumiram não gostar de ler obtiveram melhores resultados num estudo internacional sobre literacia em leitura do que as que disseram ter “Gosto pela leitura”, revela o estudo PIRLS2021.

Ter muitos livros em casa, os pais terem formação superior e pertencer a uma família de estatuto socioeconómico elevado são algumas das características habitualmente associadas ao sucesso académico dos alunos, mas o PIRLS 2021 (Progress in Internacional Reading Literacy Study), divulgado esta semana, mostra novas relações.

O estudo internacional que nos últimos 20 anos tem avaliado a literacia em leitura revela agora que não existe uma associação positiva entre o índice “Gosto pela leitura” e os resultados médios dos portugueses nos testes.

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Os alunos que disseram não gostar de ler tiveram melhores resultados do que os colegas que afirmaram que gostavam muito de ler.

Este resultado fez o ministro da Educação alertar para o modelo de ensino do Português e dos testes e provas nacionais, lembrando a história de um professor universitário de linguística que lamentava o facto de “o filho ter tido 18 valores no exame de Português sem nunca ter lido os Maias”.

Também a comissária do Plano Nacional de Leitura, Regina Duarte, defendeu que em vez de “ter alunos que sabem repetir fórmulas de livros” é preciso voltar a ter “alunos que sabem avaliar a informação mesmo quando os textos ou as perguntas são colocadas de forma diferente”.

A comissária criticou um sistema que “torna os alunos muito competentes, mas os afasta do prazer de explorar livros de forma muito pessoal”.

Certo é que quem lê mais horas tem melhores resultados, mas são poucos os que ficam muito tempo agarrados a um livro, diz o PIRLS.

Quase metade dos alunos (48%) lê menos de 30 minutos por dia, sendo que as crianças portuguesas que se destacaram no PIRLS liam entre uma a duas horas diariamente.

Frequentar um colégio em vez de uma escola pública, ter quarto próprio e ligação à internet ou pais muito envolvidos na vida escolar também fizeram diferença nos resultados das provas realizadas no final do ano letivo de 2021 a mais de oito mil alunos portugueses do 4.º ano.

O estudo destacou ainda o efeito positivo de ter muitos livros em casa. No entanto, mais de metade dos alunos (62%) tem apenas entre 11 e 100 livros e há mesmo muitas crianças que têm menos de dez livros.

Além de avaliar as capacidades de leitura e interpretação dos alunos numa altura em que já “aprenderam a ler” e passam a “ler para aprender”, o PIRLS fez três inquéritos distintos a estudantes, pais e professores.

No questionário realizado aos pais estes disseram que cerca de 85% dos alunos ficaram em casa durante a pandemia, sendo que dois em cada três consideraram que houve um impacto negativo na aprendizagem dos filhos.

O estudo mostrou ainda que os alunos que não realizaram atividades online durante o confinamento acabaram por ter piores resultados no PIRLS.

Por outro lado, os pais que conseguiram disponibilizar recursos adicionais podem agora confirmar que esse esforço se traduziu em melhores resultados em relação aos alunos sem apoio dos pais.

O PIRLS 2021 mostra que as capacidades de leitura e interpretação dos alunos portugueses do 4.º ano se mantiveram praticamente inalteradas entre 2016 e 2021, mas os resultados médios dos alunos fez com que Portugal subisse ligeiramente na tabela comparativa de países.

Os portugueses surgem agora em 22.º lugar numa lista de 43 países, quando em 2016 estavam em 30.º lugar numa lista de 50 participantes, segundo o estudo da agência independente International Association for the Evaluation of Educational Achievement.

As crianças que fizeram a prova em papel melhoraram ligeiramente em relação a 2016 (subida de três pontos), mas nas provas digitais os resultados médios baixaram oito pontos (numa escala de zero a mil).

Em Portugal, o PIRLS foi aplicado logo após o segundo confinamento e período de ensino a distância, que decorreu entre janeiro e março de 2021. O PIRLS realiza-se periodicamente de cinco em cinco anos.

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1 COMENTÁRIO

  1. Por vezes, deparamos com situações que não nos merecem outra designação, a não ser a de “infeliz”.
    É, manifestamente, o caso desta notícia.
    Não irei dizer que foi esse o propósito de quem a redigiu, mas o que ela, lamentavelmente, induz, para todos os efeitos, designadamente aos mais jovens, é a apologia e o incentivo a um erro extremamente grave: o de que a leitura é algo que é um tempo perdido e perfeitamente dispensável.

    O erro consiste em que a parte foi tomada pelo todo, pelo que inquina e ilude a realidade, junto dos que, incautos e de boa fé, tomam por verdadeiro e universal o que vem plasmado na notícia.

