AO CORRER DA PENA: “What? Sem Comentários”

Os problemas do Mundo, nem parecem deste Mundo! Por toda a parte surgem sublevações, contestações, provocações, corrupções e um imenso leque de eventos aparentemente contraditórios entre si! Tudo o que tínhamos como respeitável surge agora como hipócrita e de sobremaneira irrespeitável, desde a corrupção de alguns políticos, banqueiros e altos dignitários até à forma como alguns deles se defendem. A ignorância de alguns leva-os a questionar a origem científica das alterações do clima, a ida à Lua ou (pasme-se!) a própria esfericidade da Terra! E isto tudo, sem corar de vergonha!

Tudo isto é tão absurdo que me decidi a deter-me hoje num problema bem mais pequeno e caseiro, mas, em minha opinião, nada destituído de oportunidade e sentido: falo da Língua Portuguesa e da sua utilização neste país onde eu deveria escrever, por ordem de alguns doutores, “espetador” em vez de “espectador” e outras barbaridades. Decidiram esses doutores que deveria existir um acordo ortográfico que unisse o português de cá com o do Brasil, e também com os de Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe e Timor-Leste. Fizeram um Acordo e transformaram-no em lei! É a velha mania que os dirigentes portugueses têm de utilizar as leis como forma fazer valer uma ideia, em vez de utilizarem a persuasão e a comprovada inteligência dos portugueses. Claro que a persuasão, no caso vertente, não resultaria porque o tal de Acordo não unifica nada e não seria nunca através dele que nos entenderíamos melhor neste nosso Mundo Lusófono. Mas este acordo, mesmo sendo lei, já é letra literalmente morta e não valerá muito a pena bater mais no ceguinho. Só lhe falta a sepultura.

O que neste momento me move é a falta de utilização do próprio português, desde os mais altos escalões até aos putos que ainda andam a aprender a ler (pouco, já se vê) e a escrever (mal, evidentemente). Ainda há pouco vi uma manifestação que tinha um cartaz que rezava “Age Summit”! Pelo que entendi, questionavam o aumento da idade da reforma dos portugueses frente ao Conselho de Ministros de Portugal… Além do mais, uma expressão desajustada! Sem comentários!

Também não entendo porque há instituições de ensino pagas pelo Estado Português, isto é, com os nossos impostos, que titulam o seu nome em inglês! A Nova School of Business & Economics, entre muitas outras, não me deixa mentir! Mesmo na sua versão “portuguesa” na Internet, pasme-se, assim se chama! Retiro um dos vários títulos da folha de rosto (https://www2.novasbe.unl.pt/pt/): “Acreditamos num clear horizon sustentável”. Linda frase que nem entendo o que quer dizer! Também lá li “entrettenimento” assim escrito, com dois tt, mas deve ser erro, absolutamente entendível num site de uma Universidade que se preza do seu nome inglês! Também sem comentários! E quantas vezes damos por nós a ouvir intervenções dos nossos responsáveis políticos em inglês, ou espanhol, ou francês, por vezes algo macarrónicos, em organizações internacionais? Não falo de situações em que até é simpático falar o idioma do país que os acolhe, mas em situações formais onde a língua idioma do país é uma prerrogativa e deve ser utilizado! Fazem assim os nossos representantes, figura de ursos ou, na melhor das hipóteses, figura de bananas terceiro-mundistas, minimizando um dos mais preciosos activos que este pequeno país tem: a sua própria língua. O Português é a quinta ou sexta língua materna mais falada no Mundo e no entanto são os seus próprios representantes que o minimizam, não o utilizando!

Se não fossem os brasileiros, os angolanos e os outros povos lusófonos a fazerem prevalecer a nossa língua, não tardaria muito que o português desaparecesse! Será, portanto, a forma como esses povos tratarem e utilizarem o português, que será o português do futuro! Há dias vi na net um anúncio a um tradutor inglês-português, em que as bandeiras utilizadas eram a norte-americana e a brasileira! Grave prenúncio! O português que por cá se fala e escreve terá, ao que parece, os dias contados!

Há dias, passeando pela rua, dei comigo a ver anúncios, cartazes, nomes de lojas e outros negócios, mais frequentemente em inglês que na minha própria língua. Tal não é admissível, quando temos palavras em português para quase tudo! Porque utilizamos outro idioma? Se não somos nós a utilizar a nossa língua, quem será? É um provincianismo cretino titular coisas em inglês, as mais das vezes sem sequer as subtitular em português. Em minha opinião, a haver duas línguas, deveria era ser o contrário: titular em português e, se houvesse necessidade(?), subtitular na língua estrangeira! A maior parte das vezes, são coisas que apenas nos dizem respeito a nós, habitantes residentes de Portugal. Isto, para já não falar do ridículo que é, muitas vezes, a tradução utilizada. Já vi num alguidar de percebes a tabuleta de “understands” e as ementas em inglês e francês são por vezes prodigiosos ensaios numa numa língua tão estranha ao inglês ou ao francês, como ao português. É de sobremaneira triste que uma língua que chegou a ser a língua franca de vastas partes da África e da Ásia, e que conseguiu até hoje manter pequenas bolsas nessas mesmas terras, seja agora deliberadamente depreciada e ignorada pelos seus próprios usufrutuários e agentes.

Tive um colega filipino que me contava que em Manila havia uma pequena e muito restrita comunidade que ainda falava português (bastante arcaico, naturalmente) e era muito ciosa disso, e outros colegas asiáticos me falavam com consideração da quantidade de palavras portuguesas incorporadas nos seus próprios idiomas. Hoje, por cá, fala-se e escreve-se em inglês (mauzinho, já se vê) e acha-se que isso é que é moderno. Tal como com a poluição, deixaremos andar até que seja já irreversível? Parece que sim! O inglês agradece! Quando passar a barreira do irreversível, passaremos todos, no máximo, a falar brasileiro, que bem haja!

Fernando Pinto

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