As árvores e a água

Uma árvore transpira muito mais vapor de água do que um ser humano, pois são seres de maior volume.

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As árvores são seres vivos vasculares, tal como nós.

Simplesmente, aos nossos vasos chamamos veias e artérias, por onde circula uma solução aquosa (cerca 90% água) que é o sangue (arterial e o venoso) e aos vasos das árvores chamamos floema e xilema (termos de origem grega) ou líber e lenho (termos de origem latina), por onde circula, também, uma solução aquosa, a seiva (elaborada e a bruta).

Há, pois, plena correspondência, apenas com nomes diferentes.

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Para a água circular e irrigar todas as células do corpo, os seres vivos vasculares transpiram, constantemente, vapor de água.

Por exemplo, quando há muita gente numa sala fechada, a evapotranspiração é tal, que o vapor de água chega a condensar-se nas paredes frias da sala onde se pode ver gotejar a água resultante da evapotranspiração de tanta gente junta.

Uma árvore transpira muito mais vapor de água do que um ser humano, pois são seres de maior volume.

Há árvores até cerca de 100 m de altura e árvores com cerca de 1500 m3 de volume.

Numa floresta há, pois, enorme evapotranspiração. 

Por exemplo, a floresta amazónica é uma floresta trópico-equatorial, sob intensa incidência de radiação solar e, por isso, com árvores altíssimas e de enorme volume.

Assim é uma floresta extremamente húmida, uma pluvisilva (do latim pluvia = chuva e silva = floresta), onde chove praticamente todo o ano pois as correntes de ar (ventos) vindas do Oceano Atlântico carregadas de vapor de água (as nuvens são autênticos rios aéreos) ao elevarem-se sobre as altas árvores, precipitam chuva intensa.

Essa água encharca o solo e as árvores aproveitam-na.

Como essas árvores são enormes, evaporam grande volume de vapor de água.

São autênticas bombas bióticas de evapotranspiração.

Como são imensas e enormes árvores a evapotranspirar, formam-se autênticos rios aéreos que transportam vapor de água para o interior do continente e na parede montanhosa dos Andes, são desviados para o Sul, precipitando chuva na América do Sul.

O desenfreado derrube que esta floresta tem sofrido, diminuindo drasticamente estas enormes bombas bióticas de evapotranspiração, tem provocado secas nalgumas regiões da América do Sul, onde já secaram lagos de grande dimensão, como, por exemplo, o lago Poopó da Bolívia, seco desde 2016.

Em Portugal Continental, com os derrubes florestais, particularmente desde os Descobrimentos e com os devastadores incêndios das últimas décadas, a maioria das nossas montanhas está não só desarborizada, como, também, sem solo para reter as águas das chuvas resultantes das nuvens carregadas de vapor de água do Oceano Atlântico.

Assim, como não há solo nas montanhas, a água das chuvas escorre em catadupa pelas encostas rochosas, sem solo, provocando drásticas inundações nas planícies e vales.

Por outro lado, como as montanhas do Norte e Centro não têm florestas, não há bombas bióticas de evapotranspiração que formavam rios aéreos que, transportados pelos ventos predominantes de Norte, precipitavam chuva no Alentejo e Algarve. Por isso essa região Sul de Portugal se encontra já em seca extrema.

Quando, a partir da segunda metade do século XIX, ainda na monarquia, se criaram os Serviços Florestais, para arborizar as nossas montanhas, cuja floresta natural tinha desaparecido, deu-se início a uma floresta de produção mono-específica com o pinheiro-bravo (Pinus pinaster).

Criou-se assim a maior área de pinhal contínuo da Europa. Hoje sabemos que não devíamos ter pinheirado desta maneira monótona e continua as nossas montanhas.

Mas, em pleno século XX, continuamos com florestas de produção mono-espeíficas e contínuas, particularmente de eucaliptos, com a consequente desumanização do nosso meio rural, o que facilita a propagação rápida dos incêndios.

Além disso, os governantes resolveram acabar com os Serviços Florestais. Assim, o país não tem pessoal suficiente para rearborizar as áreas ardidas, tendo vindo a aumentar drasticamente a desarborização e perda de solo das montanhas, transformando-as em autênticos desertos rochosos sem água, nem biodiversidade, com a consequente diminuição de pluviosidade no Alentejo e Algarve.

Jorge Paiva (Biólogo)

através da Associação Portuguesa de Imprensa

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