    Seja-me permitido recorrer a alguns excertos de um magnífico artigo de quem tem muitos mais conhecimentos do que eu e tem debruçado o seu estudo sobre a temática bem candente, que mexe, hoje em dia, com a nossa juventude e adolescência, desde logo, o hiperexcesso de oferta de solicitações digitais, que atinge a actual geração, com especial incidência nos mais jovens.
    Falo do psiquiatra Augusto Cury.

    Vestindo a bata de médico, este pesquisador principia por defender que, cito, “a leitura é mais poderosa do que a própria ritalina, uma vez que leva a um processo de interiorização, desaceleração do pensamento e ao contacto do ser humano consigo próprio, isto é, do seu equilíbrio interior”
    Refira-se que a ritalina é um fármaco estimulante do sistema nervoso central indicado para ajudar no tratamento do transtorno de “deficit” de atenção e hiperatividade, em crianças, adultos e da narcolepsia.

    Depois, sob o olhar de clínico, tece outras considerações, que, embora parecendo não serem relacionadas com o tema da leitura, visam a preocupação da formação da personalidade em seres, como são os mais novos, sendo que tudo se prende, afinal, e conflui, do ponto de vista holístico.

    Afirma que nunca as crianças receberam tantos estímulos, como vídeos, ‘smartphones’, redes sociais e alerta que isso os está a prejudicar, a torná-los mais imaturos, a ponto de não suportarem o tédio e não saberem lidar com frustrações.
    Defende que “temos de reduzir esta parafernália de estímulos, que lhes causam uma intoxicação digital, porque, se o não fizermos, não vamos ter uma geração de jovens mentalmente saudáveis”.

    Diz mais que “a família não é uma democracia, em que os filhos têm os mesmos direitos que os pais. A família é um ambiente para se ensinar a democracia, onde há direitos e deveres importantes. Se isto não for ensinado, as crianças e os adolescentes tornam-se pequenos ditadores, que irão exigir cada vez mais, para sentir cada vez menos e os pais irão viver subordinados às suas vontades.”

    Acrescenta que “os pais não estão formando os filhos para exercer a plena democracia e um dos reflexos é o radicalismo da direita e da esquerda no mundo”.
    “Esse radicalismo é devido a não terem aprendido a colocar-se no lugar do outro e a trabalhar com frustrações. Nessa medida, têm uma necessidade neurótica de poder e de estar sempre certo”.

    Continua, afirmando que a extrema proliferação de estímulos digitais desestabiliza a sua emocionalidade, poder de concentração, gera ansiedade e a sindroma da hiperaceleração do pensamento, que estão na base de sintomas, como acordar cansado, com dores de cabeça, musculares, de garganta ou taquicardia. Esses sintomas psicossomáticos representam o grito de alerta do cérebro, suplicando para que mudemos o estilo de vida para uma mais tranquila. Infelizmente, não ouvimos a voz do corpo. Depois, na decorrência, há os sintomas psíquicos, como a irritabilidade e o baixo limiar para suportar frustrações”.

    Este contexto de emoções rápidas e superficiais impede que alguém se fixe numa flor, contemplando o belo ou num bate-papo com o pai, mas apenas nas próprias emoções, pensando e reflectindo sobre as suas dores e dificuldades. Ou seja, numa total ausência de pensamentos positivos”.

    Acrescenta mais: “os ‘smartphones’, ‘videogames’ e redes sociais saturam o córtex cerebral e mexem com o ciclo da dopamina e da serotonina (hormonas no cérebro), gerando uma dependência, ao nível de drogas estimulantes, como a cocaína”.

    Depois, remata com uma frase lapidar e luminosa: “Pais que dão tudo aos filhos cometem um crime à saúde emocional deles”.
    “Deve-se dar menos presentes às crianças, de modo a proporcionar-lhes a oportunidade para que os vivenciem de uma maneira mais profunda”.

    É aqui que, segundo este psiquiatra, entra a melhor das terapias, que não tem nem deve recorrer aos fármacos, que acabam por intoxicar, mais do que libertam : “as crianças devem tocar um instrumento, ler bons livros, aprender a pintar, cuidar de plantas ou praticar desporto, ou seja, actividades lentas para desacelerar a mente, gerar uma interiorização e reconciliá-las consigo próprias”.

    Muito mais conclusões nos ensina este clínico, que lamento não poder mencionar, a fim de não alongar este escrito, entre as quais a leitura, a qual coloca nos primeiros lugares da sua galerias de escolha.

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