Oscilam entre a aceitação e a revolta as reações às medidas recentemente impostas para o combate à covid, mas numa coisa essas reações coincidem: essas medidas vão fazer mossa no Turismo, na restauração, na hotelaria, nas atividades artísticas. As diferenças de opinião ressaltam da dimensão dessa mossa
Para o presidente do Turismo do Algarve, João Fernandes, sendo uma época de procura maioritariamente nacional, as medidas anunciadas “acabam por acrescentar restrições, não só à possibilidade de passar cá a passagem de ano como também acrescentam custos a essa estadia”. Ressalva como fator positivo o facto de não haver restrições à mobilidade entre concelhos, nem restrições de horários ou lotação de estabelecimentos turísticos, “embora haja a registar os fechos dos bares e discotecas, que são um elemento de atratividade do destino neste período”.
O novo pico da pandemia e as novas medidas anunciadas caem sobre o Algarve numa altura em que a economia turística recuperava, aduz João Fernandes: até outubro, o Algarve estava 57% acima de 2020 e 40% abaixo de 2019 em proveitos, em valores acumulados desde o início do ano. Já no mês de novembro ficou com um volume de vendas superior a 2019. “Havia um sinal de recuperação. A expectativa é que terminemos o ano com 60% dos proveitos equivalentes a 2019, o que é mais positivo que no ano anterior. A expectativa era que esse processo fosse contínuo, mas apareceu uma omicron”, ironiza o presidente da RTA, não deixando de manifestar alguma compreensão com as medidas, que insere “num contexto europeu”.
Restaurantes entre a aceitação e a crítica
Também contextualiza as medidas com a Europa o vice-presidente da Associação da Indústria Hoteleira e Similares do Algarve (AIHSA), Daniel Alexandre do Adro, corrobora que as medidas restritivas, nomeadamente a obrigatoriedade de testes em restaurantes e hotéis, “é um apertar de restrições e vai ter um impacto. Se esse impacto é mensurável, ainda estamos a tentar percecionar, que efeito poderá ter na hotelaria e restauração”.
Daniel do Adro observa contudo que o retrocesso já vinha de trás, das primeiras medidas anunciadas, sobretudo a obrigação de certificado em restaurantes: “O retrocesso já era evidente, nos jantares de Natal começaram a ter cancelamentos, os eventos empresariais, porque as empresas perceberam que o comportamento deveria ser outro. Os individuais também começaram a repensar”.
No entanto, encara estas novas obrigações como com retrocesso para esta fase recuperadora da economia algarvia: “É um retrocesso, mas em vez de ser de fecho imediato e completo, ainda é viável. Mas [o teste obrigatório] é dissuasor, claramente dissuasor”.
E conclui, em tom explicativo: “Se não aproveitar os testes gratuitos a que tem direito, e conseguir agendá-los na farmácia, fica com uma janela de 48 horas. Mas existe todo um planeamento e portanto é dissuasor! A intenção não é facilitar. É viável, implica um planeamento, uma preparação, o que não é compatível com o ‘vamos almoçar fora hoje’”.
Representante dos comerciantes de restauração de VRSA, Luís Camarada vai longe nas críticas às novas medidas: “Fecharam os restaurantes mas disseram que podem estar abertos. Mas na realidade vão estar fechados com a porta aberta. Assumam a vossa responsabilidade e ao invés de andaram a fazer esta burrice de exigir o certificado digital e o teste é o mesmo que forçar os estabelecimentos a fechar mas sem o governo assumir os gravíssimos prejuízos que a restauração o alojamento e o sector em geral está a sofrer”.
E endereça uma mensagem dura ao Governo: “Assumam as vossas responsabilidades e em vez de estarem a enterrar milhões nas taps e nos bancos olhem para os pequenos comerciantes da hotelaria bares discotecas hotéis e alojamentos locais que têm sido os bombos da festa do Covid”, assinala, exigindo que os governantes “paguem os salários a segurança social e abram linhas de crédito com juro zero”.
Hotelaria acha medidas “desnecessárias”
Já do lado dos hotéis, Elidérico Viegas também é crítico com as novas medidas, mas considera que elas não vão ter tantos efeitos perniciosos assim:
“Sendo os hotéis e empreendimentos turísticos um bom exemplo de boas práticas em matéria de prevenção não faz sentido que as restrições tenham sido alargadas, designadamente à exigência de um teste para as pessoas acederem aos hotéis, parecem-me medidas exageradas. São restrições que não havia necessidade”, avança o presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve.
Recordando que os testes, atendendo ao agravar da pandemia, tinham sido objeto de uma recomendação da DGS há poucos dias, assinala que os hoteleiros estavam conscientes dessa necessidade. “Vir agora com exigência em vez de recomendação passados dois dias parece-me despropositado e desnecessário”, salienta.
No entanto, mantém-se otimista sobre o fim do ano: “Espera-se que, independentemente de os festejos de rua terem sido cancelados, os hotéis e empreendimentos continuem a ter boas perspetivas para o fim de ano”.
Artistas receiam uma má quinzena
“Estou convicto de que o mês de janeiro vai ser muito morto. Vejo muita gente a adiar coisas para meados do mês ou fevereiro. Mesmo com tudo fechado, as escolas até dia 10 de janeiro, o retomar só vai ser mais à frente para que as pessoas queiram ir ver coisas. Estou convicto que só a partir da segunda quinzena de janeiro é que as coisas vão começar a mexer”, diz ao JA o diretor artístico do LAMA (Laboratório de Artes e Media do Algarve), João de Brito, que se tem assumido como lutador pelos direitos dos artistas no contexto de pandemia.
Brito considera que os artistas não se podem queixar dos últimos meses, pelo contrário: “Tivemos um ciclo de um exagero de eventos, devido aos adiamentos. Estes últimos três ou quatro meses foram uma loucura. Há muita coisa que ia acontecer no primeiro semestre e transitou para depois do verão”.
Quanto às últimas semanas, garante que não tem havido quebra nos números de espectadores: “Tem estado tudo sempre cheio”, explicita, ressalvando contudo que as medidas agora impostas será um fator dissuasor da ida aos espetáculos.
Já o produtor teatral Pedro Monteiro, mentor do grupo Te-ATRITO, que viu algumas das suas peças canceladas no período mais amargo da pandemia, receia o “buraco negro” que se vai seguir: “Ultimamente os programadores têm receio. Não sabem o que vai acontecer. Eu tenho espetáculos marcados para janeiro mas não tenho a certeza se vão por diante”, assinala o promotor de Panmania ou Liberdade Eletrónica, com estreia marcada para 27 janeiro no Teatro das Figuras. “Esse pode ser que se faça, mas ninguém sabe o futuro neste contexto. Pensámos que isto tinha acabado. O que está a acontecer e surpresa para muita gente”.
João Prudêncio
Assine o Jornal do Algarve e aceda a conteúdos exclusivos para assinantes